Vinte e cinco mil sites ilegais de apostas foram bloqueados pela Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) até agora. No dia 1º de janeiro, o setor vai completar um ano de regulamentação no Brasil. Atualmente, são cerca de 80 empresas autorizadas e monitoradas a operar no País, responsáveis por quase 200 sites e aplicativos. Um deles é o Esportes Gaming Brasil, responsável pela plataforma Esportes da Sorte. Em entrevista exclusiva ao BRAZIL ECONOMY, o CEO, Darwin Filho, faz um balanço sobre o primeiro ano do mercado regulado, comenta sobre a evolução dos jogos online no País, os patrocínios das bets ao esporte, a geração de emprego do segmento, as críticas que o setor recebe e a CPI que corre no Congresso Nacional. Confira abaixo a entrevista:
Qual o principal avanço do setor neste primeiro ano de regulamentação?
O maior avanço foi transformar uma atividade que já existia – e que era marcada por informalidade e falta de parâmetros – em um setor econômico organizado, auditável e integrado à economia real. A regulamentação não criou o mercado, mas trouxe ordem, governança e responsabilidade. Hoje temos regras claras, fiscalização contínua, padrões sólidos de compliance e mecanismos efetivos de proteção ao consumidor.
Do ponto de vista econômico, o setor ganhou escala e previsibilidade. Segundo levantamento da LCA Consultores e Cruz Consulting, encomendado por IBJR e ANJL, as operadoras licenciadas já somam R$ 7,5 bilhões em capital próprio investido, com efeito multiplicador de até R$ 28 bilhões em outros segmentos da economia. O faturamento estimado chega a R$ 22 bilhões, representando aproximadamente 1% do PIB, e o setor já gerou 15,5 mil empregos formais. São sinais claros de que a regulamentação consolidou uma indústria sustentável, com impacto real na economia brasileira.
Como observou a derrubada de mais de 25 mil sites ilegais até o momento? Surpreendeu o alto número?
O número impressiona, mas não chega a surpreender. Apenas expõe a profundidade do problema histórico do mercado ilegal – aqui e em qualquer lugar do mundo – e evidencia a profundidade do que sempre existiu. A derrubada dos sites é uma ação relevante, mas ainda insuficiente. O mercado clandestino opera de forma extremamente ágil, muda de domínio, estrutura e tecnologia com rapidez e se adapta a qualquer tentativa de bloqueio.
O ponto mais crítico permanece no fluxo financeiro que sustenta esses operadores. Sem rastreabilidade plena, sem controle rigoroso e sem responsabilização de verdade, o combate vira um esforço que resolve a superfície, não o núcleo. Enquanto o dinheiro continuar circulando por brechas que não são monitoradas com eficiência, estaremos lidando com sintomas, não com a causa.
É por isso que a atuação coordenada com o sistema financeiro precisa ser fortalecida. Provedores de pagamento, instituições de pagamento e bancos têm papel central na identificação, no bloqueio e no reporte de transações suspeitas. Quando esse ecossistema funciona de forma rigorosa, o mercado ilegal perde oxigênio. Quando não funciona, se fortalece.
Ainda assim, é correto reconhecer que os avanços recentes mostram maior articulação entre os órgãos. Mas o cenário ainda está longe do ideal. Reprimir o mercado ilegal exige integração técnica, análise de dados e capacidade investigativa. Sem isso, o problema continua se renovando. O desafio é grande e a urgência é evidente. O caminho começa com uma premissa simples: seguir o dinheiro é mais efetivo do que derrubar sites.
Além do combate aos sites ilegais, considera bem-sucedidos o monitoramento e a fiscalização financeira das plataformas irregulares? O que pode melhorar?
Houve avanços importantes, mas ainda não é possível classificar o monitoramento e a fiscalização financeira como plenamente bem-sucedidos. Existe maior integração entre operadoras licenciadas, instituições financeiras e o regulador, e padrões suspeitos são identificados com mais rapidez. Porém, na prática, a política pública de contenção financeira ao mercado ilegal ainda não alcança a eficiência necessária.
O principal problema permanece na capacidade dos operadores ilegais de se movimentarem com agilidade, explorando brechas tecnológicas e regulatórias. A identificação de contas-laranja e a interrupção de fluxos suspeitos avançaram, mas não o suficiente para desestruturar o sistema de pagamentos informal que sustenta essas operações.
O próximo passo precisa ser mais robusto. É essencial ampliar a automação dos alertas, padronizar protocolos de verificação, responsabilizar instituições que não atuarem com a diligência necessária e intensificar o compartilhamento inteligente de dados entre os atores envolvidos. Sem isso, a rastreabilidade perde força e o mercado ilegal mantém margem de atuação.
O combate ao clandestino depende muito mais da interrupção dos fluxos financeiros do que da derrubada de páginas. Quando o dinheiro para, a operação para. Esse ainda é o grande desafio a ser enfrentado.
Os casos de tentativa de manipulação diminuíram ou aumentaram? Em que medida a exposição de casos contribui para minimizar o problema?
A regulamentação trouxe transparência. O que aumenta não é o número de tentativas, mas a capacidade de identificá-las. Casos que antes passavam despercebidos agora são detectados com velocidade e documentação adequada. A exposição é positiva: inibe novas práticas, pressiona instituições esportivas a adotar padrões mais rígidos de governança e reforça a integridade do ambiente esportivo.
Sobre a tentativa de o governo aumentar impostos das casas de apostas, qual sua opinião?
A discussão não pode se limitar ao valor nominal da alíquota, e sim à carga efetiva total. O Brasil já opera com um dos custos regulatórios mais altos do mundo: taxa de licenciamento elevada, múltiplos impostos corporativos, contribuições obrigatórias e, mais recentemente, o imposto seletivo. Se esse conjunto se desarranja, o impacto é imediato: o operador ilegal ganha competitividade. O setor entende seu papel e sua contribuição – com R$ 9 bilhões em arrecadação prevista para 2025, segundo estudo LCA/ANJL/IBJR –, mas precisa de estabilidade e previsibilidade para continuar gerando empregos, investimentos e arrecadação de forma sustentável.
Como analisa a atuação da CPI das Bets no Congresso?
A CPI teve um papel relevante ao evidenciar a dimensão do mercado ilegal e ao reforçar a necessidade de políticas públicas estruturadas. O ponto crucial é separar o que é operador regulado – que segue regras rígidas, recolhe impostos e está integrado ao sistema financeiro – do operador clandestino. O setor regulado é parte da solução, não do problema. O foco agora precisa ser a aplicação plena das regras aprovadas.
Há quem critique que as bets estariam ocupando espaço do consumo de alimentos ou varejo. Como observa esse argumento?
Os dados não confirmam esse tipo de substituição. O gasto médio do apostador brasileiro é baixo e comparável ao consumo de outros entretenimentos digitais, como streaming ou games. O risco real para o consumidor está nas plataformas ilegais, que operam sem limites e sem mecanismos de proteção. No ambiente regulado, existe controle, rastreamento e políticas obrigatórias de jogo responsável.
Outro ponto é a dependência de jogos online. O que o setor tem feito para minimizar esse risco?
A regulamentação colocou o Brasil entre os países com protocolos mais robustos de jogo responsável. Todas as operadoras licenciadas são obrigadas a oferecer limites de depósito, autoexclusão, pausas voluntárias, aviso de risco, monitoramento comportamental e informações claras ao usuário. Nenhuma dessas medidas existe no mercado ilegal. Por isso, fortalecer o ambiente regulado é fundamental para proteger o consumidor.
E qual é a contribuição do setor para a arrecadação do governo?
A contribuição é concreta e mensurável. Como citado, a estimativa para 2025 é de R$ 9 bilhões em tributos, somando impostos federais e municipais. Além disso, segundo a Receita Federal, o governo já havia arrecadado R$ 6,85 bilhões até setembro. O setor também impulsiona cadeias de tecnologia, publicidade, dados, streaming e eventos, e emprega 15,5 mil profissionais formais com salário médio de R$ 7.000,00.
As bets elevaram o nível de patrocínios esportivos. Isso já estabilizou ou ainda há espaço para crescer?
O primeiro ciclo foi de expansão acelerada, o que naturalmente pressionou valores. Agora, vemos um mercado mais racional, com contratos baseados em métricas de retorno e visão de longo prazo. Há espaço para crescer em modalidades e competições menos exploradas. O patrocínio responsável fortalece clubes, atletas e toda a cadeia esportiva.
Na Europa há movimentação por restrições a patrocínios. Isso pode chegar ao Brasil?
O contexto europeu é muito específico. No Brasil, o patrocínio é parte fundamental do financiamento do esporte. O País encontrou um equilíbrio entre regras claras, comunicação responsável e fiscalização. Qualquer debate deve considerar esse impacto econômico e a contribuição estruturante do setor para o esporte nacional.
Quais pontos o setor pode evoluir em 2026, após um primeiro ano de regulamentação?
A ano de 2026 será de consolidação. Não espero mudanças bruscas, mas o fortalecimento das bases: mais integração com o sistema financeiro, mais integridade esportiva, mais governança, mais rastreabilidade e avanços no jogo responsável. A Copa do Mundo deve trazer um volume inédito de novos usuários, e o diferencial estará na capacidade das empresas de reter esses jogadores com responsabilidade e experiência personalizada.

