William Castro Alves é formado em Economia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e atualmente ocupa o cargo de estrategista-chefe e sócio da Avenue, plataforma de investimentos internacionais. Já atuou como analista-chefe da XP Investimentos, líder de gestão da VGR Gestão de Recursos e tem passagens pelo Koliver Merchant Bank e Banco Alfa. Residente em Miami, William esteve em São Paulo na última semana para participar da segunda edição do Avenue Connection – The International Investment Summit, encontro organizado pela empresa para discussões sobre investimentos internacionais no Brasil. Durante o evento, concedeu uma entrevista exclusiva ao BRAZIL ECONOMY, na qual falou sobre o vai e vem do IOF, a taxação de 50% aos produtos brasileiros, o equilíbrio fiscal da economia brasileira, entre outros pontos. Confira:
Este mês, uma decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, restabeleceu a quase totalidade do decreto que elevou o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), feito pelo governo federal. Isso provocou a quarta mudança nas alíquotas em quase dois meses. Como fica o mercado em relação a esse vai e volta?
O problema maior é a instabilidade que se cria. Quando o governo, em uma canetada, muda o valor do IOF, os investidores entendem que pode aumentar ainda mais e encarecer a administração dos seus recursos. Quem garante que, de um dia para o outro, não vai ser 6,38%, como já foi? Sem falar que ainda não temos como explicar se nossos clientes terão que pagar retroativo. O cenário está muito confuso.
Existe algum entendimento de que o STF é o responsável por essa nova crise com a decisão do ministro Moraes?
Podemos até criticar a decisão do ministro Alexandre de Moraes, que foi monocrática e de cima para baixo, mas não é ele quem administra o Brasil. Não cabe a ele pensar como as empresas vão lidar com o aumento da cobrança do IOF — ele está apenas julgando um caso que chegou às suas mãos, e aí lhe cabe usar a visão jurídica que lhe compete. Entendo que o governo e o Legislativo deixaram toda essa indefinição, e coube ao STF resolver.
Como o senhor entende a maneira com que o atual governo brasileiro busca equilibrar as contas públicas?
Fica claro que o governo entende que equacionar o déficit das contas públicas é um fator importante. Isso é um ponto positivo dessa gestão. Temos que lembrar que essa falta de cuidado gerou o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff por causa das pedaladas — o que não é o caso agora, já que o governo mostra que está olhando para isso.
A gente critica o ministro Haddad por causa do aumento de impostos, como mostra o caso do IOF, mas temos que reconhecer que essa fórmula é antiga e surgiu mais ou menos em 1988 no Brasil: criam-se vários benefícios para a sociedade como um todo, sem a contrapartida de quem paga essa conta. Então, vão financiando a dívida brasileira para dar esses benefícios, e aí precisam aumentar a arrecadação. Por isso, a solução que colocam é sempre aumentar impostos. Essa fórmula econômica, criada desde os anos 80 no Brasil, está se exaurindo. É importante dizer que isso não tem a ver com partido, já que vem sendo feito por diversos governos.
Se não é pelo aumento de impostos, qual a solução que você defende para equilibrar as contas públicas no Brasil?
Muito se fala sobre a necessidade de cortar gastos, o que é importante. Mas também não dá para sair cortando sem critérios. Por isso, acredito que o único caminho para resolver essa equação é a Reforma Administrativa. Enquanto não se faz isso, vão procurar subterfúgios, como o aumento do IOF, por exemplo. É um bom momento para se resolver, por exemplo, a questão dos supersalários no funcionalismo público. Acho que isso vai além do Brasil, já que existe uma demanda no mundo pela diminuição do Estado — como mostra a própria eleição do Trump, que tinha essa plataforma. Na França, Itália e Holanda, esse discurso ganhou força recentemente também.
O senhor considera isso uma demanda de grupos políticos de direita?
Não, é uma demanda global mesmo. Estão questionando cada vez mais essa ideia de que a entidade pública deve ser o motor do desenvolvimento e da distribuição de renda da sociedade. É uma discussão bem maior do que partidos políticos.
E como o mercado tem interpretado essa visão protecionista de Donald Trump para o resto do mundo?
O mercado ainda não precificou essas tarifas no patamar que o Trump coloca inicialmente, já que ele costuma voltar atrás. No caso da China, por exemplo, ele conversou e recuou. A percepção ainda é de que as tarifas como um todo não vão vigorar e que não devem mexer tanto no comércio internacional. Porém, se essa percepção mudar e o mercado entender que o comércio internacional vai se reduzir, as projeções de crescimento global vão mudar consideravelmente.
Sobre a tarifa de 50% imposta por Trump ao Brasil, você acha que deve prevalecer a partir de agosto?
Até agora, ele tem mostrado que pode recuar, como fez com outros países. Mas acho que essa ideia de que ele sempre recua está incomodando o Trump neste momento. Não é só um meme de rede social, é uma percepção vista no mercado. Ficam cutucando a onça com vara curta, então não duvido que chegue 1º de agosto e ele diga que as tarifas para o Brasil serão essas. E pronto.
Talvez o setor de aviação seja o mais afetado por essa taxação de Donald Trump, devido ao valor agregado do que a Embraer exporta. Como a empresa deve reagir a isso?
A parte de aviação é bem complicada nesse sentido, já que café, suco de laranja ou minério o Brasil pode procurar outros parceiros. Mas avião é muito específico. Os EUA consomem 30% do que se produz no mundo, e a Embraer tem uma grande dependência do mercado norte-americano. O que o Trump quer é que a Embraer produza dentro dos EUA, como antigamente, quando tinham uma operação da empresa em Fort Lauderdale que foi comprada. O cenário ideal para ele, quando se fala em Embraer, é que seja igual à Gerdau ou à WEG, que têm suas produções lá. Para o Trump, é muito claro: querem produzir aqui dentro, sejam bem-vindos. Se querem ficar fora, é tarifa.
A Flórida vem sendo destacada com um sucesso na última década em termos de atração de grandes investimentos. Você vive lá há alguns anos. Compartilha dessa percepção?
A Flórida é um estado que vai muito bem em termos econômicos, atraindo muita gente desde a pandemia. Morando lá, tenho visto que Miami está “bombando” mais do que há dez anos e trazendo cada vez mais investidores. Empresas grandes, como Zara, Mercedes e Alstom, têm feito investimentos milionários na parte de construção civil em Miami. Isso faz com que a situação de vida de quem está na Flórida seja melhor do que a de quem está em Chicago, por exemplo. E o governador do estado, Ron DeSantis, é um grande candidato pelo Partido Republicano à presidência dos EUA em alguns anos.