O turbulento momento global abre uma gigantesca janela para produtos com valor agregado, como é o caso dos vinhos e espumantes gaúchos. Muitos países estão buscando diversificar suas fontes de importação para reduzir a dependência de grandes potências rivais. O Brasil, sendo um país neutro em muitos conflitos comerciais, pode se posicionar como uma opção viável. Em tempos de incerteza, os mercados de nicho de alta qualidade ganham destaque. Consumidores valorizam mais a origem, a autenticidade e a história dos produtos do que apenas o preço. Sempre lembrando que existe uma profunda diferença entre ter um nome de produto e ser uma marca.
A Serra Gaúcha, com destaque para Bento Gonçalves e Garibaldi, é considerada a 6ª melhor região do Novo Mundo (Américas, Oceania, África do Sul). Mesmo sabendo que, no Velho Mundo, temos no topo do ranking França, Espanha, Itália e Portugal, existe espaço para a qualidade dos vinhos e espumantes gaúchos. Não devemos nos contentar apenas com a conquista de prêmios internacionais e os rasgados elogios de críticos. É preciso conquistar as mesas dos melhores restaurantes do mundo, assim como estar presente nas gôndolas de supermercados de todo o planeta. Chegou a hora de dignificar, globalmente, o que produzimos aqui — como foi feito em Mendoza (Argentina).
A proposta de construir uma marca de “origem gaúcha” é extremamente estratégica, ainda que tardiamente oportuna. Apostar apenas em produção/produtos não é suficiente para conquistar a atenção do mercado. A preferência é impulsionada pelo binômio reputação + autoridade. Essa é a razão pela qual Alemanha, França e Itália estão permanentemente reforçando a percepção de valor das suas marcas de produtos — em várias categorias, especialmente automóveis. O Rio Grande do Sul tem dificuldade em acreditar que uma marca com conceito tem a capacidade de transformar produtos iguais em desiguais. São inúmeras — e urgentes — as vantagens competitivas de criar a marca de origem RS para nossos vinhos e espumantes.
Os passos práticos para isso acontecer passam por:
consolidar uma denominação de origem, sustentada por uma estratégia focada na construção de reconhecimento e reputação;
estabelecer uma aliança entre produtores, governo estadual e entidades de promoção do Brasil no exterior;
firmar parcerias com veículos de comunicação nos diferentes países, para que reforcem, com o peso da opinião editorial, a qualidade do que é produzido no RS.
O sucesso em marketing é balizado por dois elementos centrais: estratégia e conceito — tendo como consequência uma maior assertividade na construção do posicionamento, da estética e do storytelling. Não podemos, por outro lado, abrir mão da recomendação de sommeliers, chefs e influenciadores digitais. Da mesma forma, é ponto de inflexão ter uma estratégia de distribuição efetiva que garanta a presença dos vinhos e espumantes gaúchos em pontos charmosos que atendam às classes A e B.
Tudo conta. Tudo é conceitualmente estratégico. O ponto de inflexão está na consciência do setor em buscar parceiros e profissionais competentes para desempatar esse jogo. Se tudo o que foi feito até agora não construiu a esperada “marca de origem”, está na hora de rever e identificar quem tem capacidade real para fazer diferente e contribuir para o salto rumo ao sucesso.
*João Satt é estrategista e CEO da consultoria G5