Thomas Trebat é um apaixonado pelo Brasil. Com quase 50 anos de carreira na área de finanças, ele sempre olhou para o mercado brasileiro com especial atenção. Em 1983, lançou o livro Brazil’s State-owned Enterprises: A Case Study of the State as Entrepreneur, onde abordou entre diversos pontos o papel que o Estado teve no desenvolvimento econômico do País.
Membro ativo do mercado financeiro desde a década de 1970, com passagens por cargos diretivos na Ford Foundation, Chemical Bank e Citi, Thomas mora no Rio de Janeiro há cerca de dez anos, onde desenvolveu um português perfeito ao assumir o cargo de diretor do Columbia Global Center Rio, instituição ligada a Universidade de Columbia, uma das mais prestigiadas dos EUA, que tem como objetivo fomentar pesquisa, educação e cooperação internacional em temas de clima e desenvolvimento sustentável no contexto da economia brasileira. Desde então, acompanhou mais de perto a evolução do País até se tornar um polo atrativo para investidores interessados em ativos ambientais.
Thomas conversou com o BRAZIL ECONOMY sobre o interesse do mundo no potencial do Brasil em receber investimentos ambientais. Estes e outros assuntos serão discutidos na 4ª edição do Brazil Climate Summit, evento em que ele é um dos membros do board executivo e que acontece dia 19 de setembro em Nova York com o objetivo de ligar o potencial econômico do Brasil a alguns dos principais investidores globais.
O senhor é um dos organizadores do Brazil Climate Summit que acontecerá em setembro. Quais as expectativas?
É o único fórum grande que foca no Brasil considerando a parte ambiental. E isso é importante já que a missão da Universidade de Columbia é levar temas do Brasil para fora do País. Quando falamos de aquecimento global, não pode haver tema mais relevante, mas entendo que existe uma tendência de subestimar e não levar em conta o papel do Brasil em ser anfitrião de grandes eventos climáticos como a COP-30. Nosso evento tem o desafio de mostrar que o sul global pode mostrar para outros países parecidos como se fazer algo bom com menos recursos que países desenvolvidos. E, ao mesmo tempo, mostrar para o norte global que o sul tem energia limpa, experiência e tecnologia. O Brasil dispõe de terras raras, bioenergia, tecnologias que podem ser escaladas e levadas para fora do País baseada na experiência brasileira, como crédito de carbono, agricultura sustentável, preservação da floresta, indústria inovadora etc. São pautas que às vezes são problemas, mas podem ser soluções. Este ano, de uma forma não politizada, o objetivo do evento é mostrar que o Brasil merece destaque. Claro que Índia, China e países latino-americanos merecem ter seus momentos, mas, agora é a hora do Brasil se mostrar ao mundo.
Segundo pesquisa do Boston Consulting Group (BCG), o Brasil pode atrair R$ 2 trilhões em investimentos climáticos até 2050. Como o poder público pode ajudar a alcançar esta meta?
O Brasil precisa consolidar a posição como um verdadeiro hub global da transição, mas, para que isso aconteça, o papel do setor público é central. O País precisa avançar em uma regulação estável e previsível, capaz de dar segurança ao investidor de longo prazo. Um marco importante nesse sentido será a conclusão da Taxonomia Sustentável Nacional em 2025, que estabelecerá critérios claros para definir o que é investimento verde, reduzindo incertezas e criando um padrão reconhecido internacionalmente. Além disso, é essencial investir em infraestrutura de baixo carbono. A expansão de ferrovias e hidrovias, por exemplo, pode reduzir de forma significativa as emissões do transporte de carga e aumentar a competitividade da produção nacional. O BNDES, os fundos de desenvolvimento e bancos multilaterais têm um papel estratégico ao oferecer garantias, reduzir riscos e destravar recursos privados que hoje ainda estão à margem da transição. Combinando esses elementos, o Brasil pode transformar suas vantagens comparativas, como deter a matriz energética mais limpa do G20 e o maior estoque de soluções baseadas na natureza do mundo, em uma vantagem competitiva real, posicionando-se como destino preferencial do capital climático internacional.
Você acha que a tarifa de 50% imposta mês passado por Donald Trump pode impactar negativamente os investimentos na área ambiental do Brasil?
Embora a tarifa represente um movimento de retração de um governo específico (EUA), seu impacto nos investimentos ambientais do Brasil pode ser limitado e temporário. O cenário global mostra que o clima se tornou um risco sistêmico: afeta cadeias de suprimentos, segurança alimentar, acesso à energia e estabilidade econômica. Por isso, investidores já estão cada vez mais atentos a projetos climáticos, independentemente de retrocessos políticos. A medida de Trump pode gerar alguma cautela de investidores ligados a políticas públicas americanas, mas não deve frear a tendência de investimentos verdes no Brasil, que estão cada vez mais orientados por métricas econômicas e riscos sistêmicos, não apenas por diretrizes políticas externas. Além disso, a maior parte do capital necessário para a transição climática virá do setor privado, não de governos. Sem aparecer otimista demais, é possível que até empresas americanas façam um lobby ante o governo americano para suavizar a tarifa imposta pelo governo Trump.
É uma oportunidade para o Brasil encontrar investidores de outros países que queiram apostar na no setor ambiental?
O Brasil também vai ter uma chance de rever suas relações com outros países ao redor do mundo, como por exemplo, com a China na área de energia renovável e com a Índia com investimentos em minerais críticos e terras raras. Há capital disponível, mas é preciso que o Brasil destrave esses recursos por meio de projetos bem desenhados e de alto impacto, estruturas de mercado, garantias, hedge cambial, e estabilidade regulatória. Nesse contexto, o Brasil pode se tornar ainda mais relevante como fornecedor confiável de soluções climáticas, atraindo investimentos que transcendem ciclos políticos e decisões de curto prazo, como a tarifa imposta pelos EUA. Bom ressaltar que o Brasil atraiu US$ 37 bilhões em investimentos de transição energética em 2024, sendo o sétimo maior destino global e o segundo maior entre emergentes fora da China.
Analisando a agricultura brasileira, qual o principal foco de interesse dos investidores internacionais?
O foco é agricultura regenerativa e soluções baseadas na natureza. O Brasil já tem o segundo maior mercado corporativo de agricultura regenerativa do mundo, com potencial para expandir até 100 milhões de hectares em sistemas integrados lavoura-pecuária-floresta. Investidores olham para ganhos de produtividade com menor emissão, rastreabilidade e cadeias exportadoras descarbonizadas. Além disso, o País concentra o maior potencial global em créditos de carbono de base florestal e agrícola, o que reforça a conexão entre agro sustentável e financiamento climático.
O Rio Global Center da Universidade de Columbia, que você dirige, tem o papel de fomentar pesquisa, educação e cooperação internacional em temas de clima e desenvolvimento sustentável. Quais as principais ações atualmente?
Nascemos com o propósito de ser um hub de conexão entre ciência, políticas públicas e sociedade civil, e o enfrentamento das mudanças climáticas se tornou uma de nossas principais prioridades. Atuamos para transformar evidências científicas em políticas públicas eficazes e investimentos direcionados, sempre incorporando os saberes locais e respeitando as demandas específicas das comunidades envolvidas. Além da pesquisa aplicada, como os estudos sobre calor extremo e enchentes em áreas urbanas,, temos desenvolvido projetos inovadores, como a parceria com a Prefeitura do Rio de Janeiro para utilizar inteligência artificial em sistemas de alerta precoce de enchentes em áreas vulneráveis. Também investimos fortemente na formação de lideranças locais, capazes de articular soluções que combinem inovação tecnológica, justiça social e climática, ampliando o alcance e a sustentabilidade das iniciativas.
Tem algum país que o Brasil pode se inspirar em termos de práticas ambientais?
O Brasil não tem muito o que copiar de outros países, já que poucos têm essa riqueza florestal e a vocação agrícola que o País tem. A transição energética do Brasil é admirável e deixou os pesquisadores de Columbia surpresos. Se analisarmos a geração de energia limpa, a posição do Brasil é privilegiada em relação aos outros países.
Como vocês pretendem participar da COP30 em Belém?
Queremos levar essa experiência para o debate internacional, mostrando como o Brasil pode ser referência em soluções climáticas que unem ciência, tecnologia e inclusão social. Nosso papel será aproximar academia, setor privado e governos para construir pontes que garantam resiliência climática e desenvolvimento sustentável em larga escala.
Como você enxerga que o mundo evoluiu da última COP para a deste ano?
De uma COP (Baku) para outra (Belém), o mundo deu sinais contraditórios. De um lado, vemos retrocessos claros: em países como os Estados Unidos, metas de emissões net zero estão sendo abandonadas e políticas que antes priorizavam energias renováveis têm cedido espaço novamente ao uso intensivo de petróleo, gás natural e até carvão. Isso gera um cenário de menor engajamento internacional e fragilidade nos compromissos assumidos no Acordo de Paris. Por outro lado, esse vácuo abre espaço para que o Brasil assuma um protagonismo em boa hora. O empresariado brasileiro está se mobilizando em áreas estratégicas como agricultura sustentável, bioenergia, reflorestamento, hidrogênio verde e mercados de carbono e mostra disposição em assumir responsabilidades que outros países estão deixando de lado. A grande evolução do último ano foi a percepção de que não basta anunciar compromissos, é preciso implementar soluções concretas. Nesse contexto, o Brasil pode se projetar não só como país em desenvolvimento que precisa de apoio, mas como um hub de soluções climáticas com impacto global, exatamente no momento em que o mundo mais precisa de novas lideranças.
O Brasil ganhou protagonismo nesse período?
Entendo que os principais problemas ambientais do Brasil ainda são uso da terra e desmatamento, onde sai a maior parte de gases do efeito estufa. O País vem sofrendo pressões nesse sentido. Por isso, ter a COP30 no meio da floresta amazônica traz essas discussões à tona. A recente legislação passou com tranquilidade no Congresso e certas cláusulas devem ser vetadas já que muitas representam retrocessos. Mas, importante dizer que o Brasil reúne diferenciais competitivos: energia barata e limpa (LCOE solar de US$ 33/MWh), liderança em biocombustíveis, minerais críticos e agricultura regenerativa em larga escala, além de grandes vantagens institucionais que acabam sendo muito atraentes para investidores, como empresas privadas dinâmicas e um mercado de capitais interno bastante sólido e sofisticado, além de uma invejável estabilidade política. Vale ressaltar ainda que a bioeconomia brasileira é líder internacional com um protagonismo marcado. A bioeconomia poderá emergir como a fonte de solução para novos produtos como SAF (“sustainable airline fuel), biodiesel, combustível para navios produzido só com biomaterial. Claro que existe alguns desafios, como o processo brasileiro de descarbonização que ainda precisa avançar, mas requer colaboração global de financiamento de incentivos, pagamentos para custear e dar alternativas ao desmatamentos e incentivar agricultura mais sustentável. Resumindo, o Brasil vai avançar a bola em 2025 e criar uma base sólida para futuras reuniões da COP.