A queda de Bordeaux e a nova era dos leilões brasileiros de vinho de alto valor

O índice Fine Wine 1000 acumula queda de quase 23% em dois anos. O Fine Wine 50, que monitora apenas os grandes Bordeaux, caiu mais de 12% no mesmo período

Marcelo Copello
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Imagens: Matthew Hintz/Pexels

Enquanto Bordeaux tenta reinventar sua imagem, o Brasil vive uma ascensão consistente no segmento de vinhos raros

Enquanto Bordeaux tenta reinventar sua imagem, o Brasil vive uma ascensão consistente no segmento de vinhos raros

O universo dos vinhos de luxo está passando por uma das maiores reconfigurações dos últimos 30 anos. A tradicional campanha En Primeur de Bordeaux, símbolo máximo do mercado especulativo e da elite do vinho francês, sofreu um abalo profundo em 2024. Os principais châteaux reduziram seus preços em até 30%, tentando reacender uma demanda que hoje já não responde como no passado. Mesmo cortes drásticos, como os 27% aplicados pelo Château Lafite Rothschild (o menor preço em mais de uma década) não foram suficientes para esgotar os lotes.

Os dados da plataforma global Liv-Ex confirmam o enfraquecimento generalizado. O índice Fine Wine 1000 acumula queda de quase 23% em dois anos. O Fine Wine 50, que monitora apenas os grandes Bordeaux, caiu mais de 12% no mesmo período. Em abril, o valor negociado no mercado secundário global de vinhos recuou mais de 30%, com menor participação de compradores norte-americanos, desencorajados por tarifas de importação e câmbio desfavorável.

Essa crise não é apenas conjuntural — ela expõe fissuras estruturais no mercado dos vinhos finos. O sistema En Primeur, baseado na venda antecipada de vinhos ainda em barrica, parece ultrapassado em tempos de imediatismo e transparência. Os estoques de safras anteriores seguem altos, e os compradores começam a desconfiar do valor real dessas “antecipações”.

Além disso, o perfil do consumidor global mudou. Gerações mais jovens evitam os vinhos pesados e austeros que marcaram Bordeaux nos últimos 50 anos. Preferem vinhos mais leves, orgânicos, naturais, com histórias autênticas — muitas vezes vindos de pequenas regiões da Itália, Espanha ou mesmo da Europa Oriental. Nesse cenário, o “luxo” se descola do conceito de pedigree e aproxima-se da ideia de originalidade.

O Brasil na contramão: leilões de raridades em alta

Curiosamente, enquanto Bordeaux tenta reinventar sua imagem, o Brasil vive uma ascensão consistente no segmento de vinhos raros de alto valor. Leilões especializados vêm crescendo em volume, sofisticação e alcance. Com um público formado por empresários, colecionadores, sommeliers e investidores, essas vendas vêm se consolidando como um mercado alternativo — mais dinâmico, mais direto e com valorização perceptível.

A segunda edição do “Leilão de Vinhos Raros Marcelo Copello e Ricardo Von Brusky” (www.vonbrusky.com.br), realizada em junho com a curadoria deste que vos escreve, é um exemplo emblemático. A maioria dos lotes foi arrematada, incluindo garrafas históricas como um Romanée-Conti 1987 e dois Pétrus 1948 – com preços abaixo da Europa. E uma curiosidade, na contramão do mercado internacional, os vinhos mais procurados foram justamente os Bordeaux, de safras antigas. A próxima edição já está marcada para 1 a 3 de dezembro, e os leiloeiros já estão em busca de novas coleções para adquirir.

Investimento, cultura e legado

Esse novo ciclo de leilões brasileiros é mais do que uma moda passageira: representa uma mudança no comportamento do consumidor de alto padrão. Comprar vinho raro hoje é também um ato de investimento, com potencial de valorização em reais. É também uma forma de cultura, de preservação de garrafas que contam a história de safras, produtores e momentos únicos.

Além disso, os leilões oferecem vantagens competitivas frente ao mercado internacional: logística simplificada, curadoria de confiança e possibilidade de arremate em moeda local. Muitos compradores estão deixando de apostar em investimentos tradicionais e adicionando vinhos icônicos às suas estratégias de diversificação de patrimônio.

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