A Vestas, gigante dinamarquesa do setor eólico, encerra 2025 com um marco simbólico no Brasil: 12 GW de capacidade instalada sob sua atuação no País, patamar que, segundo Eduardo Ricotta, CEO da companhia para a América Latina, coloca a multinacional na liderança do mercado brasileiro, à frente de Siemens e GE, e consolida o País como um dos pilares do grupo no mundo. “Atingimos 12 gigawatts no Brasil no fim do ano e passamos concorrentes que tinham um histórico maior aqui”, afirmou o executivo, em entrevista. O número é também citado em comunicações institucionais ligadas à operação da empresa no Rio Grande do Norte.
O desempenho ocorre em um momento em que a indústria eólica tenta calibrar expectativas diante de um paradoxo do sistema elétrico: ao mesmo tempo em que o Brasil avança rapidamente na contratação e na oferta de fontes renováveis, a demanda cresce em ritmo inferior, pressionando preços e ampliando desafios operacionais para o despacho e o equilíbrio da rede. Ainda assim, Ricotta sustenta que o próximo ciclo de expansão deve ser impulsionado menos pelo consumo tradicional e mais por novas cargas intensivas, como data centers e projetos de hidrogênio verde.
O sinal mais claro da reativação do mercado em escala foi o anúncio, na semana passada, de uma nova etapa da parceria entre Casa dos Ventos e Vestas: a contratação de 828 MW para o complexo eólico Dom Inocêncio, no Piauí, com 184 turbinas V150-4.5 MW, obras previstas para começar em 2026 e comissionamento final estimado para 2028. Pelo contrato, a Vestas também ficará responsável pela operação e manutenção por 25 anos, um componente que, segundo o executivo, tem crescido e ajudado a sustentar a performance regional mesmo em períodos de menor contratação de novos parques.
Ricotta contextualiza que 2025 foi “muito melhor do que 2024”, após um ciclo de retração associado à queda de demanda e a incertezas que costumam anteceder eleições em alguns países da região. Ainda assim, ele afirma que a Vestas manteve ritmo por conta de backlog e do avanço do negócio de serviços.
Na leitura do executivo, uma parte relevante do estresse atual do sistema elétrico passa por distorções regulatórias ligadas à geração distribuída solar. Ele aponta que incentivos econômicos aceleraram a instalação de projetos, inclusive por grandes empresas, e criaram uma dinâmica de “vale e pico” mais difícil de administrar: grande injeção ao meio-dia e queda no fim da tarde, justamente quando a demanda residencial sobe.
Nesse cenário, Ricotta argumenta que a energia eólica tende a complementar o solar e ajudar o sistema no horário crítico. Na prática, diz ele, o vento costuma ganhar força entre o fim da tarde e o início da noite, quando a geração solar cai e o consumo aumenta.
Dados do ONS mostram que a fonte eólica está entre os principais componentes da capacidade instalada do SIN, o que reforça sua relevância estrutural na matriz.
A nova demanda: data centers e IA
Para o CEO, o crescimento da inteligência artificial e a necessidade de infraestrutura computacional mudaram a lógica do investimento energético global. “Ou você conecta o crescimento de data centers a energia limpa, ou aumenta a emissão de CO₂”, disse. Na visão dele, o Brasil reúne atributos competitivos para atrair projetos: energia predominantemente renovável, sistema interligado e condições naturais que favorecem a expansão (incluindo recursos para resfriamento e disponibilidade de eletricidade limpa).
Ele também menciona que a decisão do governo de zerar o imposto de importação para equipamentos de data center tende a reforçar a atratividade do País para essa cadeia, ao reduzir custo de instalação e acelerar projetos.
Além de data centers, Ricotta cita o hidrogênio verde como oportunidade de médio e longo prazo, ancorada no potencial renovável do Brasil. Ainda assim, ele ressalta que o avanço exige aprimoramentos no “arcabouço regulatório”, sobretudo para endereçar as distorções e dar previsibilidade ao consumidor e aos investidores.
Ricotta afirma que o Brasil está entre os cinco principais mercados da Vestas no mundo e detalha a expansão da presença local: fábrica no Ceará e um centro de operação e manutenção em Natal (RN), com salto no número de profissionais dedicados ao O&M. Ele destaca ainda o fortalecimento da cadeia de fornecedores: peças que antes precisavam ser enviadas ao exterior para reparo hoje já são atendidas no País.
Em paralelo, o executivo observa que, apesar do avanço industrial, a criação de um hub regional para manutenção atendendo países vizinhos ainda esbarra em custos logísticos elevados na América Latina, um ponto que, segundo ele, precisará ser endereçado para ampliar competitividade regional.
O Brasil fechou 2024 com 33,7 GW de capacidade eólica instalada, segundo o Boletim Anual da ABEEólica, reforçando a escala do País entre os maiores mercados globais. Já a síntese do Balanço Energético Nacional (EPE) aponta a evolução da participação de eólica e solar na matriz elétrica brasileira e indica que o avanço dessas fontes tem sido determinante para a transformação recente do setor.
Para 2026, Ricotta projeta continuidade do ciclo positivo, com novos investimentos e expectativa de mais contratos, sobretudo se a tese de data centers e hidrogênio verde se materializar. “A oportunidade que apareceu é grande”, afirmou, sinalizando que a retomada pós-2023 pode não ser pontual, mas o início de um novo capítulo da eólica brasileira. Agora, mais conectado à agenda de infraestrutura digital e à economia do carbono.

