Dividir para multiplicar. Essa é a síntese do plano estratégico da sueca SKF para o Brasil nos próximos meses. A empresa vai se tornar duas no País, assim como já ocorreu nos Estados Unidos e na Ásia. A companhia está em estágio avançado no plano de se dividir em SKF Industrial e SKF Automotivo (nome ainda em definição), ambas com ações negociadas nas bolsas de Estocolmo e da Nasdaq. A separação das estruturas no País, o chamado “Day Zero”, está prevista para janeiro de 2026. A listagem da divisão automotiva na bolsa sueca deve ocorrer até junho de 2026, em linha com o cronograma global.
Faz sentido essa manobra? “São dois negócios que exigem focos diferentes. O objetivo é deixar cada operação no tamanho certo, mais ágil e eficiente, para competir melhor”, justificou o CEO da SKF Brasil, Alex Pereira, em entrevista exclusiva ao BRAZIL ECONOMY. “A reestruturação busca foco, flexibilidade e agilidade para acelerar um crescimento lucrativo, com expansão em serviços e em segmentos industriais onde a companhia vê maior potencial.”
O movimento ocorre em um ano desafiador para o setor industrial global. Segundo o relatório anual de 2024, a SKF registrou receita líquida de 98,7 bilhões de coroas suecas (SEK). Pelo câmbio atual, o resultado representa US$ 9,14 bilhões, queda de 5,4% em relação ao ano anterior, mas manteve margem operacional ajustada de 12,3%, desempenho considerado resiliente diante do ambiente macroeconômico adverso e dos efeitos cambiais negativos.
O tabuleiro logístico e corporativo também muda. A SKF instalará um novo escritório em Jundiaí (SP), no condomínio Delta Park, com mudança prevista para janeiro, e consolidará um centro de distribuição (CD) em Garuva (SC), próximo ao porto privado de Itapoá. O modelo do CD será operado pela Tecade, em formato 3PL. “É um hub inbound para o mercado interno. A proximidade com Itapoá aumenta confiabilidade e previsibilidade”, explicou Pereira.
A fábrica automotiva segue em São Paulo, e a operação industrial no Brasil continuará baseada em importações. A SKF possui 77 fábricas no mundo, abastecendo o País principalmente a partir de unidades na Suécia, França, Itália, Alemanha, China, Índia e Malásia.
Como parte do redesenho, o grupo conduziu a redução de 1.200 posições administrativas no mundo, financiando a transição e simplificando a governança. “No Brasil, o impacto foi mínimo: menos de dez pessoas”, afirma Pereira.
Ao contrário do panorama global, em que a divisão industrial representa 70% da receita e 89% do lucro operacional, o Brasil apresenta equilíbrio entre os negócios automotivos e industriais. A estratégia local prioriza quatro verticais: mineração, cimento, alimentos e bebidas, e agronegócio. “Estamos bem posicionados e vamos aprofundar o portfólio com produtos e aplicações específicas para ganhar mercado”, disse Pereira.
Globalmente, o setor industrial responde por um mercado estimado em US$ 30,5 bilhões, enquanto o automotivo movimenta US$ 16,2 bilhões, com liderança da SKF em rolamentos para eletrificação, transporte ferroviário e aeroespacial.
Serviços como motor de crescimento
A expansão em serviços e remanufatura é um dos pilares do plano de crescimento lucrativo. No mundo, 47% das vendas da SKF já vêm do pós-venda e de serviços, apoiados por uma rede de mais de 17 mil distribuidores. No Brasil, mais da metade da equipe industrial atua dentro dos clientes, com contratos de manutenção preditiva, análise de vibração e lubrificação.
Um exemplo é o centro de serviços da mineradora Vale, em São Luís (MA), onde a SKF realiza remanufatura de mais de 200 rolamentos por dia, equivalentes a cerca de 50 mil por ano. “É produtividade com sustentabilidade: diminui paradas e evita emissões associadas à fabricação de peças novas”, destacou Pereira. O modelo será replicado para outros clientes com parque ferroviário e potencialmente para o setor de óleo e gás, impulsionado pelas perspectivas de exploração da Margem Equatorial.
O relatório global da SKF aponta que mais de 90% dos projetos de inovação da companhia já estão concentrados em segmentos de alto crescimento, como máquinas de alta velocidade, agricultura, alimentos e robótica, todos com margens acima da meta financeira de 14%. A empresa investiu US$ 305 milhões em P&D em 2024 e lançou produtos com até 20% menos fricção e 70% menos emissões de CO₂ no processo produtivo.
A meta global da SKF é atingir operações totalmente descarbonizadas até 2030 e emissões líquidas zero em toda a cadeia de suprimentos até 2050. A empresa recebeu, pelo quinto ano consecutivo, o selo Platinum da EcoVadis e o rating máximo de Mudança Climática do CDP, consolidando sua posição entre as líderes em sustentabilidade industrial.
Além da inovação tecnológica, a SKF vem acelerando a regionalização de sua cadeia produtiva, reduzindo prazos de entrega em até 25% na China desde 2019, o que melhora a competitividade e reduz emissões logísticas. Essa estratégia, segundo Pereira, inspira o modelo adotado no Brasil com o novo hub logístico em Santa Catarina.
Câmbio e políticas comerciais
Com um supply 100% importado no segmento industrial, a volatilidade cambial é um risco central. A empresa responde com políticas comerciais que garantem previsibilidade para distribuidores e clientes. “Mitigar câmbio exige disciplina diária. Quando há sobe e desce, o risco é o cliente comprar no pico e ver o estoque desvalorizar. Nossas políticas reduzem essa incerteza”, afirmou.
A governança global foi reforçada com a regionalização que criou as regiões Américas, EMEA, Ásia e China/Nordeste Asiático, cada qual com presidentes regionais. O Brasil, sob gestão de Alex Pereira, está subordinado à liderança das Américas, baseada na Filadélfia.
Os indicadores de longo prazo da SKF incluem meta de margem operacional de 14% (atual 12,3%), crescimento de receita de 5% ao ano, ROCE de 16% (atual 14,2%) e pagamento de dividendos de 50% do lucro líquido.
O caixa operacional somou SEK 10,8 bilhões (US$ 1 bilhão), e a dívida líquida/Ebitda permaneceu em 1,1, refletindo sólida posição financeira e capacidade de investimento. A companhia destinou 3,4% da receita global para P&D, com foco em soluções de alta eficiência energética e baixa fricção, além de iniciativas de descarbonização que já reduziram em 59% as emissões de CO₂ (escopos 1 e 2) em relação a 2019.
Sem abrir números locais absolutos, Pereira confirma que a SKF Brasil cresce em dois dígitos em 2025, sustentada pelos segmentos de mineração, cimento e alimentos. A base de clientes industriais recorrentes supera 2 mil empresas. “O cliente não compra só um rolamento: compra disponibilidade. É por isso que engenharia de aplicação, confiabilidade e serviços são nossos grandes diferenciais”, acrescentou Pereira.
Diante da nova estrutura de negócios da gigante sueca em todo o mundo, quando se citar a SKF a partir de janeiro de 2026, será preciso fazê-lo no plural, não mais no singular.

