Não existe um mineiro que se preze que desconheça a Drogaria Araujo. O mesmo vale para a Venancio no cotidiano carioca ou a Redepharma em todos os cantos da Paraíba. Estes três exemplos representam a receita básica das farmácias regionais brasileiras: basicamente restritas aos estados onde surgiram e alcançaram grande sucesso.
Mas, a Pague Menos optou por se expandir pelo Brasil e em 2024 sua bandeira assumiu a vice-liderança de mercado, ficando atrás apenas da Drogaria São Paulo, pertencente ao Grupo DPSP. Nascida no interior do Ceará, no início da década de 1980, ela se tornou a única rede a ter unidades em todos os estados brasileiros, além de oito centros de distribuição espalhados pelo Nordeste, Norte, Centro-Oeste e Sudeste.
“A líder de mercado quer atender as classes A e B, mas nosso posicionamento é diferente, já que prezamos por lojas em locais mais afastados. Além disso, cerca de 70% das nossas lojas estão localizadas no Norte e Nordeste, atendendo inclusive populações ribeirinhas. Considero que somos uma rede de acesso”, afirmou Jonas Marques, CEO da companhia desde o início de 2024 e o primeiro que não pertence à família Queirós, fundadora da rede.
A imagem da família e da companhia sofreu uma crise de imagem quando, em setembro de 2018, o então CEO Francisco Deusmar de Queirós foi preso por crime contra o sistema financeiro e se afastou do comando da Pague Menos.
Prestes a completar dois anos à frente da companhia, e com a redução da influência familiar, os resultados obtidos pela gestão de Jonas Marques mostram que os traumas do passado foram curados e a Pague Menos se levantou da melhor maneira: ao final de 2024, o faturamento consolidado da rede Pague Menos foi de R$ 12,6 bilhões, com um lucro de R$ 103 milhões, quase 40 vezes mais que em 2023. Uma empresa que crescia 8%, passou a crescer 17% sob a nova administração.
“Nosso prejuízo em 2023 tornou-se lucro em 2024 e este ano teremos ótimos números para apresentar”, disse o CEO, ressaltando que ainda não pode abrir as prévias de resultados.
Os resultados do IPO promovido em setembro de 2020, quando a companhia promoveu uma verdadeira revolução no mercado farmacêutico brasileiro ao sair de uma esfera 100% familiar para o mercado de capitais, ainda na esteira da prisão de Francisco Deusmar, também são positivamente sentidos cinco anos depois.
As ações da Pague Menos seguem em disparada neste fim de ano: durante o 3º trimestre de 2025, a companhia concluiu com sucesso uma oferta pública de ações e ampliou a base de investidores. O capex totalizou R$ 72 milhões, com foco em expansão orgânica, conversões de bandeira, modernização de lojas e no início da construção de um novo Centro de Distribuição na Paraíba.
De acordo com Jonas, grandes bancos têm trabalhado em parceria com a Pague Menos neste contexto de estruturação de capitais. “Itaú, BTG, XP e Bradesco nos ajudaram a fazer reuniões com investidores nos últimos meses para comprarem nossas ações. Os resultados foram ótimos e só no último mês elas subiram mais de 30%”.
Adotando uma linha de combate às doenças mais comuns da atualidade, a Pague Menos fortaleceu ainda sua atuação como hub de saúde voltado ao cuidado contínuo. O número de consultórios farmacêuticos chegou a 1.162 unidades, que somam 5,6 milhões de atendimentos nos últimos 12 meses, abrangendo aferição de glicemia e pressão, testes rápidos, vacinação e teleorientação.
O destaque foi a vertical de vacinação, que cresceu mais de 500% em 12 meses, atingindo 10,7% de market share no segmento de vacinas do varejo farmacêutico. A rede também expandiu parcerias com planos de saúde, empresas e órgãos públicos, incluindo uma iniciativa com o Ministério da Educação, que oferece condições exclusivas a 2,7 milhões de professores da rede pública. Esta estratégia em parceria com os baixos preços praticados pela rede são, de acordo com o CEO, um dos principais legados da Pague Menos no mercado nacional.
“O consumidor brasileiro tem baixa fidelidade na hora de escolher a rede de farmácia onde vai comprar. Ele dificilmente escolhe uma marca apenas por gostar dela e por isso que prezamos tanto pelos preços mais baixos e o cuidado com este tipo de doença”, enfatizou o CEO.
Atualmente, mais de 26% das lojas maduras já superam o marco de R$ 1 milhão em vendas mensais. O desempenho foi equilibrado em todo o país, com crescimento acima de 15% em todas as regiões e avanços expressivos tanto na bandeira Pague Menos como nas lojas convertidas da Extrafarma, que a rede adquiriu em 2021.
O terceiro trimestre de 2025 foi encerrado com um ciclo de forte crescimento e ganhos de rentabilidade. A companhia atingiu receita bruta de R$ 4,1 bilhões, alta de 18% frente ao mesmo período do ano anterior, consolidando seu oitavo trimestre consecutivo de expansão de market share, agora em 6,7%.
“Não sou CEO de rede social. Gosto de ir nas lojas e centros de distribuição para conversar com as pessoas olho no olho. Nossa estratégia é humanitária: queremos focar no tratamento de doenças crônicas, como hipertensão e obesidade, que são silenciosas e diminuem a expectativa de vida das pessoas. Para 2026, nossa ideia é continuar expandindo como temos feito, abrindo cerca de 50 lojas por ano”, disse Jonas.
Psicólogo CEO
Jonas Marques é um caso único de liderança nas grandes empresas brasileiras, já que não é formado em cursos voltados para administração. É psicólogo, com registro ativo no Conselho Regional de Psicologia, profissão que chegou a exercer antes de ingressar na indústria farmacêutica, onde atua há cerca de 30 anos. Liderou operações no Brasil, Europa e Oceania em empresas como Roche, Stiefel/GSK, ISDIN e Bayer.
Atuando na Oceania, foi procurado pelo CEO da Abrafarma, Sérgio Mena Barreto, para elaborar uma missão de executivos brasileiros que queriam conhecer o mercado farmacêutico local. Curador da missão, Jonas reencontrou, durante a visita, Mário Queirós, filho de Deusmar Queirós, fundador da Pague Menos. Na ocasião, Mário disse que estava insatisfeito com a função de CEO e buscava um sucessor, fazendo o convite para Jonas assumir o cargo. Após muito relutar, ele aceitou o desafio, e assumiu a missão no início de 2024.
Logo no primeiro mês no novo cargo, o executivo já teve que pôr em prática uma disputa de ideias entre o psicólogo e o CEO que, como todos, busca lucro para sua companhia: “Eu recebi a proposta de colocar cerveja sem álcool para vender em nossas unidades, mas fui contra, já que sei que uma pessoa que compra uma bebida dessas pode migrar para cervejas alcoólicas e isso vai 100% contra o que uma farmácia deve fazer”, lembrou.
Marketplace como ameaça?
Recentemente, a Amazon entrou no mercado de vendas de remédios nos EUA ao comercializar produtos da CVS, grande rede de farmácia local. Números da própria Pague Menos mostram o quanto o brasileiro é apto para comprar produtos farmacêuticos online: as vendas omnichannel da companhia totalizaram R$ 819 milhões no terceiro trimestre deste ano, expansão de 52,9% sobre o mesmo período de 2024. Isso representa 19,8% da receita bruta da rede.
O aplicativo Pague Menos manteve a trajetória de alta e já responde por mais da metade das transações online. Com uma malha de mais de 1,6 mil lojas integradas, 76% dos pedidos digitais foram entregues ou retirados em até 2 horas.
Diante disso, o CEO da Pague Menos teme que empresas do porte do Mercado Livre ou Magazine Luiza passem a comercializar remédios? A resposta é enfática: “Não temos esse medo. Nunca negaria uma bela competição, mas já trabalhei nesta área em pelo menos três continentes e posso te dizer que isso não vem ganhando tração fora do Brasil. No caso da Amazon, ela só tem 1% do mercado de medicamentos dos EUA já que as pessoas querem receber produtos de farmácia na hora e muitas vezes as plataformas de marketplace não possibilitam isso”.
“Seniorização” da companhia caminha para o final
Logo no início de sua gestão, Jonas iniciou mudanças no corpo diretivo da companhia com a troca de executivos de operações e de logística. Os níveis hierárquicos foram reduzidos de seis para três. De acordo com ele, o passado de psicólogo ajudou muito neste processo na hora de lidar com pessoas.
Atualmente com 27 mil colaboradores, o executivo afirma que este momento de mudanças caminha para o fim. A contratação mais recente foi de Simone Kmiliauskis Maciel, que assumiu como diretora de auditoria interna. Com mais de 20 anos de experiência, a executiva passou por Citi, Banco Toyota do Brasil, Beneficência Portuguesa e Serasa Experian.
“Nosso momento atual é de meio para o fim do turnaround. E neste processo decidimos reforçar diversas áreas, como auditoria, marketing, compliance e vendas. Estamos muito felizes com a chegada da Simone, já que nosso compliance já era bom e agora se aprimora. Nosso objetivo final é ‘seniorizar’ mais a companhia”, afirmou o CEO.

