Voltemos aos bons e velhos tempos. Não havia smartphones para nos distrair, o trabalho era restrito ao escritório, das 9 às 18 horas, e a política era menos acirrada. É claro que isso é olhar para trás com óculos de lentes cor-de-rosa. Na realidade, a tecnologia nos proporcionou mais tempo livre, a flexibilidade no trabalho aumentou significativamente na última década, e o engajamento em movimentos sociais e políticos internos poderia ter sido completamente mortal na década de 1960.
É natural que desejemos o que é familiar e nos afastemos dos novos riscos percebidos — mesmo quando sabemos que pode haver algo melhor do que o status quo obsoleto.
Anos atrás, uma pequena comunidade alemã teve uma chance única de se reinventar. Localizada no topo de um lucrativo depósito de minérios, seu governo decidiu explorá-lo; a cidade física estava prestes a ser demolida. A vantagem era que a comunidade poderia redesenhar um novo vilarejo do zero, totalmente financiado pelo governo alemão. Diante de possibilidades ilimitadas para instalar novas comodidades modernas, os habitantes da cidade optaram por reproduzir exatamente seu antigo vilarejo sinuoso e cheio de falhas. Eles decidiram jogar pelo seguro, optando pelo familiar.
Todo americano de sangue vermelho certamente adota a máxima “sem coragem, sem glória”, mas nós também, ocasionalmente, adiamos a chance de uma vida melhor — pelo menos em pequena escala — devido ao medo.
Esses instintos estão em plena exibição nos mercados financeiros. Embora existam alguns apostadores natos, a maioria das pessoas prefere jogar pelo seguro com seu portfólio. Isso é conhecido como conservadorismo — um viés cognitivo que nos leva a ser excessivamente prudentes e resistentes a mudanças.
Por exemplo, os investidores geralmente mantêm ações perdedoras por muito tempo e evitam atualizar seus portfólios devido à inércia.
Psicologicamente, somos programados para a previsibilidade, mesmo quando ela pode nos prejudicar. Um estudo descobriu que as filhas de alcoólatras tinham duas vezes mais chances de se casar com um alcoólatra do que as filhas de não alcoólatras. Porque até mesmo a familiaridade dolorosa parece mais segura do que uma vida diferente (melhor).
Pesquisas também revelam que as pessoas não gostam tanto da incerteza que preferem receber más notícias a enfrentá-la — preferimos receber um terrível diagnóstico médico logo do que ficar horas sozinho em uma sala de espera.
Esse conservadorismo pode causar estragos em seu patrimônio líquido, principalmente no que se refere à volatilidade e ao timing do mercado. Até mesmo os investidores iniciantes entendem que colocar o dinheiro embaixo do colchão é uma maneira infalível de nunca atingir suas metas financeiras. Mas, com muita frequência, as pessoas continuam com dinheiro parado, por preguiça de explorar o desconhecido ou por falta de iniciativa.
Algumas pessoas simplesmente nunca conseguem reinvestir devido à inércia, enquanto outras têm medo de arriscar e comprar logo antes de uma queda no mercado. O cobertor quente do dinheiro é reconfortante no momento, mas impede que você acompanhe a inflação.
Especificamente sobre o timing do mercado, vou oferecer uma reviravolta no conselho usual de “simplesmente não faça isso”.
Faça isso. Sim, reinventar seu portfólio por capricho (vendendo uma alocação diversificada e indo para o caixa) é quase sempre uma má decisão, mas, uma vez no caixa, você se depara com um novo dilema: ficar fora do mercado ou voltar. É esse segundo dilema que tem destruído o patrimônio de muitos. No momento da venda, você se convenceu de que reinvestirá quando a volatilidade se acalmar ou quando as ações realmente despencarem. Esses planos geralmente não dão certo, pois as ações não necessariamente seguem as notícias — elas têm um tempo e dinâmica específicos. Elas chegam ao fundo do poço e muitas vezes iniciam sua recuperação ainda com a piora das condições econômicas. O fato é que nunca temos a certeza do bottom ou do início definitivo da recuperação.
Portanto, é a segunda decisão — voltar a entrar — que é muito difícil. Como disse o famoso investidor Jesse Livermore: “O mercado de ações nunca é óbvio. Ele foi projetado para enganar a maioria das pessoas, na maior parte do tempo”. Ao jogar pelo seguro — evitando a volatilidade ao sair de um portfólio bem elaborado — os investidores inadvertidamente colocam em risco sua segurança financeira de longo prazo.
Libertar-se dos grilhões do conservadorismo não é uma tarefa fácil, mas as seguintes estratégias podem evitar que você seja excessivamente cauteloso:
Conduza um pré-mortem
Pense no que pode acontecer de errado se você ficar com dinheiro parado por muito tempo. Uma recuperação do mercado pode relegá-lo à margem para sempre se você se recusar a reinvestir a preços mais altos. Por outro lado, se as ações despencarem, você acha que terá a presciência e a coragem de comprar nas mínimas? A resposta honesta geralmente é não. Ao considerar rapidamente os resultados adversos, você pode descobrir que é melhor investir.
Aceite o risco
Aceitar o risco de mercado pode ser essencial se você quiser obter retornos decentes. Em um sentido muito real, a volatilidade e a incerteza são o preço de entrada na maior máquina de criação de riqueza do planeta: os mercados de capitais.
Automatize. Automatize. Automatize
O investimento rotineiro e o reequilíbrio estruturado podem ajudar a manter seu plano financeiro no caminho certo. A automação reduz o impacto das emoções, o que é sempre útil. Além disso, pré-comprometa-se com reuniões regulares do portfólio com seu consultor para que você possa revisar suas alocações, independentemente das condições do mercado.
O resultado final
Jogar pelo seguro nos mercados pode ser perigoso. Embora o conhecido possa ser reconfortante, o conservadorismo, em algumas circunstâncias, pode se revelar o risco mais significativo de todos. Para alguns, manter-se investido é fundamental, e atingir metas financeiras pode exigir a tomada cuidadosa de riscos e ações intencionais e disciplinadas.
*Bruno Corano é empresário, investidor, economista formado pela UPENN – Universidade da Pennsylvania, socio controlador da Corano Capital NYC, maior gestora privada brasileira nos EUA