Menos imposto, mais justiça? Saiba mais sobre as mudanças que testarão o seu bolso

A ampliação da faixa de isenção e a tributação de fundos exclusivos prometem devolver renda e transparência, mas também desafiam o equilíbrio fiscal

Paulo Pandjiarjian
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Imagens: Divulgação

Carlos Braga Monteiro, CEO do Grupo Studio: “O efeito líquido é mais previsibilidade e menor arbitragem”

Carlos Braga Monteiro, CEO do Grupo Studio: “O efeito líquido é mais previsibilidade e menor arbitragem”

Nem sempre pagar menos imposto significa ganhar mais. O Brasil vive uma fase de ajustes finos no sistema tributário, buscando equilibrar dois objetivos difíceis de conciliar: aliviar a carga das camadas médias e baixas e, ao mesmo tempo, fechar brechas utilizadas por quem concentra renda e patrimônio. O movimento atual representa uma tentativa de reequilíbrio que combina transparência, previsibilidade e redistribuição, embora ainda teste a paciência de contribuintes, empresas e investidores.

O aumento da faixa de isenção para salários de até R$ 3.036, aprovado em 2025, foi o primeiro passo nessa “recalibragem”, como define Carlos Braga Monteiro, CEO do Grupo Studio, em entrevista exclusiva ao BRAZIL ECONOMY. A proposta em tramitação no Senado, que eleva o limite para R$ 5 mil, pretende devolver poder de compra e simplificar a vida de milhões de brasileiros. Segundo Monteiro, a medida melhora a progressividade e reduz distorções, ao mesmo tempo em que combate a arbitragem tributária entre investimentos locais e internacionais. O executivo ressalta que o efeito líquido é de mais previsibilidade, menor litigiosidade e incentivo a um planejamento financeiro lícito e eficiente.

Na prática, o novo desenho do imposto significa mais dinheiro disponível para o consumo básico e menos burocracia para os contribuintes. Monteiro destaca que a mudança também tem um efeito jurídico relevante, pois reforça a isonomia e simplifica o cumprimento das obrigações fiscais. Ele avalia que, se combinada com controle de gastos e combate à sonegação, a ampliação da isenção pode ter impacto fiscal administrável.

O desafio, contudo, está na equação entre renúncia e responsabilidade fiscal. O governo abre mão de parte da arrecadação no curto prazo, apostando que o aumento do consumo e a formalização de novos contribuintes compensem as perdas no médio prazo. Trata-se de um equilíbrio delicado entre devolver renda e manter a sustentabilidade das contas públicas, em um contexto de baixo crescimento e alta pressão por despesas.

Enquanto a base ganha fôlego, o topo da pirâmide sente o aperto. A Lei 14.754/2023 instituiu a tributação anual de 15% sobre rendimentos de fundos exclusivos e offshores, encerrando décadas de diferimento fiscal. A medida busca nivelar o tratamento entre aplicações domésticas e internacionais e aumentar a transparência do sistema. Para Monteiro, essa mudança marca uma virada estrutural: o foco do planejamento tributário passa a ser a otimização de risco, liquidez e prazo, dentro de um arcabouço mais estável e previsível.

A nova regra gerou uma corrida às consultorias fiscais e escritórios de advocacia, com investidores reestruturando carteiras e declarações. O mercado tende a se adaptar rapidamente, já que o modelo segue práticas adotadas em economias desenvolvidas. O resultado é uma mudança de mentalidade: sai o improviso, entra o planejamento estratégico.

Renda disponível e consumo em alta

As alterações na faixa de isenção têm impacto direto no consumo das classes média e baixa, que concentram a maior parte da renda disponível. Ao injetar recursos nesse público, o governo tenta estimular o consumo básico e atenuar os efeitos da desaceleração econômica. Monteiro observa que, além do efeito econômico, há um ganho jurídico e social, com simplificação de processos e redução de disputas tributárias.

No caso das empresas, as mudanças foram discretas, mas relevantes. As alíquotas de IRPJ e CSLL permaneceram inalteradas, o que foi interpretado como um sinal de prudência fiscal. Segundo Monteiro, o governo enviou uma mensagem clara ao setor produtivo: é hora de reforçar a eficiência operacional e o compliance, aproveitando estruturas legais de forma responsável e alinhada à reforma do consumo e à governança corporativa.

A modernização tributária vai além de ajustes em faixas e alíquotas. Ela representa uma transição cultural em direção à previsibilidade, um valor essencial para a estabilidade econômica e a atração de investimentos. Monteiro aponta que o futuro tende a ser marcado por maior digitalização e integração entre o fisco e o contribuinte, com uso intensivo de dados e processos automatizados.

Entre as tendências, estão a ampliação da base tributária, a simplificação das regras e a consolidação de um ambiente mais transparente. Para pessoas físicas, isso pode significar ajustes graduais nas tabelas e deduções; para empresas, avanços em tributação internacional e preços de transferência; e, para investidores, a consolidação de um sistema neutro, voltado ao longo prazo e à produtividade.

No horizonte, o Brasil parece caminhar para um sistema menos desigual e mais previsível, embora os riscos fiscais e políticos ainda exijam prudência. A ampliação da isenção e a tributação de grandes fortunas e fundos sofisticados indicam uma tentativa de aproximar o país de modelos mais equilibrados, em que justiça tributária e eficiência econômica coexistam.

A questão que permanece é se o governo terá disciplina para sustentar esse novo ciclo e se o contribuinte confiará o suficiente para manter o jogo dentro das regras. No fim das contas, em matéria de imposto, o que parece simples raramente é. E toda mudança que promete aliviar o bolso precisa, antes, convencer a cabeça.

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