Investimentos recordes, inovação tecnológica e busca por protagonismo global. A indústria farmacêutica brasileira vive um momento estratégico, com R$ 20 bilhões previstos em investimentos até 2027 por parte das principais empresas de capital nacional. À frente do Grupo FarmaBrasil, que reúne gigantes como Aché, EMS, Eurofarma, Libbs e Hypera Pharma, o presidente-executivo Reginaldo Arcuri defende uma política de Estado para consolidar o setor como um dos pilares da soberania em saúde. Nesta entrevista ao BRAZIL ECONOMY, Arcuri detalha os avanços, desafios e as oportunidades que podem transformar o Brasil em referência mundial na produção de medicamentos de alta complexidade.
O setor farmacêutico brasileiro vive um momento promissor. Como o senhor avalia esse cenário?
É um momento estratégico, talvez inédito, para o setor. Nunca se investiu tanto, nunca se contratou tanto e raras vezes se discutiu tanto a importância da inovação e da soberania tecnológica em saúde como agora. Temos uma chance real de consolidar uma indústria farmacêutica competitiva, sustentável e acessível, com protagonismo global.
Os investimentos do setor privado têm sido acompanhados por apoio público?
Sim. Além do grande volume de investimentos próprios das empresas nacionais, os mecanismos gerados pelo setor público para apoiar o desenvolvimento têm sido absorvidos rapidamente e em grande escala. O BNDES, por exemplo, tem cumprido um papel estratégico. Mas é fundamental que esses incentivos se tornem políticas de Estado, com marcos legais robustos e permanentes.
Esse avanço é conjuntural ou estrutural?
É estrutural. Os dados das últimas duas décadas mostram que a indústria farmacêutica nacional tem dinamismo industrial, capacidade de ampliar investimentos e de suprir a demanda interna de medicamentos. Agora, estamos avançando nas novas rotas tecnológicas: medicamentos biotecnológicos, terapias gênicas e oncológicos de alta potência.
Quais são os principais entraves para esse avanço?
Temos dois desafios centrais. O primeiro é o uso abusivo de ações judiciais por parte de algumas multinacionais para prolongar a validade de patentes expiradas. O caso do Ozempic, da Novo Nordisk, é emblemático. Esperamos que não haja impacto, porque o STF já declarou inconstitucional parte da Lei de Propriedade Industrial, e isso não pode ser revertido por instâncias inferiores.
Como o setor nacional tem reagido a esses casos?
A EMS, que faz parte do nosso grupo, já lançou no mercado uma alternativa ao Ozempic. Isso amplia o acesso ao tratamento da obesidade e do diabetes, além de gerar empregos, arrecadação de impostos e novos investimentos no Brasil.
E quais os impactos esperados com os R$ 20 bilhões em investimentos até 2027?
O impacto será direto na vida da população. Primeiro, pela ampliação do acesso aos medicamentos. Segundo, pelo aumento da competição e consequente redução de preços no mercado privado. Terceiro, pela maior segurança sanitária no fornecimento ao SUS. Estamos falando de impactos econômicos, sociais e estratégicos.
A Anvisa tem sido um gargalo?
Infelizmente, sim. Estimamos que há cerca de R$ 17 bilhões em potenciais negócios travados por falta de estrutura da Anvisa. É preciso melhorar os métodos e procedimentos da agência, recompor gradualmente seu quadro funcional e reconhecer o papel estratégico que ela desempenha para o país. Isso exige atenção dos Ministérios da Saúde, Gestão, Planejamento e Fazenda.
Como o Brasil deve se posicionar no cenário internacional?
Com pragmatismo e abertura. Precisamos ampliar nossa postura multilateral. Temos relações e negócios com norte-americanos, europeus, coreanos e chineses. Os Estados Unidos, em especial, têm enorme importância no panorama farmacêutico mundial. O Brasil precisa se posicionar como um parceiro confiável e inovador.
O fortalecimento da indústria farmacêutica é uma questão econômica ou estratégica?
É uma decisão estratégica para o país. Investir nesses tratamentos e nessa indústria significa inserir o Brasil no mapa da alta tecnologia em saúde. Nosso objetivo é transformar a indústria farmacêutica nacional em um setor de classe mundial da manufatura brasileira.