Marcelo Zimet, presidente da L’Oréal Brasil, tem um hábito pouco convencional para quem comanda uma das maiores operações do grupo francês no mundo: ele dedica parte do seu dia navegando no TikTok. Mas não se trata de distração ou passatempo. Para o executivo, a plataforma, assim como outras redes sociais, é um verdadeiro termômetro cultural, onde surgem tendências, gírias, comportamentos e, principalmente, desejos de consumo.
“Eu dedico parte do meu tempo por dia vendo TikTok. Antes, ficava entre WhatsApp e e-mails. Hoje, reservo esse tempo para acompanhar TikTok, Instagram e outras ferramentas sociais para entender quais são as conversas em torno das marcas da L’Oréal Brasil”, afirmou durante sua participação no MMA Impact 2025, realizado nesta quarta-feira (14), em São Paulo.
Nos últimos dois anos, a L’Oréal Brasil vem intensificando sua presença nas redes com uma estratégia voltada para influenciadores, dentro do projeto chamado Creators Economy. Um dos casos mais bem-sucedidos, segundo Zimet, foi o lançamento do hidratante Garnier Vitamina C Toque Seco.
“A gente fez uma entrega de produtos num volume nunca feito antes, nem por marcas independentes. Os influenciadores não tinham briefing. Imagina a L’Oréal não dar briefing para um influenciador? A gente deixou totalmente livre. E o que a gente percebeu é que ficamos praticamente sem produto nas prateleiras”, contou o executivo.
Na visão dele, essa liberdade criativa gera benefícios para ambos os lados. “Quando você permite que os criadores façam o conteúdo do jeito deles, sem limitar ou engessar, o resultado é mais autêntico e oferece muitos insights para futuras campanhas”, disse Zimet. “Temos vários creators que hoje têm até crachá da L’Oréal Brasil. Eles circulam pela empresa e estão sempre opinando um pouquinho sobre a nossa estratégia.””
A escuta ativa não para por aí. Alan Spector, Chief Digital & Marketing Officer (CDMO) da L’Oréal Brasil , que também participou do evento, destacou uma característica curiosa do consumidor brasileiro: a tendência de dar apelidos aos produtos. “Por exemplo, se você chegar em uma farmácia perguntando pelo hidratante Garnier Toque Seco, talvez a atendente não saiba. Mas, se perguntar pelo ‘creme amarelinho do TikTok’, ela vai reconhecer. Então, é toda uma mudança de como você trabalha com as agências, de como você dá nome para os produtos, como você faz campanhas”, disse.

Segundo Zimet, a guinada digital da companhia tem papel central no bom momento da operação brasileira. “A L’Oréal nunca teve uma performance nos últimos 65 anos como a dos últimos 5 anos. Grande parte disso se deve a quase ou até mais de 90% ao digital. E grande parte disso, por sua vez, é devido ao Creators Economy. Então, não tem como separar o resultado da companhia com a forma como a gente está fazendo nosso marketing local. Ao mesmo tempo, ano após ano, nossos lançamentos têm recorde de vendas”, afirmou o presidente da marca francesa.
Brasilidade como estratégia de marketing da L’Oréal
Além da estratégia com influenciadores, outro pilar essencial para o crescimento da L’Oréal Brasil tem sido a capacidade de adaptar o portfólio às necessidades reais dos consumidores locais. “Se você me perguntar hoje por que a L’Oréal tem seis anos consecutivos de duplo dígito, a estratégia chama a brasilidade”, afirmou o presidente da L’Oréal Brasil .
Segundo ele, o País deixou de ser apenas um consumidor de tendências globais para se tornar um exportador de criatividade. “Mais do que consumir, o Brasil cria, influencia e exporta tendências”, destacou. Entender essa potência cultural e traduzi-la em produtos, campanhas e linguagem é, na visão do executivo, tanto uma vantagem competitiva quanto uma responsabilidade estratégica para a marca.
A aposta na brasilidade ganhou força com a criação de um polo de inovação em São Paulo, que conecta cientistas, criadores e consumidores para desenvolver produtos alinhados às particularidades do mercado local. Segundo Zimet, o laboratório tem um papel decisivo na construção de fórmulas para cabelos cacheados, crespos, e peles com fototipos diversos — características frequentemente negligenciadas pelas matrizes europeias ou norte-americanas.
“Temos mais de 200 milhões de pessoas com biotipos diferentes, clima tropical, variações de umidade e exposição solar. É um país complexo e, por isso mesmo, estratégico”, afirmou Zimet. “Quando acertamos aqui, estamos mais preparados para outros mercados multiculturais.”
A experiência brasileira com os chamados “testes de estresse” — produtos que resistem a calor, suor e umidade — tem ajudado a L’Oréal a atender consumidores também na África e em parte da Ásia. “Somos laboratório vivo para o mundo”, reforçou.
Na prática, a estratégia de brasilidade se traduz em campanhas mais inclusivas, influenciadoras locais e uma estética visual conectada à cultura nacional. Marcas como Elseve, Garnier e L’Oréal Paris têm incorporado não apenas rostos brasileiros, mas também narrativas que valorizam pluralidade, ancestralidade e pertencimento.
“É fundamental que o consumidor se veja nas nossas campanhas. Mas mais do que isso: que se sinta ouvido e respeitado”, disse Zimet. Ele lembra que a escolha de embaixadores brasileiros com perfis diversos — do mainstream à periferia, do digital ao comunitário — é parte de uma estratégia que vai além do marketing. “Queremos dialogar com todas as brasileiras e brasileiros, com autenticidade.”
Um dos destaques é a atuação da L’Oréal com marcas adquiridas no Brasil, como a Niely, que já nasceu conectada à estética da mulher negra. “Nossa responsabilidade é potencializar essas histórias, não apagá-las”, afirmou o executivo.
Para ele, a brasilidade não pode ser só um slogan. “Queremos que o Brasil seja visto como o que ele é: um celeiro de beleza, potência criativa e fonte de inovação”, disse Zimet.