EXCLUSIVO: Para compensar tarifaço, Abimaq mobiliza indústria por ICMS zero

Informação foi obtida com exclusividade pelo Brazil Economy em entrevista com José Velloso, presidente da Abimaq. Ele não cogita a hipótese de recuo dos EUA

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Imagens: Divulgação

José Velloso, da Abimaq, diz que entidade irá solicitar aos governos estaduais alternativas para baratear exportações

José Velloso, da Abimaq, diz que entidade irá solicitar aos governos estaduais alternativas para baratear exportações

Desde que o presidente Donald Trump decidiu impor ao Brasil com uma tarifa de 50% sobre os produtos importados pelos Estados Unidos, não faltaram governadores endossando a decisão americana. Mas agora eles serão cobrados pelo setor produtivo a agir. Em entrevista ao BRAZIL ECONOMY, o executivo José Velloso, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), entidade que representa cerca de 9 mil empresas, afirmou que vai liderar um movimento empresarial para reivindicar isenção de ICMS dos estados aos setores mais afetados. Confira, a seguir, sua entrevista:

Os Estados Unidos são o principal destino das exportações de máquinas e equipamentos produzidos no Brasil. Só em 2024, o montante exportado ficou na casa de US$ 3,5 bilhões. As empresas do setor estão preparadas para buscar outros mercados para esses produtos?
Acredito que não. As empresas vendem para quem quer comprar, e os EUA representam cerca de 25% das exportações do setor que representamos são, de longe, os nossos maiores compradores. Para se ter ideia, o segundo maior mercado é a Argentina, com 9%, e o México, com 6%. Ou seja, a diferença para os EUA é muito grande, e ficar sem esse parceiro é complicado para o setor. Se tivermos a possibilidade de vender para outros mercados, certamente faremos isso. Mas é importante falar que, no caso de máquinas e equipamentos, existe uma diferença em relação a outros produtos, como commodities: nossos produtos precisam atender a requisitos técnicos que variam de país para país. As normas da Europa são diferentes daquelas dos EUA, então, quando há produção para exportação, a especificidade do importador é levada em conta. Além disso, trabalhamos também com a produção de algumas peças encomendadas para máquinas que já estão em outros países. Ou seja, não é fácil pegar um componente destinado a um equipamento nos EUA e repassá-lo para a Europa ou para o Japão, por exemplo. Então, para nosso setor, o processo de diversificação da pauta de exportação é muito mais complexo e longo do que para outros produtos básicos.

Como o senhor avalia a condução do Governo Federal para alcançar um acordo com a Casa Branca?
O governo tem feito esforços importantes, e o Itamaraty está utilizando a diplomacia como pode. As negociações já estavam abertas para resolver a questão das cotas para aço e alumínio. Mas, conforme ouvi recentemente nos EUA, o governo Trump enxerga o Brasil como um parceiro importante, mas não prioritário. Eles veem outros países como mais estratégicos, como Reino Unido, Japão, México, Canadá ou Índia, e isso atrasa as negociações com o governo brasileiro. Além disso, está claro que não adianta os diplomatas estadunidenses negociarem, sendo que a decisão final sempre passará pela Casa Branca, já que é um governo centralizador.

Então, o senhor acredita que a decisão de Trump é política?
Eu já acreditei que sim, mas às vezes fico na dúvida. Na carta dele, fica explícito que houve um lobby para que Trump interferisse na questão da anistia aqui, e isso me foi confirmado por algumas pessoas que estão em Washington. Por outro lado, ele tem interesses protecionistas com o mundo todo, e com o Brasil não seria diferente.

Mas, quando se somam todos os produtos da balança comercial entre os dois países, o Brasil tem um déficit comercial muito grande com os Estados Unidos no acumulado dos últimos anos. Isso não é uma prova clara de que a motivação política de Trump foi mais importante que a comercial?
É que o Trump é um exímio negociador e é conhecido por ganhar muito dinheiro com isso. Por mais que no acumulado dos últimos anos tenha sido registrado um déficit muito grande para os EUA na balança comercial, essa diferença tem diminuído. No último ano, foi de cerca de US$ 300 milhões, o que é muito pouco. O que entendo é que ele usou a estratégia de jogar um grande problema para o outro lado da negociação, ou seja, o Brasil, para que o governo brasileiro tenha que correr atrás do prejuízo. E, de certa maneira, tem dado certo. Claro que as consequências para os EUA podem ser complicadas, como o aumento da inflação, mas Trump parece que, neste momento, quer apenas adotar políticas protecionistas.

Dentro das negociações com o governo dos EUA, muito tem se falado sobre o papel dos governadores brasileiros. Como o senhor vê essa participação?
Vejo que eles têm conversado com os setores produtivos dos seus estados, o que é muito bom. O estado de São Paulo foi o que mais se destacou, já que o governo liberou o ICMS para as empresas, e isso deve baratear o valor das exportações aos EUA. A Abimaq está mobilizando os empresários e preparando uma carta para enviar aos demais governadores, solicitando que tomem a mesma atitude, já que isso aliviaria a saúde financeira das empresas que serão impactadas pela tarifa de 50% do governo Trump.

As empresas brasileiras importam atualmente dos EUA cerca de US$ 4,7 bilhões em máquinas e equipamentos. O senhor teme que a Lei de Reciprocidade seja aplicada e impacte esses negócios?
Quando participei da primeira reunião com o vice-presidente Alckmin para debater o assunto, dei a ele minha opinião de que, em hipótese alguma, o Brasil deve retaliar essa tarifa. A relação entre os dois países não está boa, e, neste clima politizado, pode ocorrer uma escalada e a tarifa subir ainda mais — e aí seria o pior cenário, já que o setor que represento não tem opção de fazer uma mudança brusca e vender para outros países. Afinal, para a produção de máquinas e equipamentos, a negociação de mudança de fornecedor dura cerca de 10 meses. Ou seja, se a tarifa se mantiver em 50%, já seremos prejudicados. Se escalar, será ainda pior. Por isso, não retaliar significa uma boa vontade para negociar. O grande perigo é que se crie uma animosidade maior, e o Brasil fique para trás quando os EUA finalmente quiserem sentar à mesa para rediscutir tarifas.

Quais os setores representados pela Abimaq que seriam mais afetados pela tarifa?
Diria que os mais prejudicados seriam componentes de máquinas, maquinário rodoviário e agrícola, itens voltados para geração de energia, embalagens, food service e máquinas de alimentos.

Faltando dois dias para a vigência da nova tarifa começar a valer, o senhor acredita que as negociações vão avançar?
Não. No dia 1º de agosto, as tarifas de 50% vão começar a valer, mas pode ser que abram exceções, como exportações de aviões da Embraer, já que aí o impacto nos EUA poderia ser grande e imediato. Apesar disso, acredito que, dentro de algum tempo, as tarifas devem cair para 15% ou 20%, já que está cada vez mais claro que esse será o piso para todo o mundo.

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