Quando poucos falavam de Inteligência Artificial, dez anos atrás, Mariana Dias já desenvolvia sua própria IA para lançar a Gupy. Deu certo. Hoje a empresa ocupa um lugar de destaque como uma das principais plataformas de gestão de pessoas no Brasil. Fundada em 2015 com foco em seleção, a empresa evoluiu para oferecer soluções que cobrem toda a jornada do funcionário, do processo seletivo à avaliação de desempenho. “Hoje atuamos de ponta a ponta no core do RH”, disse Mariana Dias, CEO e cofundadora da companhia, em entrevista ao BRAZIL ECONOMY.
Com mais de 80% das empresas do Ibovespa como clientes, a Gupy está dobrando a aposta em tecnologia própria e IA para seguir crescendo acima de dois dígitos. “Quando lançamos IA para recrutamento em 2015, parecia algo distante. Hoje ela está presente em todo o processo, de forma integrada”, afirma Mariana. Atualmente, a plataforma utiliza IA generativa não apenas para acelerar processos, mas para transformar a maneira como empresas gerenciam pessoas.
A CEO explica que houve uma mudança de paradigma recente com a chegada da IA generativa em formato de agentes autônomos. “Antes, a inteligência artificial nos ajudava a acelerar tarefas. Agora ela permite fazer diferente. É transformação, não só automação”, disse. Um exemplo é o desdobramento de metas: com agentes de IA, a plataforma consegue transformar uma estratégia corporativa em metas cascateadas para todos os níveis da organização em questão de segundos.
A tecnologia também já permite que a Gupy crie treinamentos corporativos customizados em apenas cinco minutos, com conteúdo gamificado e certificado. “O RH está ganhando um copiloto inteligente, capaz de tomar decisões mais rápidas e mais alinhadas com o negócio”, afirmou Mariana.
Parte do desafio, segundo ela, é a justiça nos processos seletivos, já que há cuidado ético no desenvolvimento da tecnologia. “Quem constrói a IA são humanos, então o risco de viés existe. Desde o início, criamos mecanismos para promover diversidade. Por exemplo, nossa IA não diferencia ‘desenvolvedor’ de ‘desenvolvedora’”, explica. A empresa mantém comitês de ética para revisar periodicamente o comportamento dos algoritmos e investe na formação de um time de tecnologia diverso – hoje com pelo menos 35% de mulheres.
Esse compromisso com diversidade também se reflete nos resultados. Segundo Mariana, cerca de 40% das contratações feitas por clientes da Gupy apresentam recortes de diversidade, o que demonstra a efetividade das medidas adotadas. Além disso, a empresa oferece treinamentos gratuitos sobre como utilizar a tecnologia de forma a ampliar a inclusão no mercado de trabalho.
Embora os indicadores oficiais apontem para uma baixa taxa de desemprego, a percepção de quem contrata é diferente. “Vivemos uma escassez de mão de obra qualificada, inclusive em cargos operacionais. Não falta gente participando dos processos seletivos, mas muitos não atendem aos requisitos básicos”, disse Mariana.
Ela também aponta um movimento crescente de “pejotização” via aplicativos como Uber e iFood, que oferece aos candidatos alternativas ao regime CLT tradicional. Esse cenário reforça a necessidade de formação contínua e de novas abordagens para retenção e qualificação de talentos.
Investimento em tecnologia e diferenciais competitivos
Mariana afirma que a Gupy mantém investimentos robustos em tecnologia, embora não revela cifras da empresa. Quase metade do time é composto por profissionais da área, refletindo a importância estratégica do setor para a empresa. “Além de desenvolver soluções, precisamos garantir segurança de dados, conformidade com a LGPD e governança, especialmente trabalhando com empresas de grande porte”, ressaltou.
Entre os diferenciais da Gupy em relação aos concorrentes, a CEO destaca três pilares: amplitude da jornada atendida (do recrutamento à performance), volume de dados (são mais de 50 milhões de usuários na base) e foco em segurança e compliance. “Todos vão usar IA daqui pra frente, mas quem entrega o melhor resultado é quem tem dados, contexto e robustez”, afirma.
Gerações em conflito? Não, em transformação
A entrada de novas gerações no mercado de trabalho, com prioridades distintas das anteriores, tem provocado atrito entre empregadores e jovens profissionais. Mariana vê nisso uma oportunidade. “É na diversidade que está a inovação. A gente não coleta dados como idade ou gênero, então nossa IA é neutra nesse sentido”, diz. Mas, para além da tecnologia, a Gupy também atua com treinamentos e serviços para ajudar as empresas a lidar com a nova dinâmica do trabalho.
A revolução trazida por agentes de IA pode impactar, segundo ela, em cargos operacionais e júnior, mas acredita na reinvenção do trabalho. “A humanidade tem essa capacidade de criar novos serviços e papéis. E os jovens, que dominam novas tecnologias, terão papel importante nisso.”
Maternidade, liderança e empatia
Recentemente, Mariana se tornou mãe e passou a ver com ainda mais clareza os desafios da mulher no mercado de trabalho. “Eu não gosto de romantizar. É muito difícil. A maioria das empresas nem sala de amamentação tem”, disse. Na Gupy, a licença-paternidade é de dois meses, em vez de cinco dias, e a empresa investe em fóruns, redes de apoio e políticas de equidade para manter mães competitivas em seus retornos ao trabalho.
Casada com uma mulher, Mariana acredita que sua vivência pessoal contribui para uma gestão mais empática e diversa. “É na vulnerabilidade que se cria conexão. Quero ver mais mães sonhando alto, virando diretoras, CEOs, líderes.”
