Ray Dalio diz que o “ataque cardíaco da dívida” dos EUA acontecerá sob Trump

Reduzir impostos deliberadamente diminui a arrecadação, e o governo americano não tem dado qualquer sinal de que pretende desacelerar os empréstimos

Eleanor Pringle (Fortune)
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Imagens: GettyImages

Ray Dalio, megainvestidor americano, alerta que a queda nas receitas tributárias pode desencadear um colapso

Ray Dalio, megainvestidor americano, alerta que a queda nas receitas tributárias pode desencadear um colapso

Ray Dalio, megainvestidor e gestor de hedge funds americano, conhecido por fundar a Bridgewater Associates, em 1975, alerta que os Estados Unidos enfrentam um “ataque cardíaco induzido pela dívida” em até três anos sob as políticas orçamentárias de Donald Trump, citando um endividamento insustentável e custos de juros em disparada. Embora economistas concordem que a crise vem sendo gestada há anos, eles alertam que a queda nas receitas tributárias e o aumento explosivo do serviço da dívida podem desencadear um colapso caso os investidores percam a confiança.

De Jamie Dimon a Jerome Powell, muitos acreditam que uma crise da dívida nacional se aproxima. Só não sabem quando. Dalio, por sua vez, não tem receio de estipular um prazo: ele diz que um “ataque cardíaco induzido pela dívida” acontecerá no atual governo, em no máximo dois ou três anos.

Dalio não é novato em soar o alarme nesse tema. No início do ano, afirmou que os economistas que acreditam que a América pode continuar aumentando sua dívida sem consequências não “entendem a mecânica” do problema.

Nesta semana, ele foi além e deu um prazo iminente para a crise, atribuindo parte disso às políticas do segundo mandato de Trump. “Os grandes excessos que agora estão projetados como resultado do novo orçamento provavelmente causarão um ataque cardíaco induzido pela dívida em um futuro relativamente próximo”, disse Dalio ao Financial Times. “Eu diria três anos, mais ou menos um ou dois.”

Apesar de Trump ter promovido seu segundo mandato como uma era de corte de custos e eficiência (já desaparecendo da memória os meses do Departamento de Eficiência Governamental sob Elon Musk), a Casa Branca levantou sobrancelhas com o One Big Beautiful Bill Act (OBBBA), que Trump chamou de o maior corte de impostos da história para americanos das classes trabalhadora e média.

Mas isso não ajuda a equilibrar as contas. Se qualquer entidade (pública, privada ou individual) quiser reduzir sua dívida, tem duas opções: contrair menos empréstimos ou aumentar a receita. Reduzir impostos deliberadamente diminui a arrecadação, e o governo Trump não tem dado sinais de desacelerar os empréstimos.

O Escritório de Orçamento do Congresso (CBO) afirmou, por exemplo, que o OBBBA adicionará US$ 3,4 trilhões à dívida nacional, embora tenha ponderado que boa parte desse custo seria compensada pelas receitas tarifárias. A visão compartilhada pela maioria dos economistas é que o governo Trump não acelerará a crise da dívida, mas também não a retardará.

Ignorar o problema só o tornará mais doloroso no futuro. No momento, a dívida americana está em US$ 37,3 trilhões, e até julho o custo anual de sua manutenção já ultrapassava US$ 1 trilhão, o mesmo que 17% de todo o orçamento federal.

De fato, cálculos da Fortune mostraram que a receita tarifária (cerca de US$ 30 bilhões por mês) não cobre nem de longe os pagamentos mensais de juros da dívida, muito menos reduz o montante total. Dados do Tesouro dos EUA vistos pela revista apontam que, apenas em julho, os juros acumulados em notas do Tesouro chegaram a US$ 38,1 bilhões, somados a US$ 13,9 bilhões em títulos do Tesouro, US$ 2,85 bilhões em notas de taxa flutuante e US$ 6,1 bilhões em TIPS (títulos protegidos contra inflação). A conta é pesada: US$ 60,95 bilhões só no mês.

Dalio ressaltou que o gigantesco endividamento não é culpa exclusiva de um governo, mas sua preocupação com o atual é que ninguém se levantará contra o sistema em nome da economia. “Acho que o que está acontecendo agora, política e socialmente, é análogo ao que ocorreu em várias partes do mundo entre 1930 e 1940”, disse o fundador da Bridgewater Associates.

Ele citou decisões como a compra pelo governo de uma fatia relevante da Intel e acrescentou: “Estou apenas descrevendo as relações de causa e efeito que estão movendo o que está acontecendo. E, aliás, em tempos como esse, a maioria permanece em silêncio porque tem medo de retaliação ao criticar.”

Quando os compradores recuam

Dalio comparou a economia dos EUA a um sistema circulatório entupido de placas, com os pagamentos de juros sufocando gradualmente outras formas necessárias de gasto.

Em algum momento, segundo ele, os compradores de dívida americana vão começar a questionar se o governo pode funcionar nessas condições. “A demanda por dívida provavelmente não acompanhará a oferta.”

Esse é o cenário de colapso semelhante ao vivido pelo Reino Unido sob Liz Truss, explicou o professor João Gomes, da Wharton, em entrevista anterior à Fortune.

Em 2022, a então primeira-ministra britânica apresentou um mini-orçamento com uma série de estímulos fiscais sem financiamento, assustando o mercado londrino a ponto de a libra despencar ao menor valor da história frente ao dólar.

Gomes resumiu: “Se em algum momento esses investidores, que até agora têm comprado alegremente dívidas de grandes economias, decidirem: ‘Sabe de uma coisa, não tenho certeza se esse é um bom investimento. Quero um juro maior para ser convencido a segurar isso’, então podemos ter um acidente real em nossas mãos.”

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