Cerca de três semanas depois de um apagão de dados, por causa do shutdown do governo dos Estados Unidos há 24 dias, a agenda de indicadores econômicos volta a cumprir o seu papel no mercado financeiro. Os números da inflação ao consumidor brasileiro (IPCA-15) e norte-americano (CPI) estão em destaque nesta sexta-feira (24) e devem calibrar as apostas em relação ao rumo dos juros no Brasil e nos EUA.
Enquanto lá fora os preços no varejo devem continuar salgados, com a taxa acumulada em 12 meses subindo para o nível mais alto em 16 meses; aqui, a prévia do índice oficial deve mostrar uma firme desaceleração – mais por causa da conta de luz e ainda sem contemplar a redução da gasolina anunciada nesta semana. Ou seja, o IPCA deste mês, que sai no início de novembro, pode registrar deflação.
Porém, este cenário inflacionário mais benigno não deve abalar a convicção do mercado de que o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central não deve cortar a taxa Selic tão logo. Em contrapartida, as apostas unânimes de um segundo corte consecutivo nos juros dos EUA pelo Federal Reserve já na semana que vem tampouco devem mudar por causa do CPI.
De um lado, o Fed estaria mais preocupado com o mercado de trabalho nos EUA. De outro, o Copom segue “bastante incomodado” com as expectativas de inflação fora da meta. Mas enquanto o Fed opera “no escuro”, já que os dados do payroll foram os primeiros a sentir os efeitos da paralisação do governo norte-americano; o Copom trabalha com instrumentos que já mostram um processo rápido de desinflação.
Migração intramercados
Portanto, enquanto a política monetária e o shutdown estão equilibrados nos EUA; no Brasil, há um descompasso entre os efeitos da inflação e os juros básicos. Esse ritmo desigual por aqui se dá, principalmente, por causa do dólar. Aliás, o BC anunciou uma operação simultânea no mercado de câmbio exatamente para o dia de decisão do Fed, na próxima quarta-feira (27).
A autoridade monetária local vai irrigar os negócios e injetar até US$ 1 bilhão na venda de dólares à vista e outros US$ 1 bilhão no equivalente à compra de dólar futuro. A atuação do BC, conhecida como “casadão”, visa mitigar pressões de alta no chamado cupom cambial (que reflete juro em dólar no Brasil). A mesma operação ocorreu em junho, quando o Copom elevou a Selic para os atuais 15%, mas o Fed ficou inerte.
A pergunta que fica é: se agora o Fed irá cortar os juros e o Copom seguirá imóvel, por que se espera uma demanda pontual pela moeda norte-americana em um dia que sequer será uma “Super Quarta”? Afinal, com a taxa nos EUA movendo para a faixa de 4% ou menos, o dólar tende a perder valor. Ao mesmo tempo, com a Selic estacionada, o diferencial entre os juros praticados aqui e lá tende a aumentar, o que atrai capital externo para a renda fixa.
Ao que tudo indica, o BC tem em mãos as ferramentas necessárias para aproveitar uma oportunidade única: favorecer as operações de carry trade e encarecer o hedge cambial. Assim, fica mais difícil para o investidor (leia-se estrangeiro) que esteja apostando na alta do dólar (posição comprada). Ao mesmo tempo, favorece quem estiver fazendo proteção nos juros – no caso, os institucionais (bancos, gestoras, fundos de pensão etc.).
Assim, o dinheiro estrangeiro não sai do Brasil – apenas muda de mesa, migrando da bolsa para os juros, diante do espaço mais estreito para ganhos no dólar. Nesse quebra-cabeça, sobra para a bolsa brasileira: é o Ibovespa quem deve sofrer, com os gringos realizando os lucros fantásticos na renda variável doméstica. Ainda assim, esse capital não vai embora, só troca de posição.
No fundo, o que se desenha é uma realocação silenciosa de recursos entre os ativos locais – e não uma fuga, tal qual se viu no fim do ano passado em meio às remessas. Acima de tudo, trata-se de um típico rearranjo de fim de ciclo, abrindo caminho para o novo – quiçá, de queda da Selic.
Passeio pelos mercados
Os índices futuros das bolsas de Nova York amanheceram em alta, tentando dar continuidade aos ganhos da véspera. Na Europa, prevalece o sinal negativo, enquanto na Ásia, o dia foi positivo.
Entre as moedas, o dólar ganha terreno em relação às moedas rivais, com o índice DXY sobe (cesta de moedas de economias avançadas) sustentando-se na faixa de 99 pontos.
Nas commodities, o petróleo mostra fôlego curto para ampliar o rali da véspera, enquanto o minério de ferro negociado em Dalian (China) fechou em baixa. O ouro também recua.
Entre as criptomoedas, o Bitcoin sobe.
Agenda do dia
Indicadores
- 8h30 – Brasil: Nota do setor externo (setembro)
- 9h – Brasil: IPCA-15 (outubro)
- 9h30 – EUA: Índice de preços ao consumidor – CPI (setembro)
- 10h45 – EUA: índice PMI S&P composto (prévia – outubro)
- 11h – EUA: Índice de sentimento do consumidor (outubro)
Balanços
- EUA: Procter & Gamble (antes da abertura)
- Brasil: Usiminas (antes da abertura)

