O principal trunfo da candidatura de André Castro à presidência do Corinthians, em eleição indireta que ocorre nesta segunda-feira (25), é o anúncio feito por ele de que havia uma empresa interessada em investir US$ 1 bilhão no clube, caso ele vença. Esperava-se a divulgação de uma empresa de grande porte, um bancão, uma mineradora, uma gigante da tecnologia. Nada disso. O nome da entidade bem-intencionada é GSP Banco de Fomento Mercantil. Longe de ser uma XP, um Bradesco, uma Petrobras, uma Vale, uma Amazon. Aliás, pouco se conhece da GSP no mercado financeiro. E poucas informações sobre a empresa estão disponíveis. Mas o BRAZIL ECONOMY foi atrás para desvendar os mistérios que rondam o GSP Banco, que não é banco e afirma ter uma mina de ouro (de verdade!), mas não é mineradora.
Primeiramente, é necessário esclarecer que o GSP é uma factoring, que compra contas a receber de outras empresas e instituições, paga imediatamente, mas com deságio, na expectativa de ganhar dinheiro no futuro, quando o prazo da conta expirar.
Grosso modo, se uma empresa tem R$ 1.000 a receber daqui a um ano, a factoring compra essa dívida por R$ 700 para lucrar R$ 300 no vencimento. No caso do GSP Banco, estamos falando de milhões, talvez bilhões (ou não, mas falaremos disso mais adiante).

A companhia foi fundada em 2010, em Goiânia (GO). O presidente da empresa é Carlos Cesar Arruda.
Até aqui, só informações básicas. Os dados começam a ficar intrigantes ao analisar o balanço financeiro de 2019, o último público – talvez o único. Naquele ano, o GSP Banco registrou em ativos totais R$ 949.650.638.220,00. É exatamente esse valor, com 12 números depois da vírgula. Vamos facilitar a leitura então: R$ 949,6 bilhões. Quase R$ 1 trilhão!
Porém – e aqui poderíamos colocar vários “poréns” –, a receita bruta foi de R$ 17,68 milhões. E a disponibilidade em caixa de apenas R$ 1,73 milhão – o advérbio “apenas”, neste caso, foi usado em decorrência da comparação com o valor quase trilionário que o GSP Banco reportou.
Nenhuma auditoria assina o documento. E quem garante, então, que os números são verdadeiros? Paulo Carrasco, gerente financeiro do próprio GSP Banco, que foi entrevistado em 7 de março de 2019 e “confirmou” os dados do relatório. Essa informação está no próprio relatório – com o perdão da redundância.
Ativos intrigantes
E quais ativos levam o GSP Banco a dizer que tem aproximadamente um trilhão de reais? Eles são ainda mais intrigantes do que os próprios números. Vamos a eles.
Em outro documento ao qual o BRAZIL ECONOMY teve acesso, de 2017, a companhia afirma ter investimentos no exterior em bônus do Tesouro Mexicano, chamado Águia Negra, emitidos em 1843 (mais uma vez você não leu errado: os papéis são de 182 anos atrás!). Segundo o próprio GSP Banco, valem R$ 1,56 bilhão. Chegamos a parte dos bilhões relatados no início desta reportagem. Mas, na verdade, podem ser milhões, com sorte, segundo especialistas consultados.
Os problemas, segundo especialistas do mercado financeiro, são o valor dos papéis, que podem ser apenas de alguns milhares de reais, em vez dos bilhões estimados (seria necessária uma perícia mais aprofundada na documentação), e o prazo para receber as quantias, pois simplesmente não há data para que isso ocorra.

Se esses bônus fossem oferecidos ao clube Santos Laguna, do México, para o qual o Corinthians deve R$ 33 milhões referentes à compra do zagueiro Félix Torres, talvez nem eles aceitassem os papéis mexicanos. Arriba!
Há ainda bônus do Tesouro Paraguaio, classificados como Bônus Ouro, emitidos em 1935 (90 anos atrás!) pela República do Paraguai, com valor aproximado de R$ 583.999.999,8. Sim, pouco menos de R$ 584 milhões.
E outros papéis, tão inusitados quanto esses, como bônus do Tesouro Chinês, de “irrisórios” R$ 15 mil.
Investimentos internos
Já na relação de investimentos internos, o GSP Banco apresentou bonds de produto rural que compreendem direitos de propriedade com plantação de cedro-australiano – madeira nobre, de crescimento rápido – no valor de R$ 273,37 milhões.
Também há ações da Telebras, ordinárias e preferenciais, oriundas de leilão de privatização realizado em 1998. Neste caso, os títulos em nome da empresa foram avaliados em R$ 760 mil. Talvez o salário de um mês do jogador Vitinho, que acabou de chegar ao Corinthians.

Ações da Eletrobras, em listagem que contempla diversas séries, somam R$ 560,6 milhões, segundo as estimativas do GSP Banco à época.
Mina de ouro
Dentre os ativos declarados pelo GSP Banco, existe uma mina de ouro que teria sido descoberta numa propriedade da empresa na cidade de Xinguara (PA), localizada a 780 quilômetros da capital Belém.
A avaliação final estimada, ainda de acordo com o próprio GSP Banco, estava em R$ 3.054.240.000,00. Isso mesmo: mais de R$ 3 bilhões. Ressalte-se que, no Brasil, as minas de ouro pertencem à União, e os donos dos terrenos podem receber royalties pela exploração. Porém, não há registro de uma mina de ouro na cidade de Xinguara.

O BRAZIL ECONOMY aguarda retorno da Agência Nacional de Mineração e da Prefeitura de Xinguara sobre essa “descoberta secreta”.
A reportagem não obteve retorno do GSP Banco, que é uma factoring. O espaço continua aberto para manifestações.
Em nota enviada à imprensa recentemente, a companhia afirma, de fato, que “captará aporte financeiro” no valor de até US$ 1 bilhão se André Castro, que é gestor de investimentos do escritório Alta Vista (vinculado à XP), vencer a eleição do Corinthians.
O GSP Banco disse que tem um instrumento financeiro de captação junto aos fundos que representam em nome de André Castro, denominado “Money Market Security/Financial Bill”, que está em tramitação de registros junto aos órgãos competentes do Sistema Financeiro Nacional (SFN).
Afirmou que está devidamente regulamentada pelo SFN, pelas normas de regulamentação do Banco Central, da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e do Conselho Monetário Nacional (CMN).
“Possuímos know-how que permite realizar captações de recursos financeiros junto ao mercado internacional, bem como aos fundos que representamos, para consolidar nossa parceria com o Sport Club Corinthians Paulista nos termos de nossa Carta de Intenção já publicada na data de 21.08.2025 em todas as mídias”, salientou o GSP Banco, que iria salvar o clube, que possui dívidas de mais de R$ 2 bilhões.
Análise de especialista
Ao avaliar o cenário, Andrea Sano Alencar, sócia da área de direito bancário e de mercado de capitais do escritório EFCAN Advogados, afirmou que o setor é “muito escritural” e que “não têm muito fundamento” as apresentações feitas pelo GSP Banco.
Segundo a especialista, tem muita factoring que atua dentro de estrutura de fundos, por exemplo os FIDCs (Fundos de Investimento em Direitos Creditórios). E torna-se prestadora de serviços para o FIDC, mas não é regulada pela CVM (Comissão de Valores Mobiliários) nem pelo Banco Central.
“Seria só uma instituição financeira integrante do sistema de distribuição, que presta esse serviço de captação de recursos via fundos de investimentos. Não tem nenhum credenciamento, seja como administrador fiduciário de fundos, seja como gestor de recursos, que são dois credenciamentos exigidos para administrar e fazer a gestão de fundos de investimentos no Brasil”, explicou Andrea. “Causa estranheza tudo isso.”
Resultado da eleição
André Castro perdeu a eleição indireta realizada na noite de segunda-feira. Foram 199 conselheiros que votaram em Osmar Stábile, vencedor do pleito. Roque Citadini teve 50 votos e André Castro, 14. Castro teve 5% dos votos. Os conselheiros, de fato, não acreditaram na proposta do GSP Banco.