Ao iniciar sua operação no Brasil há 14 anos, a Blackhawk Network (BHN) enfrentou desafios dos mais variados para ingressar no mercado de gift cards — dos básicos aos complexos. Uma das barreiras era a cultura dos brasileiros, acostumados a dar rosas, chocolates e roupas em vez de um cartão de plástico com um valor a ser trocado por produto ou serviço em alguma loja. Outro obstáculo era mercadológico, atrelado justamente ao comportamento do consumidor. Sem a cultura do cartão-presente, não havia mercado a ser explorado. Simples assim. Mesmo diante desse cenário, a companhia da Califórnia (EUA) desembarcou no País, considerado estratégico para sua expansão global.
Corta para 2025. O setor de gift cards, que antes era inexistente, passou a movimentar US$ 5 bilhões por ano, e a projeção é que esse montante chegue a US$ 8,8 bilhões em 2027, segundo a PayNXT360, consultoria especializada em cartões pré-pagos e tendências de pagamento emergentes.
“Esses desafios impostos pelo mercado brasileiro nos colocam a responsabilidade de sermos melhores. É interessante. O Brasil nos dá muitas chances e oportunidades”, disse ao BRAZIL ECONOMY Fernanda Carbonari, managing director da BHN Brasil, com mais de 20 anos de experiência no setor de varejo digital, consumo e meios de pagamento, e que lidera a expansão de negócios da companhia na América do Sul.
A BHN vendeu 16 milhões de cartões-presente no ano passado e movimentou um montante de mais de R$ 1,3 bilhão. O crescimento médio nos últimos três anos foi de 30%, com 90% de market share da empresa californiana no e-commerce brasileiro.
De 2022 para cá, a BHN aumentou em 40% o rol de marcas e redes varejistas parceiras. O tíquete médio de vendas cresceu 33% em 2024 em relação ao ano anterior, passando de R$ 60 para R$ 80.

Dos 28 países em que a BHN atua, o Brasil já é o sexto maior em representatividade. O faturamento global está na casa de US$ 30 bilhões, com 5.000 colaboradores espalhados pelo mundo.
No Brasil, são 30 colaboradores no escritório comercial, amparados pelo back office internacional. São 40 clientes locais, que possuem diversos tipos e valores de cartões, físicos e digitais, distribuídos em pontos de venda de 50 canais — como supermercados e varejistas como a Americanas, além de marketplaces como o Mercado Livre e shopping centers de aplicativos bancários, como os do Inter e do Banco do Brasil.
“A Blackhawk é um conector entre marcas e distribuidores”, disse Fernanda Carbonari, ao ressaltar que, até o fim do ano, a solução de gift card da BHN estará disponível também na plataforma da Amazon Brasil. A gigante americana de tecnologia já era parceira global da companhia de cartões-presente. O Banco Pan é outro player que deve aderir ainda neste ano.
As instituições financeiras e os varejistas digitais têm sido os grandes catalisadores do crescimento da BHN no País. Em 2019, os gift cards digitais comprados em grandes e-commerces e marketplaces de bancos respondiam por 20% das vendas da Blackhawk Network Brasil. Hoje, esse número já subiu para 60%. A expectativa é que, nos próximos três anos, passe a representar 85%.
Desenvolvimento de mercado
A atuação da BHN no território brasileiro ajudou a desenvolver o segmento local. Pesquisa da companhia apontou que, nos últimos 12 meses, quatro em cada cinco pessoas entrevistadas compraram cartões-presente.
O cenário mostra ainda uma tendência de crescimento contínuo, já que 86% dos entrevistados planejam adquirir gift cards em 2025, um aumento de 12% em relação ao ano passado.
A digitalização do produto é outra propensão apontada no levantamento. Entre os entrevistados, 76% disseram ter adquirido cartões-presente digitais, enquanto 55% compraram a versão física.
Entre os motivos citados para a escolha dessa modalidade estão a facilidade de envio em comparação a um presente físico, a possibilidade de agendar a entrega do cartão-presente digital para um dia específico e o fato de as pessoas nem sempre saberem o que o presenteado quer ou precisa.
Entre as estratégias para adoção do gift card está a aquisição de clientes, segundo Fernanda Carbonari. “A Nintendo trouxe o cartão para o Brasil depois de estar fora do País por muito tempo e precisava adquirir clientes. Passou a ser o segundo canal mais importante de aquisição, além de ser um canal de aumento de tíquete médio”, disse a executiva, ao ressaltar que 30% das compras globais de PlayStation já são via cartão-presente.
Um exemplo de como funciona o aumento do valor de compra relatado pelos parceiros é apresentado pelo case do cartão global da Sephora. O consumidor usa a marca-base, de menor valor, para fazer a primeira aquisição, como um batom Chanel. Depois, no segundo nível, faz a compra com o gift.
De acordo com a executiva, os gift cards abrem outros públicos para os varejistas, como é o caso da Casas Bahia, em que o público jovem que acompanha as famílias passou a comprar cartões de games e entretenimento. “Uma revolução de público, em uma compra adicional.”
Os cartões ainda resolvem problemas adjacentes, como o de controle parental. “Ao adquirir um pré-pago de jogos eletrônicos, por exemplo, os pais limitam o uso pelos filhos e eliminam o cartão de crédito vinculado à conta dos games”, exemplificou a diretora da BHN.
Outra dor é o acesso a streaming. Se o consumidor não tem condições de efetivar uma assinatura anual, ele compra o cartão pré-pago da Netflix ou do Globoplay, por exemplo, para usar por um determinado período em que foi atraído por um filme ou série.
“É o uso de acesso. Esse gift pode ser comprado uma, duas ou três vezes ao ano. Ou ainda é adquirido e depois recarregado para controlar a assiduidade”, explicou Fernanda, ao observar ainda que esse produto gera “expansão do alcance” às plataformas de streaming. “Primeiro o cliente compra via gift card, testa e, em seguida, migra para o cartão de crédito.”
Que venham os próximos desafios da BHN, pois alguns dos principais já foram superados.