Palacete Tirachapéu revê o passado para conectar a Bahia com o futuro

Após restauro cuidadoso, construção histórica protagoniza a retomada do Centro de Salvador como hub gastronômico, cultural e de moradia

Celso Masson
Compartilhe:

Imagens: Divulgação

Rooftop com um detalhe da cúpula em abóboda e vista da Bahia de Todos os Santos e a prefeitura de Salvador

Rooftop com um detalhe da cúpula em abóboda e vista da Bahia de Todos os Santos e a prefeitura de Salvador

Capital do Brasil entre 1549 e 1763, Salvador possui um Centro Histórico com o maior conjunto arquitetônico do período colonial preservado na América Latina. Um levantamento recente identificou mais de 400 construções sem uso, muitas delas em avançado estágio de degradação. Esse poderia ter sido também o destino do Palacete Tirachapéu, projetado em 1914, pelo arquiteto italiano Rossi Baptista para abrigar a Associação dos Empregados do Comércio da Bahia. O nome se deve ao gesto de reverência perante as autoridades que marcavam presença por ali e acabou adotado pela ruela onde fica a entrada principal do Palacete.

Ponto de referência na tradicional Rua Chile – a primeira rua projetada do País, ligando na Praça Castro Alves à Praça da Sé, onde está o Elevador Lacerda – o Palacete abrigou espaços de convivência, auditório, lojas, consultórios e biblioteca antes de entrar em decadência. Nas últimas décadas, evidenciando o abandono, uma árvore brotou de uma de suas sacadas. Parecia condenado, até ser salvo da ruína por um grupo de empresários que vislumbra um futuro promissor não apenas para o Tirachapéu como para toda a Rua Chile.

O restaurante Preta visto a partir do bar, um dos apelos que reforçam a vocação do Palacete para ser um polo de gastronomia e cultura
O restaurante Preta visto a partir do bar, um dos apelos que reforçam a vocação para ser um polo de gastronomia

“O Palacete está inserido em algo maior, que envolve uma releitura, uma reocupação e uma revitalização de todo o entorno”, diz o empresário Paulo Marques, Conhecido por desenvolver empreendimentos de alta rentabilidade e impacto social na Bahia, ele diretor do Grupo Fera Investimentos e um dos sócios do Tirachapéu. “Meu sonho é ver a Rua Chile se tornar a mais internacional de Salvador. A cidade vai se reposicionar no cenário global através da Rua Chile e da qualidade de serviço e experiência que a gente está construindo aqui, passo a passo.”

A expectativa de Marques é compartilhada por um sócio-chave do Palacete, Marcelo Magalhães. Mineiro de Uberlândia que se divide entre negócios no setor de construção civil e de restaurantes – entre eles Nino Cucina e Casarìa, em São Paulo –, Magalhães se apaixonou pelo Palacete assim que o visitou pela primeira vez. Imaginou seus novos usos e acompanhou de perto os trabalhos de restauração, a cargo de técnicos do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional). De lá para cá, tem se dedicado a tornar o local um polo capaz de atrair um público que pouco valorizava a região. “De nada adianta ter um lugar que é bem visitado, que é querido, se o seu próprio povo não quer. A ideia aqui era conseguir trazer esse pertencimento. A gente pensou que o turista teria muito mais peso, mas está acontecendo o contrário. O soteropolitano está comprando a ideia, está vindo sempre e reconhecendo esse senso de pertencimento”, afirma Magalhães, que passou a viver quase em tempo integral na Rua Chile.

Entrada principal do Palacete Tirachapéu, projetado em 1914 para abrigar a Associação dos Empregados do Comércio da Bahia
Palacete Tirachapéu, projetado em 1914 para abrigar a Associação dos Empregados do Comércio da Bahia

Segundo Marques, a entrada de Magalhães foi decisiva para o sucesso do negócio. “Ele trouxe uma capacidade de realização enorme e uma conexão importante com São Paulo e com o resto do Brasil. Era o elemento que faltava.” Hoje, quem visita o Palacete pode escolher entre diversas opções gastronômicas: o restaurante Preta, especializado em comida baiana e batizado com o apelido que tornou a chef Angeluci Figueiredo conhecida nacionalmente; o Casarìa, filial da rede que Magalhães possui em São Paul; o Pala7, com menu assinado pelo chef francês Claude Troisgros; um rooftop com vista pub para o mar; o Pub 1579, mais intimista; uma loja da marca Chocolat du Jur; um wine bar da vinícola baiana UVVA, da Chapada Diamantina; e uma sala para degustação de charutos da marca Jamm Cigar, de Alagoinhas. Há ainda uma loja de artesanato baiano e uma biblioteca com livros raros da história de Salvador e da Bahia. “Conteúdo é o que não falta aqui”, diz Marques.

Muito mais que restaurar e ressignificar um edifício histórico com vocação para a gastronomia e a cultura, o Palacete se converte em um marco da revitalização do Centro Histórico de Salvador com olhar para o futuro. “A Bahia vive um momento em que finalmente começa a se apresentar ao mundo sem complexo de inferioridade”, diz Marques. “A gente sempre teve força na música, nas artes, na publicidade. Agora a Bahia passa a ser vista também como um lugar sofisticado.”

Exemplos dessa sofisticação podem ser vistos a poucos metros do Palacete. Na Praça Castro Alves, o Hotel Fasano. Na própria Rua Chile, o Fera Palace, com retrofit de luxo do antigo Palace Hotel. Bem ao lado do Tirachapéu, o Palácio Rio Branco, antiga sede do Governo do Estado, foi adquirido pelo francês Alex Allard, idealizador do complexo Cidade Matarazzo, em São Paulo, para abrigar um hotel de altíssimo padrão.

Mesa do restaurante Pala7, que tem menu assinado pelo chef Claude Troisgros: sucesso também com o público local
Mesa do restaurante Pala7, que tem menu assinado pelo chef Claude Troisgros: sucesso também com o público local

E não é só com hotéis estrelados que a Rua Chile pretende firmar sua nova identidade. O Gorges Residences é um empreendimento que ocupa um prédio modernista da década de 1950, inteiramente reformado com uma proposta de transformar o endereço em um edifício de moradias exclusivas, com unidades de 140 m2, decoradas com esmero e vista deslumbrante do mar. Na visão de Juan Alba, diretor cultural do Palacete Tirachapéu, o Gorges é uma peça central no movimento de revitalização da Rua Chile. “Ele transcende a relação com o turismo e a hotelaria ao propor o uso residencial de um equipamento restaurado para esse fim”, diz Alba. “É com as pessoas morando que a região ganha uma vida nova.” O próprio Palacete se insere nesse contexto, com uma divisão residencial no radar dos sócios.

Restaurado, reaberto ao público e reinserido na vida cultural de Salvador, o Palacete Tirachapéu tem dado um novo sentido à noção de Patrimônio Histórico. Sua reinauguração foi com um show que reuniu no mesmo palco o baiano Carlinhos Brown e o mastro João Carlos Martins. Recentemente, o espaço sediou a primeira edição do evento Wine & Music Fest e já há planos de uma festa literária em 2025. Assim, reafirma seu passado com um olhar firme no futuro – e isso inclui educação. Um dos pilares que irão sustentar o Tirachapéu nos próximos anos é a parceria com a Lum1no New Business School, que terá sua sede dentro do Palacete. O restauro previu salas de aula, auditório central para eventos dos mais variados tamanhos e perfis e espaços para convenções empresariais.

“Trazer o jovem para estudar no centro de Salvador é uma escolha intencional. Acreditamos nos negócios como um propósito de mudar a vida de cada um, mas também de mudar a coletividade”, diz Magalhães. “Acima de tudo será um marco que como pensamos a cidade, e o ambiente de negócios que acreditamos que é possível construir e consolidar.”. O início das aulas está previsto para fevereiro.

Com todas as formas de conexão que propõe, o Palacete Tirachapéu, sob nova gestão torna-se, de novo, um ponto de encontro vibrante – desses que estimulam a convivência, a troca e a descoberta. Um convite para revisitar a essência da Bahia e do Brasil com novos olhos.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

ASSINE NOSSA NEWSLETTER E
FIQUE POR DENTRO DAS PRINCIPAIS NOTÍCIAS DO MERCADO

    Quer receber notícias pelo Whatsapp ou Telegram? Clique nos ícones e participe de nossas comunidades.