A Braskem, que já foi símbolo da ambição industrial brasileira, enfrentou nos últimos anos um período de maior cautela, marcado por reestruturações, mudanças societárias e incertezas estratégicas. Duas décadas após sua fundação, impõe-se um balanço realista e a construção de um novo caminho para que a companhia recupere protagonismo, relevância internacional e capacidade de liderar a próxima geração da indústria química e de materiais no Brasil e no mundo.
Desde sua criação em 2002, a Braskem se consolidou como um dos maiores símbolos da industrialização e integração do setor químico e petroquímico no Brasil. Nascida da fusão de ativos da Odebrecht e da Petrobras, a companhia surgiu com o ambicioso projeto de competir globalmente em um setor intensivo em capital, tecnologia e escala. Ao longo da primeira década de vida, a Braskem não apenas cresceu. Ela inovou com o lançamento do plástico verde, ganhou espaço nos mercados internacionais e chegou à Bolsa de Nova York, marco de visibilidade e governança para uma empresa latino-americana.
Com uma trajetória marcada por conquistas tecnológicas, internacionalização e liderança nas Américas, a Braskem segue sendo uma referência no setor de resinas termoplásticas e derivados químicos. No entanto, o cenário competitivo global mudou. A indústria enfrenta hoje novos paradigmas energéticos, exigências ambientais rigorosas e a urgência de transições sustentáveis. Diante desse contexto, a companhia tem a oportunidade de se reposicionar estrategicamente para uma nova fase de crescimento.
Esse movimento passa pela definição do novo controlador da companhia, uma etapa essencial para destravar investimentos e acelerar decisões estratégicas. Um acionista com visão de longo prazo, alinhado a práticas modernas de governança e comprometido com a inovação, pode trazer o impulso necessário para essa etapa de crescimento.
Da mesma forma, é necessário investir em transição energética e química verde. A Braskem já lidera iniciativas pioneiras como o plástico verde, desenvolvido a partir do etanol. Agora, é hora de escalar essas soluções e ampliar sua presença em segmentos sustentáveis e rentáveis. A química sustentável será um dos principais motores da competitividade futura.
Esse reposicionamento estratégico também envolve a atuação da Braskem como âncora da neoindustrialização brasileira. Com o avanço das discussões sobre política industrial no Brasil, a companhia pode exercer papel central na reindustrialização. Investimentos em cadeias produtivas integradas, novos polos industriais e inovação aplicada são caminhos para agregar valor e fortalecer o setor químico nacional.
No cenário internacional, a presença da Braskem é um diferencial estratégico. Consolidar essa vantagem exige um olhar seletivo sobre os ativos globais, priorizando mercados com sinergias reais, rentabilidade sustentável e potencial de inovação conjunta. Ser global não é estar em todos os lugares, mas estar nos lugares certos. Essa seletividade é essencial para alinhar presença geográfica com geração de valor e vantagem competitiva.
Outro eixo indispensável é transformar o ESG em um pilar real de transformação da cultura e dos negócios. A Braskem vem fortalecendo suas práticas ambientais, sociais e de governança. O próximo passo é consolidar uma cultura empresarial em que o ESG seja vetor de valor, inovação e competitividade, com metas claras, métricas rigorosas e impacto positivo nos territórios em que atua.
Para não perder relevância industrial, é também fundamental garantir acesso a matéria-prima competitiva. A indústria petroquímica é intensiva em insumos, e a Braskem opera em desvantagem frente a concorrentes nos Estados Unidos e Oriente Médio, que dispõem de gás natural abundante e barato. No Brasil, o custo do gás segue elevado e volátil, enquanto a oferta de nafta depende de importações ou de políticas públicas instáveis. Para manter sua competitividade, a Braskem precisa assegurar matérias-primas com custo competitivo e previsível. Isso exige contratos de longo prazo, maior integração com fornecedores estratégicos e modernização da infraestrutura logística e industrial.
Nesse contexto, revisar o footprint industrial, com foco em ativos estratégicos, eficientes e atualizados, torna-se igualmente essencial. A Braskem possui um portfólio industrial amplo, com unidades produtivas no Brasil, Estados Unidos, México e Europa. No entanto, parte dessa base requer avaliação crítica em termos de escala, eficiência energética e alinhamento tecnológico. Revisar essa estrutura, priorizando ativos com maior competitividade estrutural, integração logística e potencial de atualização tecnológica, será essencial para ampliar margens, reduzir riscos operacionais e garantir posicionamento sustentável no cenário global. Essa racionalização deve considerar também critérios de proximidade de mercado, acesso competitivo à matéria-prima e aderência às metas ambientais.
A Braskem é uma das poucas multinacionais industriais de origem brasileira. Com ativos tecnológicos relevantes, liderança nas Américas consolidada e um cenário global em transição, a companhia tem plenas condições de voltar a crescer de forma sustentável.
O Brasil precisa de empresas que pensem grande, invistam em tecnologia e sejam motores de desenvolvimento. Com uma estratégia clara e executada com excelência, a Braskem pode, mais uma vez, ser uma das protagonistas desse novo ciclo industrial.
*José Carlos Grubisich é empresário e sócio da Olímpia Investimentos e Participações (olimpiapar.com.br/gestores). Atuou como presidente da Braskem, da ETH Bioenergia (atual Atvos) e da Eldorado Brasil Celulose. Também foi presidente mundial da Rhodia Fine Organics e vice-presidente sênior da Rhodia mundial.