Um relatório de empregos surpreendentemente fraco divulgado nos Estados Unidos reacendeu temores de recessão e trouxe indícios de que a inteligência artificial (IA) pode estar contribuindo para o aumento do desemprego, segundo análise do banco JPMorgan. Os dados de julho mostraram uma desaceleração drástica na criação de vagas, reforçando a percepção de que a demanda por mão de obra está em queda e que a economia americana pode estar entrando em uma fase de estagnação.
O número de novas vagas criadas em julho foi de apenas 73 mil, bem abaixo da expectativa de 100 mil. Mais preocupante ainda foram as revisões negativas dos meses anteriores: os dados de maio foram reduzidos de 144 mil para apenas 19 mil, enquanto os de junho caíram de 147 mil para 14 mil. Isso levou a uma média trimestral de apenas 35 mil empregos criados por mês, um ritmo considerado extremamente baixo para os padrões da economia americana.
Apesar disso, não há sinais de demissões em massa, como demonstram os dados de pedidos semanais de seguro-desemprego e de rotatividade no mercado de trabalho. Além disso, salários e jornadas de trabalho continuam em alta. Contudo, para os economistas do JPMorgan, essa relativa estabilidade é ofuscada por uma desaceleração intensa na contratação, o que constitui um “alerta de estolagem”, termo usado para descrever o momento em que a economia perde tração.
Segundo o banco, a contratação no setor privado caiu para uma média de apenas 52 mil vagas mensais nos últimos três meses, com exceção dos segmentos de saúde e educação, que continuam contratando. “Temos enfatizado consistentemente que uma queda na demanda por trabalho dessa magnitude é um sinal de alerta para uma recessão”, escreveram os economistas da instituição em nota. Eles observam que, normalmente, as empresas mantêm os planos de contratação mesmo diante de desacelerações que consideram passageiras. Quando há redução na demanda por trabalho acompanhando a desaceleração econômica, isso geralmente precede cortes mais profundos e retração.
Mesmo assim, o Produto Interno Bruto (PIB) dos EUA cresceu 3% no segundo trimestre, desempenho acima do esperado. No entanto, indicadores que excluem o impacto do comércio exterior e se concentram na demanda doméstica mostraram desaceleração. A estimativa do Federal Reserve de Atlanta para o terceiro trimestre aponta para um crescimento mais modesto, de 2,1%.
O JPMorgan também alertou que a atual desaceleração na criação de empregos pode comprometer a sustentabilidade do crescimento da renda e da confiança dos consumidores, que haviam se recuperado recentemente. Um dos sinais preocupantes vem do índice U-6 de desemprego, que inclui pessoas subempregadas ou que deixaram temporariamente de procurar emprego, e que subiu 0,4 ponto percentual em 2025. Já a taxa oficial de desemprego permaneceu relativamente estável, variando entre 4% e 4,2% nos últimos 12 meses.
Até o relatório de julho, muitos analistas viam o mercado de trabalho como resiliente, mesmo diante do impacto negativo das tarifas comerciais impostas pelo presidente Donald Trump. “Achamos que a criação de empregos não pode mais ser descrita como sólida”, afirmou o JPMorgan. “Com os impactos negativos da guerra comercial aumentando, as notícias desta semana reforçam nossa visão de que o Fed está mais próximo de iniciar uma flexibilização monetária.”
Além do alerta de recessão, o relatório também trouxe novos indícios de que a inteligência artificial pode estar influenciando negativamente o mercado de trabalho. Setores como serviços profissionais e empresariais perderam 14 mil vagas em julho, após uma tendência de queda nos últimos meses. A taxa de desemprego entre trabalhadores com diploma universitário subiu de 2,5% para 2,7%, enquanto a taxa geral passou de 4,1% para 4,2%.
O JPMorgan observou que novos entrantes no mercado de trabalho representaram uma parcela significativa do aumento no número de desempregados, o que pode refletir dificuldades para recém-formados conseguirem inserção profissional. Isso corrobora preocupações anteriores sobre o uso crescente de IA para substituir funções de nível inicial, posições fundamentais para jovens profissionais iniciarem suas carreiras.
Por outro lado, o economista Brad DeLong argumentou recentemente que o principal obstáculo para os jovens trabalhadores não é a IA, mas sim a incerteza nas políticas públicas e a fragilidade da economia. Em artigo recente, DeLong explicou que empresas tendem a adiar decisões importantes, como novas contratações, diante de ambientes imprevisíveis, como o gerado pela instabilidade na política comercial americana sob Trump. “Essa aversão ao risco prejudica especialmente quem está começando a carreira, que depende de um fluxo constante de vagas de entrada”, escreveu.
A desaceleração no mercado de trabalho e os potenciais efeitos da IA sobre o emprego devem intensificar o debate sobre o futuro do trabalho e as respostas que governos e empresas precisarão dar para lidar com essa nova realidade. O Federal Reserve, por sua vez, pode se ver pressionado a agir para evitar um enfraquecimento ainda maior da atividade econômica.