Industrializar ou perecer? Tributação pode definir o futuro da construção brasileira

Toda a cadeia de processos industrializados depende de insumos fabricados, tecnologias de ponta e, muitas vezes, de uma logística interestadual

Rubens Campos*
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Imagens: Divulgação

"A construção civil está diante da oportunidade de ser protagonista de uma nova agenda de desenvolvimento"

"A construção civil está diante da oportunidade de ser protagonista de uma nova agenda de desenvolvimento"

A construção civil brasileira enfrenta hoje uma barreira estrutural que não nasce nos canteiros de obras, mas no sistema tributário. A combinação entre carga elevada e normas complexas cria um ambiente de custos imprevisíveis e de insegurança jurídica, tornando arriscado investir na industrialização, caminho natural para o futuro do setor. Em vez de estimular a eficiência, a inovação e a sustentabilidade que esse modelo oferece, a lógica tributária vigente acaba penalizando quem busca modernizar e mantém distorções que comprometem a competitividade.

Toda a cadeia de processos industrializados depende de insumos fabricados, tecnologias de ponta e, muitas vezes, de uma logística interestadual. Nesse contexto, cada etapa da cadeia produtiva é impactada por uma série de tributos que incluem ICMS, PIS, Cofins e IPI, aplicados de forma cumulativa e divergente entre diferentes estados. Essa fragmentação fiscal encarece o produto final e cria uma assimetria competitiva que, não raro, desestimula quem aposta em inovação.

Um dos efeitos mais nocivos dentro dessa estrutura é a presença de concorrência desleal. Empresas que não cumprem integralmente todas as obrigações fiscais conseguem oferecer preços artificialmente mais baixos, fragilizando o equilíbrio do mercado industrializado. Em contrapartida, aquelas que seguem todas as exigências veem sua rentabilidade comprimida, com menos espaço para investir em pesquisa, tecnologia e expansão dos processos produtivos avançados, contribuindo para a perpetuação do atraso no setor.

Entre os entraves mais comuns enfrentados pelas empresas estão a insegurança jurídica e a complexidade interestadual. No cenário atual, produtos iguais podem receber classificações fiscais completamente distintas a depender apenas do estado em que se encontram, expondo empresas a disputas tributárias e obrigando-as a manter estruturas fiscais complexas e caras. Além disso, diferenças de alíquotas, incentivos locais e a cobrança do DIFAL tornam a comercialização entre estados mais cara e burocrática, minando a competitividade de quem busca atuar em escala nacional.

Como consequência, esse ambiente tributário desafiador eleva custos e compromete a capacidade de financiamento, a atração de investimentos e também o desenvolvimento do próprio setor. Projetos de alto valor agregado, como fábricas de componentes e sistemas construtivos industrializados, exigem grande capital inicial e horizonte de retorno mais longo. Sem previsibilidade tributária, investidores internos e externos exigem prêmios de risco maiores ou direcionam recursos para mercados mais estáveis e atrativos.

Esse contexto exige uma reavaliação tributária para destravar o potencial do setor. A simplificação de regras, a adoção de uma alíquota única nacional com aproveitamento integral de créditos e uma maior transparência na aplicação das normas são medidas que ajudariam a reduzir a cumulatividade de impostos e eliminar as distorções regionais. Independentemente dos mecanismos escolhidos, é evidente que mudanças são urgentes e que a participação ativa do setor produtivo é indispensável para que a legislação reflita a realidade operacional das empresas.

Um dos caminhos a ser debatido é o alinhamento da tributação aos objetivos de desenvolvimento sustentável. Ao reduzir a carga sobre materiais e tecnologias de baixo impacto ambiental, o governo poderia transformar práticas sustentáveis de um mero diferencial de marketing para uma escolha verdadeiramente vantajosa, inclusive economicamente. Incentivos fiscais para empresas que comprovem redução de materiais, diminuição de desperdícios e reaproveitamento de recursos criariam um círculo virtuoso em que sustentabilidade se traduz em competitividade.

A construção civil está diante da oportunidade de ser protagonista de uma nova agenda de desenvolvimento no Brasil, baseada em inovação, produtividade e responsabilidade ambiental. Para que isso ocorra, a tributação precisa deixar de ser um entrave e tornar-se um instrumento de estímulo. Reavaliar o sistema fiscal voltado à industrialização pode ser o cimento capaz de unir eficiência econômica e sustentabilidade ambiental, permitindo que o Brasil construa um futuro competitivo e duradouro.

*Rubens Campos é CEO da Espaço Smart

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