A economia brasileira atravessou, em 2025, um dos ambientes mais desafiadores dos últimos anos, marcado por uma combinação pouco usual de desemprego em níveis historicamente baixos e juros persistentemente elevados. A Selic em torno de 15% funcionou como um freio poderoso para o investimento produtivo, pressionou o caixa das empresas e reduziu drasticamente o apetite ao risco, afetando desde grandes indústrias até o ecossistema de startups. Nesse cenário de forte restrição monetária, aumento de recuperações judiciais e maior seletividade do capital, fintechs e plataformas de infraestrutura financeira também precisaram recalibrar estratégias para continuar crescendo. Em entrevista exclusiva ao BRAZIL ECONOMY, Gustavo Muller Medeiros, CEO da Monkey, faz um balanço crítico do ano, analisa os impactos do juro alto sobre o setor produtivo e a inovação, detalha o crescimento de cerca de 30% da companhia em 2025 e explica por que a expansão internacional será o principal motor de crescimento em 2026. O executivo também avalia como a chegada da duplicata escritural pode transformar o acesso ao crédito e reduzir o custo de financiamento para empresas brasileiras nos próximos anos.
O ano foi um ano marcado por indicadores macroeconômicos que caminharam em direções opostas, como desemprego baixo e juros extremamente elevados. Qual é o balanço que você faz do ano para a economia brasileira e para a Monkey?
Foi um ano de bastante turbulência na economia. Tivemos números que, à primeira vista, parecem positivos, como a taxa de desemprego baixa, mas convivendo com uma Selic em torno de 15%, o que é extremamente nocivo para o setor produtivo. Esse ambiente gera distorções. Muitas vezes, o emprego cresce em atividades de baixa produtividade, enquanto empresas estruturadas sofrem. Para a Monkey, o cenário doméstico foi desafiador, mas conseguimos crescer mesmo assim.
O aumento rápido dos juros teve impacto direto sobre as empresas?
Sem dúvida. O setor produtivo sofreu muito em 2024 e 2025. Houve um movimento brusco de juros baixos para juros muito altos. Muitas empresas haviam alongado seus financiamentos, aumentado o endividamento, e quando chegou o momento de renovar essas dívidas, o custo mais do que dobrou. Isso explica, em grande parte, o aumento expressivo dos pedidos de recuperação judicial que vimos no período.
Entre os fatores macroeconômicos, qual você considera o mais nocivo para o ambiente de negócios hoje?
A imprevisibilidade. O juro alto é consequência de um desequilíbrio maior, que envolve questões fiscais. Quando há gastos elevados de um lado, o outro precisa conter por meio de política monetária. É um tema difícil de separar da política, mas o fato é que a Selic alta por muito tempo está sufocando a produção e o investimento.
Como esse ambiente afeta especificamente o ecossistema de startups no Brasil?
As startups sentem mais. O investimento em inovação depende muito de apetite a risco. Com juros elevados, o investidor prefere ativos conservadores, com retorno previsível. Ninguém quer arriscar capital em um projeto ainda embrionário se consegue retorno elevado em renda fixa. Isso reduz drasticamente a quantidade de recursos disponíveis para startups e explica o arrefecimento do setor nos últimos anos.
Mesmo assim, o Brasil não ficou mais barato em dólar para o investidor estrangeiro?
O Brasil continua sendo um mercado enorme, digitalizado e cheio de oportunidades. O problema não é falta de potencial. O que falta é equilíbrio. Juros muito altos e instabilidade elevam a percepção de risco. Isso não elimina oportunidades, mas faz com que o capital seja mais seletivo e cauteloso.
Para a Monkey, esse cenário acabou sendo positivo ou negativo?
O custo do capital alto não é positivo para nós. Diferentemente de quem vive de spread, nossa receita não cresce simplesmente porque o juro sobe. Quando o dinheiro fica caro demais, as empresas reduzem produção, não expandem atividade econômica, e isso impacta diretamente o nosso negócio. Ainda assim, conseguimos entregar um bom resultado.
Qual foi o crescimento da Monkey em 2025?
Em volume de transações, crescemos cerca de 30% em 2025. Poderia ter sido mais, 50% ou até 100%, como se espera de uma startup, mas considerando o cenário macroeconômico, foi um resultado bastante sólido. O ano foi bom para a Monkey, mesmo com um ambiente macro ruim.
Quanto a plataforma movimentou no acumulado?
No total histórico, já superamos R$ 200 bilhões em transações, chegando perto de R$ 210 bilhões. Somente em 2025, movimentamos cerca de 40% desse volume.
Olhando para 2026, o que você projeta para a economia e para a Monkey?
A expectativa é de um ano parecido com 2025. Pode haver uma leve melhora da atividade econômica a partir do meio do ano, influenciada por fatores políticos e eleitorais, e talvez alguma redução gradual dos juros. Ainda assim, não espero uma mudança estrutural relevante no curto prazo. Para a Monkey, grande parte do crescimento em 2026 deve vir de fora do Brasil.
A expansão internacional ganha mais peso, então?
Exatamente. Hoje, menos de 5% da nossa receita vem de fora. Em 2026, estimamos que cerca de 15% da receita já seja internacional, principalmente com a consolidação das operações nos Estados Unidos e no México. No Brasil, devemos crescer em ritmo semelhante ao de 2025.
O modelo de negócios da Monkey é comum nesses mercados?
O produto de risco sacado existe há muito tempo fora do Brasil, mas em formatos mais tradicionais e bilaterais, geralmente operados por bancos. Nosso modelo de leilão é mais provocativo, amplia a concorrência e traz mais participantes para o mercado. No México, por exemplo, o estágio de maturidade lembra o Brasil quando lançamos a Monkey, o que abre espaço para crescimento.
Há planos de expansão para outros mercados, como a Europa?
A Europa é um mercado relevante, especialmente países manufatureiros. Mas ainda temos um caminho importante a percorrer nas Américas. Nosso foco agora é consolidar operações e flexibilizar a plataforma para atender empresas globais que queiram coordenar programas em diferentes países, mesmo que não sejamos o provedor transacional em todos eles.
Para finalizar, o que muda com a duplicata escritural para a economia e para as empresas?
No ano que vem, o impacto ainda deve ser limitado, porque a implementação efetiva ocorre no fim do ano. Mas, estruturalmente, a duplicata escritural vai trazer mais segurança para o sistema, com registros e notificações formais, favorecendo muito as médias empresas. Em 2027, o efeito tende a ser significativo, com acesso a capital mais barato e maior oxigenação da economia. Acredito que 2027 será o ano das empresas de médio porte. A Monkey quer se posicionar como um canal relevante, uma ferramenta de apoio aos empresários, nesse novo ambiente.

