“Práticas sustentáveis significam menor custo de capital”, afirma sócio da Deloitte

De acordo com Luiz Paulo Assis, sócio de finanças sustentáveis da companhia, iniciativas brasileiras são referências para players globais do setor

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Imagens: Divulgação

Luiz Paulo Assis, da Deloitte: IA deve ser vista como aliada das práticas de ESG nos próximos anos

Luiz Paulo Assis, da Deloitte: IA deve ser vista como aliada das práticas de ESG nos próximos anos

Luiz Paulo Assis não é necessariamente da geração que permanece décadas na mesma empresa, mas pode ser considerado um ponto fora da curva: desde que entrou no mercado de trabalho, decidiu traçar sua carreira na Deloitte, onde atua desde 2005, mesmo ano em que ingressou na faculdade de Economia. Transferido para o escritório de Nova York, onde fez MBA em Administração entre 2018 e 2020, retornou a São Paulo durante a pandemia e, pouco depois, tornou-se sócio, cargo que hoje acumula com o de líder de finanças sustentáveis.

Este ano, completou 20 anos de companhia, acompanhando de perto algumas das principais mudanças de mercado, como a adoção das práticas de ESG, que ganharam força no Brasil nos últimos anos. Com experiência na prestação de serviços de avaliação de negócios e modelagem financeira para M&A, estudos de viabilidade, análise de perfil de risco de projetos, portfólio de projetos de capital, avaliação de viabilidade de transição energética e projetos de restauração de créditos de carbono, o executivo conversou com o BRAZIL ECONOMY sobre o atual momento das finanças sustentáveis no Brasil e no mundo. Confira:

Como os bancos avançaram na pauta de finanças sustentáveis nos últimos anos?
Os bancos brasileiros têm evoluído significativamente na integração de critérios ESG e no financiamento de atividades sustentáveis. A Febraban, por exemplo, desenvolveu uma taxonomia verde que já aponta que mais de 21% do crédito corporativo está direcionado a esse tipo de economia. Adicionalmente, bancos comerciais podem liberar seus balanços para novos empréstimos climáticos ao securitizar carteiras de crédito performadas em setores como energia renovável e agricultura sustentável. Além disso, a proposta de veículos de securitização com garantias de risco político e cambial pode atrair investidores institucionais globais, criando um ciclo virtuoso de reciclagem de capital para novos projetos alinhados aos planos de ação climática que cada país deve estabelecer para reduzir suas próprias emissões de gases de efeito estufa.

A Inteligência Artificial tem impactado de alguma maneira a pauta das finanças sustentáveis?
A IA é uma aliada estratégica das finanças sustentáveis, pois a importância de dados confiáveis, padronizados e auditáveis para orientar investimentos sustentáveis nunca foi tão grande como agora. A IA pode ser essencial para monitorar, verificar e relatar indicadores ESG, além de apoiar a avaliação de riscos climáticos em tempo real. Além disso, a tecnologia permite o desenvolvimento de modelos preditivos e sistemas de rastreabilidade em cadeias produtivas de baixo carbono, criando infraestruturas digitais robustas e transparentes, como registros interoperáveis e sistemas de monitoramento, reporte e verificação. Ela permite processar grandes volumes de dados ESG, identificar riscos climáticos e sociais com mais precisão e combater o greenwashing por meio da verificação automatizada de informações, além de facilitar a conferência de créditos de carbono.

Como as seguradoras se posicionam neste mercado?
Estamos vendo algum movimento de seguradoras, mas ainda é um grupo que precisa de mais estrutura para se tornar viável em escala. Elas têm papel fundamental na precificação de riscos climáticos e na construção de resiliência. A Superintendência de Seguros Privados já estabeleceu diretrizes para que o setor integre critérios ESG na gestão de riscos e produtos. O setor privado sugere que instrumentos pré-arranjados, como seguros paramétricos e fundos soberanos de risco, sejam integrados aos frameworks de finanças climáticas.

O novo acordo de Basileia engloba este tema?
Embora o Acordo de Basileia III não tenha sido originalmente concebido com foco em sustentabilidade, há um movimento crescente para incorporar riscos climáticos ao arcabouço regulatório. O Comitê de Basileia discute a inclusão de riscos ambientais no Pilar 3, que trata da transparência. Temos visto discussões e conduzido fóruns em que se discute que riscos climáticos sejam integrados aos marcos prudenciais internacionais, com destaque para a necessidade de produtos financeiros escaláveis e estruturas de investimento institucional que reconheçam ativos sustentáveis como de menor risco sistêmico. Adicionalmente, esse assunto vem sendo debatido desde o ano passado, quando a Deloitte foi Knowledge Partner da força-tarefa de finanças e infraestrutura do B20, e alguns itens vêm sendo discutidos com mais ênfase desde então.

Como quais, por exemplo?
Eu diria que a revisão dos requisitos prudenciais para reconhecer os atributos de mitigação de risco de instrumentos, como blended finance e garantias multilaterais. Também destaco o tratamento regulatório diferenciado para instrumentos financeiros sustentáveis, com pesos de risco mais adequados, além do reconhecimento do papel dos bancos multilaterais de desenvolvimento na redução do risco sistêmico.

Quais países estão mais avançados nesta pauta?
Países como o Reino Unido, por meio do Transition Plan Taskforce e dos planos de transição corporativa, e os da União Europeia, que lideram com a Taxonomia e o regulamento SFDR, estão na vanguarda, com políticas robustas de finanças verdes, taxonomias bem definidas e mercados de carbono em expansão. Não podemos deixar de citar o Brasil como referência em iniciativas como o Eco Invest, a Chamada de Clima e o desenvolvimento de uma taxonomia verde.

E quais o senhor diria que são as principais vantagens competitivas que as finanças sustentáveis proporcionam às empresas atualmente?
Práticas sustentáveis significam menor custo de capital para as empresas, melhor acesso a crédito e títulos verdes, atraem investidores e consumidores conscientes e reduzem riscos regulatórios e operacionais. Além disso, fortalecem a reputação, a resiliência operacional e a competitividade de longo prazo.

Qual sua expectativa para a COP30?
A COP30 representa uma oportunidade histórica para o Brasil liderar a agenda global de finanças sustentáveis. A Chamada de Clima, liderada pelo Ministério da Fazenda, já sinaliza esse protagonismo, mostrando a outras nações que o Brasil já está mobilizando capital público e privado para o clima. Mas é fundamental incorporar as lições das COP28 e COP29, tanto os compromissos assumidos quanto as lacunas identificadas, e avançar na criação de estruturas de de-risking capazes de atrair capital privado para o setor. A mobilização de capital em escala para mitigação, adaptação e resiliência é um dos maiores desafios e oportunidades já vistos. A proposta do setor privado na COP30 é avançar em algumas frentes, como o ajuste de mecanismos financeiros para mitigar riscos macroeconômicos e atrair capital privado para países emergentes, convergir mercados de carbono com integridade e interoperabilidade e destravar soluções para setores de difícil descarbonização, como aviação e transporte marítimo. A expectativa é que a COP30 avance da formulação para a implementação, com foco em instrumentos financeiros concretos, como garantias para riscos macroeconômicos, contratos por diferença, plataformas de capital de giro para PMEs verdes e securitização de carteiras de crédito climático.

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