“Garantimos um projeto histórico”, disse Thomas Hinnerskov, CEO da multinacional finlandesa Valmet, após conquistar o contrato de mais de 1 bilhão de euros junto à gigante de celulose chilena Arauco, para fornecer soluções de automação e controle de fluxo para a nova fábrica da empresa que está sendo construída na cidade de Inocência, no Mato Grosso do Sul. A expressão do executivo não é exagero: trata-se do maior contrato dos 225 anos de história da companhia, para equipar a maior planta de celulose do mundo construída em etapa única. O investimento é de US$ 4,6 bilhões, o maior da história da Arauco. O BRAZIL ECONOMY conversou com executivos da Valmet para saber os detalhes dos processos, da logística e dos equipamentos que estão sendo fornecidos ao chamado Projeto Sucuriú – assim batizado por ser instalado às margens do rio homônimo.
A nova fábrica tem previsão de início de operação no segundo semestre de 2027. Os contratos de fornecimento foram assinados no fim de outubro de 2024. “É o maior projeto que a Valmet possui em toda a sua história. Tem bastante tecnologia envolvida”, disse Sérgio Bandeira Junior, diretor de Operações de Automação da Valmet na América do Sul.
O projeto entra para a história da companhia e movimenta os ponteiros financeiros da empresa, que em 2024 registrou vendas líquidas globais de 5,4 bilhões de euros. No primeiro semestre deste ano, os pedidos recebidos pela Valmet aumentaram 22%, para 2,85 bilhões de euros. Em termos de vendas líquidas, os três principais países foram Estados Unidos, Brasil e China, que juntos representaram 44% do total nos mais de 40 mercados em que a corporação atua. O Projeto Sucuriú tem tudo a ver com esse desempenho.

Dentro de casa
A indústria que está sendo construída pela Arauco terá capacidade para produzir 3,5 milhões de toneladas de celulose por ano. Atualmente, o Brasil produz 24,3 milhões de toneladas anuais. Ou seja, a planta sozinha será responsável por 14,4% da produção nacional.
Está localizada em uma área de 3.500 hectares (o equivalente a 3.500 campos de futebol), no município que fica a 330 quilômetros da capital Campo Grande (MS).
A maior parte do trabalho da Valmet, neste momento, está sendo feita “dentro de casa”, disse Bandeira Junior. A engenharia in house engloba toda a especificação da planta, layouts de sistemas, programação dos softwares que vão operar e a produção dos equipamentos, que já começam a ser transportados para o Mato Grosso do Sul.
“Os testes de aceitação são feitos antes de serem enviados a campo, para validação de acordo com o que está especificado. Vão começar no início de 2026 e devem ser finalizados por volta de agosto do mesmo ano”, frisou o executivo, que enfrentou concorrência de outras empresas até conquistar o projeto histórico, comemorado pelo CEO global. A relação da finlandesa com a Arauco em outros projetos no Brasil, no Chile e em outros países também pesou a favor.
Alguns equipamentos são fabricados no Brasil, outros importados. Vários exigem uma verdadeira operação de guerra, com escolta e fechamento de faixas de rodovias, devido ao porte. A instalação será feita em quatro a cinco meses. “Não podemos ter nenhuma surpresa”, disse Bandeira Junior.

Fernanda Yanaze Maia, gerente de Marketing e Comunicação da Valmet na América do Sul, enfatizou a mão de obra envolvida no projeto. “Hoje temos mobilizados cerca de 1.600 colaboradores fazendo toda a parte da construção civil. A cada mês esse número vem aumentando. No pico da obra, teremos 14 mil pessoas”, disse a executiva. A cidade de Inocência possui 8.700 habitantes, segundo o IBGE.
Além de gerar receita para a Arauco com celulose — que pode chegar a R$ 1 bilhão por mês —, a planta também renderá dividendos com energia. A produção será de 400 MW, mas a fábrica consumirá metade disso. Os outros 200 MW serão vendidos, com potencial de gerar R$ 45 milhões por mês.
Sensores e atuadores
Entre os equipamentos instalados pela Valmet estão sensores e atuadores. “Serão 100 mil deles. Anos atrás, as plantas tinham em torno de 15 mil. Daremos um salto de tecnologia gigantesco. Também será a planta com a maior pegada de automação do mundo”, afirmou Bandeira Junior, ao ressaltar que, com todos os controles automáticos, haverá “redução no gasto de insumos e de químicos, com aumento da produtividade”.
Instrumentos de medição de temperatura, vazão, válvulas, motores, bombas e leitores de consistência da celulose são alguns dos equipamentos a serem implementados.
Tudo será orquestrado por softwares proprietários customizados pela finlandesa para a planta da Arauco. A base é o Valmet DNAe, uma nova interface de usuário na web para os Sistemas de Controle Distribuído da empresa. Ele disponibiliza informações relevantes para os usuários de automação de processos de acordo com suas funções. O monitoramento será feito em uma sala de controle.
Os equipamentos conectados ao sistema fornecerão dados cruciais, inclusive com identificação de possíveis falhas. “É o cérebro, a cabeça pensante, o computador que controla a planta. Vai gerar alertas nas telas, nos e-mails… Vai possibilitar que a planta seja mantida em ótimo funcionamento”, explicou o executivo.

Máquinas colossais
Alguns equipamentos são pequenos, outros enormes. Entre eles está um forno de cal, de 12 m x 5,75 m, fabricado por fornecedor brasileiro em Assaí (PR) e transportado por rodovias até Inocência (MS).
Nesta semana, também foi iniciada a montagem mecânica da maior caldeira de recuperação do mundo no setor de celulose. Houve o içamento da primeira coluna — um dos pontos mais críticos no cronograma da Valmet.
“A entrega ocorreu antes da data estabelecida no planejamento original”, comemorou Fernando Scucuglia, diretor de Celulose, Energia e Circularidade na América Latina.
A caldeira tem altura de 92,5 metros. A área da fornalha é de 26 m x 22,5 m, equivalente a duas quadras de tênis. A estrutura metálica soma 10,1 mil toneladas, peso equivalente ao da Torre Eiffel.
Operação brasileira em destaque
Os contratos, as entregas, as tecnologias, os equipamentos e a expertise adquirida no Brasil colocam a operação nacional da Valmet em evidência. Como consequência natural, os investimentos no país também crescem.

Em agosto do ano passado, a companhia concluiu a aquisição da Demuth, especializada em soluções de manuseio de madeira para a indústria de celulose. São duas unidades fabris no Rio Grande do Sul, com cerca de 400 trabalhadores.
Além disso, a Valmet avança na construção de uma fábrica em Vespasiano (MG), que deve ser concluída até o fim do ano. A unidade vai produzir 1,5 milhão de metros quadrados de elementos filtrantes, com planos de expansão para até 2,5 milhões, destinados às indústrias de mineração, química, papel e celulose.
Com 12 mil metros quadrados, a nova fábrica pretende aumentar a capacidade produtiva em 34% já no primeiro ano de operação e terá infraestrutura para triplicar essa capacidade ao longo dos anos seguintes.
Presente no Brasil desde a década de 1960, a Valmet também mantém centros de serviços em Araucária (PR) e Sorocaba (SP), com estruturas de fabricação, reparo e manutenção de linhas para produção de celulose e papel — infraestrutura que vem sendo ampliada para atender a projetos históricos, como o da Arauco.