IOF em alta, confiança em baixa: mercado critica medida e comunicação do governo

Tributo volta ao centro do debate após anúncio do governo, com risco de sufocar o crédito e travar investimentos

Fernanda Bompan
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Imagens: iStock

O IOF incide sobre praticamente toda operação financeira e representa, na prática, um custo adicional ao crédito

O IOF incide sobre praticamente toda operação financeira e representa, na prática, um custo adicional ao crédito

As recentes idas e vindas do governo federal em relação ao aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) trouxeram novamente à tona dois pontos de tensão que têm marcado a política econômica do País: a dificuldade de comunicar mudanças tributárias de forma coordenada e a falta de uma agenda de corte de gastos. É o que apontam especialistas consultados pelo BRAZIL ECONOMY.

Na quinta-feira (22), o governo federal anunciou um decreto que alterava regras para aplicação do tributo que incide sobre crédito, câmbio e seguros. A proposta visava arrecadar R$ 20,5 bilhões em 2025 e R$ 41 bilhões em 2026 – um reforço de caixa de R$ 61,5 bilhões em dois anos.

A alteração gerou, contudo, forte reação negativa entre empresários e investidores. Logo após o anúncio, o Ibovespa recuou 0,44% e fechou aquele dia aos 137.272 pontos, enquanto o dólar subiu 0,32%, cotado a R$ 5,66.

Esta situação fez com que o governo recuasse na decisão, revogando parte das medidas. Mas a insegurança entre empresários e investidores sobre a condução econômica já estava generalizada.

Para o professor Carlos Honorato, da FIA Business School, o episódio simboliza um “amadorismo” que mina a confiança dos agentes econômicos e reforça a sensação de instabilidade. “O problema é que o anúncio já foi ruim. Mais uma vez demonstra que o governo não tem uma estratégia de corte de gastos. E, de repente, vem do nada com aumento de imposto, algo sensível porque impacta todos os empréstimos”, disse.

Na avaliação dele, o recuo posterior foi ainda mais danoso. “Fica pior ainda quando volta atrás. O presidente do Banco Central (Gabriel Galípolo) até disse que não sabia da medida. Isso afeta as expectativas e mostra um descompasso dentro da própria equipe econômica”, afirmou o professor.

O IOF é considerado um tributo com baixa transparência e alta distorção. Incide sobre praticamente toda operação financeira e representa, na prática, um custo adicional ao crédito. Honorato relembrou que, no governo anterior, havia um plano para eliminar o imposto até 2028, proposta que agora parece ter sido abandonada, na visão dele.

“O IOF é um imposto ruim, parecido com a CPMF. Cria obstáculos para quem precisa de crédito ou faz transações internacionais. Mesmo que o aumento em si não seja enorme, ele surge num momento em que o custo do dinheiro já está elevado”, explicou.

O professor destacou que o impacto pode ser particularmente sentido em setores que dependem de financiamento, como comércio, indústria e serviços. “Isso é uma taxa de juros implícita. Empresas que precisam de recursos, quem financia importações ou viagens, são diretamente afetados.”

Para Honorato, a raiz do problema está na escolha recorrente de soluções fáceis – como aumento de tributos – em vez do enfrentamento do gasto público. “Sempre tem uma atitude meio mandrake. Ao invés de cortar, criam tetos que não funcionam, aumentam impostos e tentam arrumar receitas extras. Isso cansa.”

Ele lembrou que há pouco espaço para elevação de carga tributária no Brasil, um país que já figura entre os que mais cobram impostos no mundo. “A gente está num nível de tributação que não tem mais margem para subir. E as pessoas não estão mais tolerando isso. O custo da empresa explode e a competitividade despenca.”

Com eleições pela frente, o professor da FIA aponta que há risco de mais medidas populistas e descoladas da responsabilidade fiscal. “Quem está no poder quer se manter. E o governo parece preso a um modelo antiquado, que aposta em liberar benefícios e empurrar a conta para depois.”

A medida também foi duramente criticada por empresários, que vêem no movimento uma ameaça à capacidade de investimento e ao ambiente de negócios. “Isso atinge em cheio as empresas, tornando menos viável antecipar recebíveis ou financiar a operação. O resultado é menos dinheiro em caixa e maior dificuldade para crescer, justamente em um ambiente onde os juros já são altos”, disse Volnei Eyng, CEO da Multiplike. Para ele, o ideal seria “focar na revisão de gastos obrigatórios, reduzir renúncias fiscais ineficientes e melhorar a gestão pública”.

Outros executivos reforçam que o ajuste fiscal precisa vir do lado da despesa, não da arrecadação. “O governo tem optado por ampliar os gastos com políticas de apelo populista, transferindo a conta para quem produz e investe. Essa lógica compromete a engrenagem que sustenta a economia”, criticou Felipe Vasconcellos, sócio da Equus Capital. 

A avaliação predominante entre empresários é que a elevação da carga tributária prejudica tanto a capacidade de investimento das empresas quanto o horizonte de planejamento. “As medidas anunciadas afetam diretamente o ecossistema de investimentos e o empreendedorismo. Mesmo sob a justificativa de recomposição de receitas, o efeito prático é sufocar o setor produtivo”, afirmou João Kepler, CEO da Equity Group.

Para Jorge Kotz, CEO do Grupo X, a estratégia atual do governo compromete o consumo e a competitividade. “Estamos vendo uma tentativa de ajuste fiscal disfarçada de recomposição de receitas, quando o que o país precisa é de reformas, desburocratização e digitalização.”

Carlos Braga Monteiro, CEO do Grupo Studio, resumiu o sentimento de boa parte do mercado: “O governo brasileiro precisa priorizar uma agenda de revisão e racionalização dos gastos públicos antes de recorrer ao aumento de impostos como solução fiscal. Isso sinalizaria responsabilidade sem sufocar o setor produtivo.”

A insatisfação com a medida também mobilizou entidades representativas da classe empresarial. Em nota oficial, a Associação Comercial e Industrial de Santo André (ACISA) manifestou “veemente repúdio à recente decisão do Governo Federal de aumentar o IOF”, classificando a medida como “escandalosa” e prejudicial aos empreendedores, “responsáveis por gerar empregos e movimentar a economia”. 

A entidade também fez um apelo ao Congresso Nacional para barrar a medida provisória, cobrando atuação dos deputados federais do ABC que, segundo a nota, “se comprometeram a defender os interesses da sociedade e do setor produtivo local”.

Então, como ficam as novas regras do IOF?

Crédito

O governo atualizou as alíquotas cobradas sobre o crédito concedido a empresas – pessoas físicas continuam com as mesmas regras de tributação. A forma de cobrança do IOF varia de acordo com o porte da empresa e o enquadramento fiscal informado à Receita Federal.

Empresas em geral

Antes: 

  • 0,38% no momento da contratação
  • 0,0041% ao dia
  • Limite anual de 1,88%

Agora:

  • 0,95% na contratação
  • 0,0082% ao dia
  • Teto de 3,95% ao ano

Empresas do Simples Nacional

Antes:

  • 0,38% na contratação
  • 0,00137% ao dia
  • Teto de 0,88% ao ano

Agora:

  • 0,95% na contratação
  • 0,00274% ao dia
  • Teto de 1,95% ao ano

Microempreendedores Individuais (MEIs)

Nova definição da aplicação do IOF para MEIs. A partir de agora, eles passam a pagar:

  • 0,38% na contratação (alíquota de pessoa física)
  • 0,00274% ao dia (menor alíquota de pessoa jurídica)

Cooperativas de crédito

Antes isentas do imposto, cooperativas passarão a ser tributadas caso realizem operações de crédito acima de R$ 100 milhões por ano. O valor que ultrapassar esse limite será tributado como se a cooperativa fosse uma empresa comum. As linhas de crédito voltadas à compra de máquinas, equipamentos ou financiamento estudantil continuam com isenção de IOF.

Seguros

A mudança afeta exclusivamente aportes em planos de previdência do tipo VGBL. Agora, contribuições que superem R$ 50 mil em um único mês passam a ter cobrança de 5% de IOF.

Câmbio

O decreto também promoveu ajustes no IOF sobre operações cambiais, como compras com cartão no exterior, envio de dinheiro para fora do País ou empréstimos internacionais.

Gastos no exterior (cartões e remessas)

Antes:

  • 3,38% sobre compras com cartões internacionais (crédito, débito ou pré-pagos)
  • 1,1% sobre compra de moeda em espécie ou envio de recursos a contas próprias no exterior

Agora:

  • Alíquota unificada de 3,5% para todas essas modalidades

Empréstimos no exterior

Antes:

  • Isenção para operações com prazo inferior a 364 dias

Agora:

  • 3,5% sobre empréstimos de curto prazo

Investimentos no exterior

Na quinta, o governo anunciou a cobrança de 3,5% sobre transferências para aplicações financeiras internacionais, antes isentas. Mas revogou a decisão.

Outras operações de câmbio

Antes:

  • 0,38% tanto para entrada quanto para saída de recursos

Agora:

  • 0,38% sobre entrada de capital
  • 3,5% sobre saída de recursos

As operações ligadas a exportações, importações, distribuição de dividendos e financiamentos de longo prazo seguem isentas de IOF.

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