Cheval des Andes é uma exceção entre os grandes vinhos de Mendoza, onde a uva Malbec tem sido a protagonista. Neste caso específico, ela é coadjuvante, dando espaço ao frescor, à elegância e à longevidade característicos da região de Bordeaux, na França. Não por acaso, esse ambicioso projeto nasceu em 1999 do encontro de dois mundos: de um lado, Pierre Lurton, presidente do Château Cheval Blanc; do outro, Roberto de la Mota, referência no vinho argentino. Juntos, criaram uma joint venture entre Cheval Blanc e Terrazas de los Andes, dando origem a uma marca que evoluiu para se tornar referência em vinhos de guarda na América do Sul.
A filosofia de Cheval des Andes é trazer para a Argentina o rigor e a elegância dos grandes Bordeaux, combinando a vibrante expressão do Malbec argentino com a temperança da Cabernet Sauvignon e toques de Petit Verdot. O resultado é um blend único, capaz de envelhecer com graça e viajar pelas décadas, como define Pierre Lurton.
No nariz, os vinhos são complexos, mas não intensos; no paladar, equilibrados, nunca excessivamente potentes. Essa elegância é fruto de uma viticultura de precisão, em que cada parcela do vinhedo é cuidada por uma pessoa, da poda à colheita. O sistema de irrigação, com água obtida a partir do degelo dos Andes, evoluiu do método tradicional de inundação para o moderno gotejamento, aumentando a eficiência de 65% para 95% e permitindo o cultivo de vinhas profundas e saudáveis.
A vinificação é meticulosa. As uvas são colhidas manualmente, parcela por parcela, e vinificadas separadamente. Após a fermentação malolática, as equipes de Cheval des Andes e Château Cheval Blanc se reúnem para criar o pré-assemblage, base do blend final, que amadurece por 16 a 18 meses em barricas de carvalho francês e austríaco.
No Cheval Blanc temos a Cabernet Sauvignon como a variedade que forma a estrutura, o pano de fundo, a base do vinho para o seu potencial de envelhecimento, e a Malbec, que contribui com a suculência, a fruta e a acessibilidade do vinho jovem, disse Pierre Poblos, diretor-geral da Cheval des Andes. Mudamos completamente nossa visão de equilíbrio do vinho em nossa viticultura, passando gradualmente da irrigação por inundação para a irrigação por gotejamento. Esse sistema nos permitiu alcançar o básico, ou seja, fazemos tudo no processo de vinificação para não fazer nada na adega. E essa é a chave, a missão. Esse projeto ganhou força a partir de 2012, com a formação de uma equipe dedicada exclusivamente ao vinhedo, ampliando de seis para trinta pessoas. Cada colaborador cuida de sua parcela como se fosse sua casa, aprofundando o conhecimento do ambiente ano após ano.
A safra 2022, degustada em primeira mão durante um almoço com Poblos em São Paulo, mostrou ser a expressão máxima desse processo. Ainda que possa evoluir bastante na garrafa, está pronta para ser bebida já. Com 65% Cabernet Sauvignon, 30% Malbec e 5% Petit Verdot, representa uma melhoria significativa em relação aos históricos blends regionais de Mendoza, combinando uvas de Las Compuertas (Luján de Cuyo) e Paraje Altamira (Vale do Uco).
O envelhecimento ocorreu em 40% de barricas de Bordeaux de 225 litros, 35% de barricas de 400 litros e 25% de foudres de 2.500 litros, sendo 50% em carvalho novo. Um bouquet de frutas vibrantes como framboesa, mirtilo e cassis delicado e notas complementares de louro e menta dão lugar a um toque de cinza e pimentão suave. Ostentando notável concentração, taninos finos e uma ligeira cremosidade, apresenta uma estrutura firme, mas nunca rígida, mantendo o corpo sem perder o equilíbrio.
Futuro promissor
A vinícola Cheval des Andes é distribuída da seguinte forma: 50% pertencem ao conglomerado de luxo LVMH, 25% a Bernard Arnault, proprietário do grupo, e 25% a amigos dele. Em termos de negócios, essa condição se traduz em uma capacidade de investimento que poucas vinícolas podem se permitir.
Por isso mesmo, o futuro reserva um novo capítulo ainda mais robusto à joint venture, como afirma Davide Marcovitch, presidente da LVMH Moët Hennessy para a América Latina desde 2016. Segundo ele, uma nova vinícola está sendo criada para ser a mais bonita, a mais tecnológica e a melhor do continente. O investimento nessa planta exclusiva para Cheval des Andes está estimado em 15 milhões de euros, consolidando o compromisso com a excelência e a inovação.
O Grand Cru dos Andes, como é chamado por seus criadores, ajudou a colocar a Argentina no mapa dos grandes vinhos do mundo. A safra de 2017 representou um marco, alcançando 100 pontos na avaliação do crítico James Suckling. Agora, esse rótulo que sintetiza tradição, precisão e visão de futuro parece ser o indutor de uma nova era do vinho argentino, em que a Cabernet Sauvignon brilha em uma proporção capaz de superar em muito os atributos da Malbec que fizeram a fama de Mendoza.

