A tributação sobre distribuição de dividendos volta ao centro da agenda econômica em 2026 e acende um sinal de alerta para empresas de todos os portes. A nova regra estabelece alíquota entre 10% e 15% sobre valores que excederem R$ 50 mil mensais (R$ 600 mil anuais). O impacto preocupa o setor porque os dividendos são pagos após a empresa já ter recolhido impostos sobre o seu lucro.

Hoje, a soma de IRPJ (Imposto de Renda da Pessoa Jurídica) e CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido) faz com que a carga tributária sobre o lucro das empresas chegue, em média, a 34%. Ou seja, o resultado distribuído ao sócio já nasce diminuído — e a nova cobrança adiciona uma segunda camada de tributação sobre a mesma base econômica, percepção que tem sido interpretada por especialistas como bitributação de fato, ainda que tecnicamente amparada pelo modelo fiscal.
Para o advogado Samuel Miranda – especialista em direito empresarial, fundador do Instituto Nacional de Direito e Empreendedorismo (INDE) e sócio do Rangel de Miranda Advogados – o momento não é de pânico, mas de planejamento cirúrgico. “Quem se organizar em 2025 mantém a isenção total. O erro é esperar 2026 chegar para reagir”, alertou.
Miranda elenca quatro estratégias legais, da antecipação contábil à mudança de residência fiscal, para mitigar o impacto.
A Janela de Ouro: Antecipação de Dividendos
A estratégia mais imediata é zerar o lucro acumulado antes que a lei entre em vigor. A “janela de oportunidade” vai até 31 de dezembro de 2025. Lucros apurados e distribuídos até esta data permanecem isentos.
“Existe um movimento inteligente de antecipar esses dividendos. Mas não basta transferir o dinheiro. É preciso lastro contábil real”, explicou.
Para evitar que a Receita Federal classifique a operação como fraude, o advogado recomenda que seja feito um balanço intercalar bem elaborado, o Demonstrativo de Resultado do Exercício (DRE) atualizado e ata formal de reunião de sócios aprovando a distribuição.
O único risco é financeiro. Não antecipe mais do que o caixa suporta. Distribuir lucro que não existe contabilmente é perigoso”, disse o especialista.
Engenharia Societária: A Diluição Familiar
Para empresas familiares, a nova regra traz uma oportunidade de planejamento sucessório antecipado. A isenção de R$ 50 mil mensais deve ser aplicada por beneficiário (CPF). Portanto, aumentar o número de sócios dilui o montante tributável.
“É absolutamente legal incluir cônjuge ou filhos maiores na sociedade, mesmo com uma porcentagem pequena, como 1%, inserindo uma cláusula de distribuição desproporcional de lucros”, orientou Miranda.
“Vou dar um exemplo Prático. Um empresário sozinho paga imposto sobre o que exceder R$ 50 mil. Se incluir o cônjuge, o casal pode retirar até R$ 100 mil mensais isentos (R$ 50 mil cada)”, completou.
O especialista lembra que não adianta colocar filhos menores como sócios, já que a responsabilidade usufrutuária é dos pais, então o Fisco entende que a renda é do genitor, anulando a estratégia.
Segmentação de Atividades (Holdings e Operacionais)
Dividir a operação em CNPJs distintos, segregando atividades, é uma das formas mais robustas de proteção. A ideia é isolar riscos e otimizar regimes tributários (ex: uma empresa no Lucro Real e outra no Presumido).
“Segmentar atividades é eficiente não só pela distribuição de lucros, mas pelo planejamento estratégico. O segredo é a ‘coerência operacional’. Cada CNPJ deve ter seu centro de custos e contratos de rateio bem definidos”, disse Miranda.
Ao fazer isso, cria-se a possibilidade de múltiplas faixas de isenção, desde que comprovada a independência das operações.
Prejuízo para o Brasil: desinvestimento e êxodo fiscal
Enquanto o governo busca aumentar a arrecadação, o efeito colateral pode ser a fuga de capitais. Segundo Samuel Miranda, a nova regra tem acelerado a decisão de empresários de alto patrimônio de transferir sua residência fiscal para países como Uruguai, Paraguai ou EUA.
“Essa é a bola da vez. A tributação sobre dividendos pode gerar um movimento de desinvestimento real. Para o empresário, é uma proteção de patrimônio. Para o Brasil, é negativo, pois é dinheiro que deixa de circular na economia interna”, analisa.
O dinheiro de brasileiros fora do país somou US$ 654,5 bilhões em 2024, de acordo com informações de Capitais Brasileiros no Exterior (CBE), divulgadas pelo Banco Central (BC).
E a tendência é de alta. Para quem já possui operações internacionais, a ordem agora é reinvestir o lucro na filial estrangeira, evitando trazer o dinheiro para o Brasil para não sofrer o “pedágio” da nova taxa.
Elisão vs. Evasão: A linha tênue
A maior insegurança jurídica apontada por Miranda é a falta de clareza se o limite de isenção será por CPF ou por grupo econômico (CNPJ). Na dúvida, o advogado recomenda conservadorismo documentado.
“A diferença entre elisão (legal) e evasão (crime) está no ‘propósito negocial’. Se você cria uma estrutura apenas para não pagar imposto, sem lógica empresarial, é simulação. Se há um propósito econômico verdadeiro, é planejamento legítimo”, acrescentou.
Planejamento é a Palavra de Ordem
Diante da incerteza regulatória e do prazo apertado, a mensagem do advogado é clara: o planejamento tributário não é mais uma opção, mas uma necessidade de sobrevivência empresarial.
“Enquanto o Congresso e a Receita Federal não definem os detalhes do cálculo do limite de isenção, o empresário que age com documentação robusta e propósito negocial claro, transforma o risco da nova lei em vantagem competitiva legal”, afirmou Samuel.

