Com seis anos de atuação, 35 investimentos e R$ 2 bilhões em valuation total em seu portfólio, o BR Angels tem sido reconhecido cada vez mais como um dos principais grupos de investidores-anjo do Brasil — e tem atraído novos membros. Os mais recentes são Sergio Waib, empreendedor e apresentador do programa “Giro Business”, e Cris Arcangeli, empreendedora serial, palestrante, escritora e ex-Shark Tank Brasil. Atualmente, são 400 executivos que integram o grupo, que chega ao seu 130º pitch de avaliação de startups. São 6.000 empresas na base sendo observadas, com 200 analisadas por mês para, a partir de critérios rigorosos, o BR Angels identificar negócios promissores e ajudá-los a ganhar escala. Somente no último ano, o ecossistema participou de seis rodadas de investimento, que juntas ultrapassam R$ 10 milhões.
Além do capital financeiro destinado às investidas, o BR Angels aposta no capital intelectual de seus membros para impulsionar o sucesso dos negócios, atuando sob o conceito de smart money. Isso ajuda a pavimentar o caminho para as saídas. Foram cinco exits, totais ou parciais, que já ocorreram no grupo. Nessas ocasiões, as startups crescem e os investidores recuperam o montante investido.
Mas como está o atual momento do investimento-anjo no País? O fundador e CEO do BR Angels, Orlando Cintra, conta nesta entrevista exclusiva:
BRAZIL ECONOMY – As startups procuram o BR Angels para receber investimentos. Mas o ecossistema oferece muito mais do que isso para elas evoluírem seus negócios, certo?
ORLANDO CINTRA – O dinheiro é importante, pois sem ele muitas vezes não se consegue fazer o básico, andar para frente. Mas a mentoria é crucial, é o diferencial, é o que faz dar o próximo passo. Além disso, temos pessoas fantásticas dentro do BR Angels, com muita bagagem, com muitas conexões. As startups navegam nesse network também. Para fazer parte do BR Angels, uma das contrapartidas é ter disponibilidade para as mentorias e consultorias que as startups solicitam. Isso se dá pela confiança, quando você quer que alguém cresça do outro lado. E esse é o nosso propósito: fazer com que essa startup cresça.
Como está vendo o movimento atual de aportes? O apetite para investimentos está forte ou não?
O BR Angels sempre tem apetite para o investimento, sempre tem recursos para investir. É uma característica interessante, pois sempre tem gente nova entrando. Apesar de o nosso modelo ser muito voltado à qualidade, sempre há espaço para investir. Porém, existe um contraponto: o momento de mercado. Agora, por exemplo, com a taxa de juros na estratosfera (Selic a 14,75% ao ano), as pessoas obviamente olham e algumas optam por deixar o dinheiro render em algum lugar sem risco. Isso dá um certo conforto e gera menos apetite ao risco. Isso também é supernormal. O que a gente vê neste momento é uma peneira muito mais fina. Passam menos coisas, com pessoas muito mais criteriosas.
Mas isso é ruim?
É muito melhor do que aquele conceito de investir em tudo que se move achando que vai dar resultado. Investir é fácil. É preciso tomar muito cuidado, de fato, com isso. E nós tomamos muito cuidado. A nossa responsabilidade é olhar, fazer uma diligência muito forte, mostrar, ir nos detalhes, utilizar nossa inteligência coletiva. Todo investimento aqui tem aprendizado, e o portfólio traz muito aprendizado também.
Mesmo quando os juros básicos estavam a 2% ao ano, essa maneira criteriosa de trabalhar fez diferença?
Sim, só que havia muito mais volume de dinheiro a ser empregado. Pelo mercado mais aquecido, você tinha mais liquidez na ponta. Então, existia um senso de urgência maior. Havia um volume maior de startups nascendo, uma economia mais pujante. Hoje não. Hoje as coisas andam muito mais lentamente. Você não vê muitas boas startups surgindo todos os dias. Naquele momento, sim. Por quê? Porque é o momento em que as pessoas querem arriscar mais, com uma economia mais dinâmica. Já com a taxa de juros mais alta, a sensação é de que tudo está mais travado. Até os IPOs desapareceram.
Até o empreendedorismo arrefece um pouco, na sua avaliação, neste momento?
Sem dúvida. Taxa de juros alta é um freio para a economia. Ninguém quer uma economia com inflação galopante, mas uma taxa de juros elevada segura a economia e desestimula qualquer investimento. Não estamos em um momento positivo como no passado, mas o extremo também não é bom. O equilíbrio, o meio do caminho, esse é muito bom.
Por quê?
Dá para olhar o copo meio cheio e meio vazio. Olhando o copo meio cheio, não há espaço para subir mais (a Selic). E, descendo ou mostrando expectativa de que vai baixar, já começamos a movimentar algumas coisas a mais. Eu sempre digo que, mesmo no inverno, é possível construir e se preparar bem para os investimentos. É o que nós estamos fazendo.
Qual seria um percentual ideal, na sua análise?
Talvez nem exista, porque depende também de muitos fatores. Mas eu diria que o percentual ideal seria aquele em que as pessoas se sintam confortáveis em tomar algum risco, pensando em ter maiores ganhos futuros. Quando isso acontece, quando essa balança começa a mudar, as empresas todas começam a querer investir. O mercado lá fora, as multinacionais, começam a olhar para cá e ver que a América Latina vai crescer. E isso tem um efeito no PIB também.
No bom momento, cinco anos atrás, surgiram muitos unicórnios com os investimentos em alta. Alguns não seguiram com o sucesso esperado. De fato, a bolha estourou?
Os grandes fundos, com muito dinheiro, precisam investir — e esse investimento precisa ser em coisas que vão gerar mais dinheiro. Quando isso aconteceu, havia muito dinheiro no mercado. As startups começaram a perceber que poderiam criar um negócio e ficar milionárias. Havia uma venture capital journey se alinhando para fazer isso acontecer, IPOs acontecendo, com os bancos também puxando forte para isso. Tinha toda uma constelação alinhada, e com muito dinheiro girando para todo lado. É aí que entra o outro lado da moeda, que também não é tão positivo. Porque os tickets são maiores e o valuation acelera. Em muitos casos, as empresas não paravam em pé sem aportes contínuos. Da mesma forma que não ter dinheiro nenhum é ruim, ter muito dinheiro também é.
Na atuação do BR Angels, quais são as demandas atuais? Startups de qual setor estão surgindo mais?
Nós investimos em todos os segmentos, mas colocamos foco em alguns, dependendo do momento. Agora, o foco está um pouco mais em agro, setor que gostamos bastante. Está se fortalecendo. Principalmente pela taxa de juros alta, tem bastante gente sofrendo e isso está gerando uma safra de startups de agro muito positivas, muito boas, muito resilientes. Porque são aqueles modelos de negócio que, de fato, fazem sentido e que vão gerar valor.
Outro segmento que está quente é a saúde. Apesar de ser complicado — porque todo mundo precisa de saúde, todo mundo precisa de automação na saúde, de sistemas de saúde — é um ambiente muito difícil de conseguir trabalhar. Mexe com as pessoas. Você não tem cliente na saúde, você tem vidas. É um mercado muito regulado também. Mas têm surgido muitas startups boas. E há os setores que todo mundo olha, como a IA pura, setor financeiro, retail, proptechs…
Como vê o futuro do BR Angels?
Muita expansão. Temos muitas pessoas querendo entrar no BR Angels diariamente. Nós sempre avaliamos o candidato a partir de um critério de seleção. Vemos se tem perfil smart, para contribuir com as startups, experiência concreta, passagem por grandes empresas, experiência em mercados internacionais. Começamos a olhar também uma possível expansão para fora do Brasil. Com que velocidade? Numa velocidade que seja um crescimento sustentável. Já tivemos convites para internacionalizar, mas ainda vemos muito espaço para crescer no Brasil, em regiões como Nordeste e Centro-Oeste. A qualidade é algo que a gente sempre coloca em primeiro lugar, para não perder a essência.