Preocupante. Essa é a palavra que resume o cenário de produção e venda de pneus nacionais no Brasil nos últimos anos. O total de unidades comercializadas em 2024 foi o menor desde 2013, ao mesmo tempo em que as importações aumentam com a invasão de produtos asiáticos. Levantamento do BRAZIL ECONOMY com base em dados da Associação Nacional da Indústria de Pneumáticos (ANIP) mostra que a balança comercial brasileira é negativa em US$ 1,96 bilhão — ou R$ 10,5 bilhões — de 2021 a setembro deste ano.
“O setor de pneumáticos está sofrendo bastante. Nos últimos anos houve uma entrada muito grande de produtos asiáticos, que balançou bastante a cadeia de negócios. A indústria brasileira precisa de equidade”, disse Lafaiete Oliveira, country manager da Bridgestone no Brasil.
“Alguns governos estão se protegendo. O governo americano se protegeu, o governo mexicano está com sistemas de defesa e nós baixamos os nossos”, frisou o executivo, sobre a abertura do mercado aos pneus asiáticos nos últimos cinco anos no País.
A ANIP solicitou recentemente ao governo federal a elevação da alíquota do imposto de importação sobre pneus de automóveis de passageiros, de 25% para 35%. No mês passado, o Comitê-Executivo de Gestão (Gecex), da Câmara de Comércio Exterior, barrou o pedido, mantendo a taxa em 25% pelos próximos 12 meses.
Os dados da ANIP apontam que, em 2019, a balança comercial do setor de pneumáticos registrou superávit de US$ 151,4 milhões, mesmo com a exportação (14,9 milhões de unidades) sendo bem menor do que a importação (35,7 milhões). A diferença é de mais de 20 milhões de unidades, o que significa que os pneus que entraram no Brasil são muito mais baratos do que os vendidos pela indústria nacional ao exterior.
“O produto chinês é 60% mais barato do que o nosso produto premium. Quando ele entra no Brasil abaixo do preço de custo da matéria-prima, alguma coisa errada tem”, afirmou o executivo da Bridgestone.
Já a balança comercial de 2024 aponta um déficit de US$ 880,3 milhões. Nesse caso, as importações saltaram para 54 milhões de unidades, enquanto as exportações caíram para 11,6 milhões.

O levantamento mostra ainda que, em 2019, os pneus de fabricação nacional respondiam por 62,5% das vendas no mercado brasileiro. No ano passado, essa fatia caiu para 48,4%, com domínio de pneus importados — especialmente asiáticos — no território verde-amarelo.
“O market share mudou completamente. A mudança foi muito brusca”, afirmou Oliveira, ressaltando que as empresas com fábrica no Brasil ainda têm obrigações ambientais de produção e reciclagem, o que não ocorre com as companhias importadoras.
“Só em reciclagem, os associados da ANIP investem R$ 100 milhões por ano”, disse. “A gente continua atendendo todas as normas. Estamos sofrendo para manter a competitividade. O jogo está sem paridade”, destacou.
Oliveira fez questão de aprofundar o tema ao expor a capacidade da Bridgestone, uma das maiores fabricantes de pneus do mundo, com faturamento global de US$ 29,1 bilhões no último ano fiscal.
“Temos mais de 130 fábricas espalhadas pelo planeta. Se é para ser importador, também podemos ser. Mas não é nisso que acreditamos. Acreditamos na solidez do nosso negócio no Brasil. Queremos fazer a indústria pneumática dar certo por aqui. Esse é o nosso objetivo”, afirmou, de forma enfática.
Para o country manager da Bridgestone, outro ponto a ser discutido é o financiamento para compra de pneus, principalmente para caminhoneiros autônomos.
“O desafio da indústria é fazer o pneu caber no bolso do cliente. E não estou falando simplesmente de preço, pois isso envolve outros fatores, como qualidade do produto e, consequentemente, riscos de segurança. Falo realmente de caminhoneiros e empresas terem fôlego para fazer o que é melhor para sua frota”, afirmou o executivo, ao observar que as companhias e o governo precisam encontrar caminhos de forma conjunta.

Como a Bridgestone tem enfrentado esses desafios?
A Bridgestone possui quatro fábricas no Brasil – é a empresa com o maior número de plantas entre as 11 marcas que atuam no País, com 21 unidades no total. São duas em São Paulo (Santo André, de pneus para veículos pesados, e Campinas, de recapagem), uma na Bahia (de pneus para automóveis leves) e outra em Santa Catarina (também de recapagem).
Nos últimos dois anos, os investimentos em modernização e ampliação das unidades no Brasil somaram R$ 2 bilhões, o que possibilitou diversificar o portfólio. Um exemplo é o recém-lançado modelo R167E, destinado a veículos que operam nos centros urbanos no transporte de passageiros – como ônibus e caminhões de lixo ou betoneiras.
Entre as características estão a maior capacidade de carga, compatível para uso em veículos elétricos, 20% mais durabilidade e um composto com quantidade superior de material reciclável.
“Ainda proporcionamos a garantia de três recapagens. Significa que o pneu vai rodar cerca de 150 mil quilômetros, será recapado e rodará outros 150 mil, por três vezes. É um casco feito de aço, com camadas de cinta – uma tecnologia que possibilita muita qualidade”, afirmou Lafaiete Oliveira, anunciado em setembro como country manager da Bridgestone no Brasil, após liderar operações no Chile, Peru, Bolívia, Paraguai e Uruguai, além de atuar nos últimos três anos à frente do mercado da Argentina e de países não industriais da região.
O retorno do executivo brasileiro ao País faz parte de um movimento da matriz, que adota uma estratégia de fortalecimento de sua presença no Brasil, com foco em impulsionar o crescimento sustentável local.
A Bridgestone atua no mercado nacional com três marcas: a que leva o nome da companhia, a Firestone, comprada nos anos 1980, e a Bandag, adquirida em 2007.
Os pilares de negócios também são três: carros novos, pneus de reposição e exportações. Cada um deles representa entre 30% e 35% da receita da empresa no País.
O posicionamento é ancorado na tecnologia Enliten, uma espécie de “novo premium”, que eleva os níveis de design e desempenho, com ênfase na sustentabilidade.
Entre os setores em que a Bridgestone tem concentrado esforços estão a mineração, o agronegócio e a construção civil – segmentos que demandam pneus mais robustos, off the road, e geram maior valor agregado para a companhia.
“O Brasil tem muita infraestrutura para fazer e muita área ainda para ser explorada na parte de mineração. Sem dúvida, esse é um mercado pujante, que exploramos bem e que ainda tem muito para crescer”, disse o executivo.
“Na parte de pneus agrícolas, tem sido um grande desafio devido à invasão de pneus extremamente baratos. Mas os produtores têm valorizado muito o pneu que reduz a compactação do solo, para que a produtividade seja melhor. Temos produtos para atender a essa demanda”, afirmou.
“E o pneu de caminhão é o nosso grande filé, onde o nosso produto tem altíssimo reconhecimento. O transportador, quando compra um pneu, adquire um ativo. Temos avançado nesse conceito”, concluiu Oliveira.
Com uma estrada desafiadora pela frente, a Bridgestone mantém a rota, mesmo quando o terreno brasileiro se apresenta irregular.

