“Salário importa, mas cultura e flexibilidade ganham valor”, diz Annmarie, da Zendesk

Em entrevista exclusiva ao BRAZIL ECONOMY, especialista de cultura organizacional e pessoas discorre sobre o receio de profissionais perderem suas funções para IA e sugere foco em empatia, criatividade e resolução de problemas

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Imagens: Divulgação

Annmarie Neal, Chief People Officer da Zendesk

Annmarie Neal, Chief People Officer da Zendesk

Annmarie Neal é uma das executivas mais respeitadas do mundo quando o assunto é cultura organizacional e pessoas. Líder de pensamento, autora de “Leading from the Edge” e palestrante de renome mundial sobre estratégia de negócios, gestão inovadora de talentos e liderança executiva, Annmarie concedeu entrevista exclusiva ao BRAZIL ECONOMY, na qual discorreu sobre a relação dos humanos com a Inteligência Artificial, estratégias para atração e retenção de profissionais, a relação entre líderes e equipes, os desafios do mundo hiperconectado e sua visão sobre o futuro em 10 anos. Confira a análise da fundadora do Center for Leadership Innovation e atual Chief People Officer da Zendesk, empresa de tecnologia dinamarquesa com sede na Califórnia (EUA), uma das maiores do mundo em soluções de experiência do cliente que combinam automação com inteligência humana.

Em que medida a pandemia mudou a relação entre empresas e seus funcionários?
A pandemia acelerou uma mudança para uma mentalidade de serviço em como as empresas apoiam seus funcionários. Agora, as pessoas esperam no trabalho a mesma rapidez, personalização e conveniência que recebem como consumidores. Isso deixou claro que a experiência do colaborador não é apenas um “algo a mais” — está diretamente ligada ao engajamento, à produtividade e, em última análise, ao sucesso de toda a organização.

As empresas estão preparadas para os desafios globais de hoje, em que a tecnologia avança em ritmo cada vez mais rápido?
A preparação vem da adaptabilidade. Organizações que integram de forma estratégica a IA à conexão humana, modernizam processos fragmentados e garantem informações precisas e acessíveis estão mais bem posicionadas para responder a mudanças tecnológicas rápidas. Investir na preparação da liderança e na gestão de mudanças é essencial para lidar com esse ritmo de forma eficaz.

Muitas empresas têm grandes discursos, mas falham na execução. Há falta de ação no mundo corporativo, especialmente em relação às questões de ESG?
Em qualquer área de foco — seja ESG, DEIB (Diversidade, Equidade, Inclusão e Pertencimento) ou desenvolvimento de liderança — o impacto real vem de incorporar compromissos nas operações do dia a dia e responsabilizar líderes pelos resultados. Discursos podem inspirar, mas a mudança duradoura acontece quando esses princípios são incorporados à cultura, aos processos e à tomada de decisão. O essencial é tratar o ESG não como uma iniciativa separada, mas como parte central de como a empresa define sucesso.

Quais são os principais desafios para as empresas em sua relação com os funcionários?
Ecossistemas internos complexos, equipes de suporte sobrecarregadas, ferramentas fragmentadas e informações desatualizadas criam atritos. Atender às expectativas dos colaboradores por um suporte rápido, preciso e humano em escala está se tornando cada vez mais difícil. Empresas que simplificarem processos e tornarem as informações facilmente acessíveis se destacarão — e conquistarão uma vantagem competitiva real.

A retenção de talentos está se tornando cada vez mais difícil? Por quê?
A retenção será sempre um desafio nos mercados de trabalho abertos de hoje. O essencial é entender os fluxos de talentos, planejar de acordo e estruturar a organização de forma estratégica para evitar pontos únicos de falha.

O salário ainda é o principal atrativo para os trabalhadores ou isso mudou?
O salário ainda importa, mas os colaboradores agora dão cada vez mais valor à cultura, à flexibilidade e às oportunidades de crescimento pessoal e profissional. Em última análise, a experiência geral — o quão apoiadas, conectadas e capacitadas as pessoas se sentem — muitas vezes importa mais do que a compensação na hora de atrair e reter talentos.

A relação entre líderes e equipes mudou nos últimos anos?
Sim. Agora, espera-se que os líderes combinem empatia com agilidade, comuniquem-se de forma transparente e guiem suas equipes por transições tecnológicas e culturais. O papel da liderança se expandiu: deixou de ser apenas a gestão de tarefas para se tornar o de capacitar pessoas e fomentar resiliência em um ambiente em constante evolução.

As habilidades de liderança que geram mais valor são: inovação, adaptabilidade, clareza, inteligência cultural e a capacidade de combinar tecnologia com julgamento humano — garantindo que a IA complemente, e não substitua, o que as pessoas trazem à mesa.

Com tanta tecnologia incorporada nas empresas, estamos perdendo a conexão humana?
Não, se a tecnologia for usada de forma estratégica. Ao remover fricções e automatizar tarefas repetitivas, a IA libera líderes e equipes para focarem em interações humanas significativas — mentoria, colaboração e inovação — garantindo que a tecnologia fortaleça, e não diminua, a conexão.

Até que ponto a Inteligência Artificial é uma aliada ou um obstáculo na relação das pessoas com o trabalho?
A IA é uma aliada quando oferece rapidez, precisão e personalização, mantendo sempre caminhos claros para a intervenção humana. Torna-se um obstáculo quando corrói a confiança, carece de transparência ou substitui o julgamento humano em situações que exigem empatia e contexto.

Muitos profissionais têm medo de perder seus empregos para a IA no curto prazo. Que conselho daria a esses profissionais?
Foquem em habilidades que a IA não pode replicar: empatia, criatividade, resolução de problemas complexos e julgamento humano. Aprendam a trabalhar em conjunto com ferramentas de IA para aprimorar seu papel, em vez de competir com elas, e aproveitem as oportunidades para se requalificar em áreas que complementem a tecnologia.

Em um mundo hiperconectado e com alta pressão por resultados, o burnout é uma preocupação constante. Como as empresas podem agir para evitar esse problema?
As empresas podem prevenir o burnout simplificando processos, garantindo respostas rápidas e removendo fricções desnecessárias das tarefas diárias. Atrasos operacionais e complexidade corroem o foco e o bem-estar, enquanto suporte proativo e fluxos de trabalho simplificados ajudam a sustentar o engajamento e a resiliência.

Como os profissionais brasileiros são percebidos no exterior? Quais são seus principais pontos fortes?
Os profissionais brasileiros são reconhecidos por sua criatividade, resiliência e capacidade de construir conexões interpessoais sólidas. Eles trazem energia, adaptabilidade e uma mentalidade colaborativa para equipes globais, muitas vezes se destacando na resolução de problemas em ambientes complexos e dinâmicos. Sua inteligência cultural os torna colaboradores valiosos em contextos internacionais.

Como imagina o mundo daqui a 10 anos, em 2035?
Em 2035, o trabalho será fundamentalmente diferente — não porque a tecnologia substituirá os humanos, mas porque remodelará a forma como trazemos nossas forças humanas únicas para a mesa. Viveremos em um mundo onde a colaboração humano-IA será fluida, permitindo criatividade, empatia e pensamento estratégico em uma escala de inovação que hoje mal conseguimos imaginar.

Acredito fortemente que a cultura será a principal vantagem competitiva — organizações que cultivarem confiança, propósito e pertencimento atrairão e manterão os melhores talentos. O desenvolvimento de liderança deixará de ser um programa separado e será incorporado ao trabalho cotidiano, capacitando as pessoas a aprender, se adaptar e inovar constantemente. Mais importante ainda, o futuro exigirá que repensemos não apenas o que é o trabalho, mas por que o fazemos — criando ambientes de trabalho mais significativos, equitativos e centrados nas pessoas, que sirvam tanto aos indivíduos quanto ao propósito coletivo.

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