Depois de um período turbulento e de revisões amargas, a MRV&Co está pronta para reescrever sua história. Com uma estratégia mais enxuta e conservadora, a companhia anunciou um plano de reestruturação para os próximos três anos, priorizando eficiência operacional, foco regional, alocação de capital com menor risco e uma nova governança corporativa.
Durante o Investor Day realizado nesta quarta-feira (16), o CEO Rafael Menin foi direto ao ponto: é hora de virar a página. “Estou convicto de que a safra que começou a ser construída no ano passado fará com que este novo ciclo seja o melhor da história da MRV. Se o passado foi o pior, este será o melhor”, afirmou.
A reestruturação vem acompanhada de um reconhecimento público dos erros cometidos — gesto raro e bem recebido pelo mercado. “A empresa está assumindo sua parcela de responsabilidade”, elogiou um analista durante o evento. O diretor executivo de Comercial e Crédito, Thiago Corrêa Ely, reforçou esse tom ao BRAZIL ECONOMY. “Transparência agora é prioridade”.

A franqueza se justifica. Após um 2021 histórico, com lucro recorde de R$ 914 milhões impulsionado por juros baixos, a MRV mergulhou no vermelho. Em 2022, a companhia registrou prejuízo de R$ 333 milhões, abrindo um ciclo de resultados negativos que se arrastou com o agravamento do cenário macroeconômico.
“Fomos ambiciosos demais. Agora, ajustamos a rota”, afirmou Augusto Pinto de Moura Andrade, diretor de Relações com Investidores. Ele se refere ao ousado plano de expansão iniciado em 2019, tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos, com a meta de entregar 5 mil unidades anuais pela então AHS — hoje Resia.
As feridas do passado ainda pesam
Não é à toa que os papéis da MRV&Co desabaram: de R$ 21,57, em julho de 2021, para R$ 5,12 nesta quarta-feira. A retração refletiu a queda de confiança do mercado, agravada pelo desempenho fraco da Resia, subsidiária americana que consumiu US$ 59 milhões no primeiro trimestre de 2025 sem registrar uma única venda de projeto.
Ainda assim, há sinais de reação. Após anunciar uma leve alta de 2% nas vendas líquidas, que somaram R$ 2,2 bilhões, e uma queima de caixa ajustada de R$ 48,3 milhões, as ações da empresa subiram 3,02% no dia.
Segundo a MRV, parte do desempenho fraco se deve a repasses temporariamente suspensos em programas regionais. “A causa foi identificada e resolvida. Esperamos regularizar esse backlog ao longo do segundo trimestre”, garantiu a empresa.
Menin manteve o tom confiante: “Estou muito convicto de que vamos nos recuperar. As vendas vão crescer organicamente e teremos uma geração de caixa bem mais favorável no segundo trimestre”.
Aposta renovada no Minha Casa, Minha Vida
Analistas do BTG Pactual, como Gustavo Cambauva e Elvis Credendio, enxergam uma virada positiva no horizonte. Para eles, os ajustes no programa Minha Casa, Minha Vida devem impulsionar a lucratividade da MRV. A recomendação é de compra, com preço-alvo de R$ 17 — potencial de valorização de 240%.
O CEO também aposta no programa habitacional do governo, especialmente nas faixas 2 e 3, mesmo com a recente inclusão da faixa 4, que permite imóveis de até R$ 500 mil. Com essas mudanças, a MRV projeta R$ 11 bilhões em lançamentos em 2025, o que representa um crescimento de 17,5%.
Menos cidades, mais resultados
Outro pilar da nova MRV está no foco geográfico. A companhia vai reduzir sua presença de 130 para 80 municípios, organizados em 28 núcleos regionais. A ideia é simples: ganhar escala, eficiência e agilidade nas operações.
Rafael Albuquerque, diretor executivo de Desenvolvimento Imobiliário, destacou também a nova abordagem sobre terrenos. “Uma coisa que me tira o sono é o estoque de terrenos”, confessou. Atualmente, a MRV possui R$ 2,6 bilhões em terrenos pagos e ainda não lançados — meta é reduzir esse número para R$ 1 bilhão até 2029. Para isso, criou uma nova área de Gestão Executiva de Ativos.
E os EUA?
Apesar dos percalços, a Resia segue como peça-chave no tabuleiro da MRV&Co. A empresa pretende levantar US$ 800 milhões com a venda de terrenos até 2027, o que permitiria uma desalavancagem de US$ 480 milhões. Um possível spin-off da subsidiária americana não está descartado, mas não é prioridade no momento.
Um novo ciclo à vista?
Entre ajustes de rota, reconhecimento de falhas e foco renovado em eficiência, a MRV&Co tenta reconstruir sua credibilidade no mercado. Se tudo sair como planejado, o passado recente poderá virar apenas uma lição valiosa — e não um obstáculo permanente.