A trajetória de crescimento da Suno Asset revela os bastidores de um dos maiores dilemas enfrentados por gestoras independentes nos últimos cinco anos: como escalar produtos de risco com um ciclo econômico desfavorável.
Fundada em 2020 com ambições de capturar o boom do mercado de renda variável na época, a gestora chegou aos R$ 2 bilhões sob custódia em 2025, mas, segundo o diretor de investimentos Vitor Duarte, o resultado ficou aquém do projetado. “Nos nossos sonhos, a gente estaria com mais bilhões do que os dois que temos hoje”, afirmou ao BRAZIL ECONOMY. O motivo? A pandemia de Covid-19, seguida por juros em alta e um cenário político instável, afastou os investidores da renda variável..
Em 2020, o Ibovespa começou o ano com boas perspectivas, mas logo veio a pandemia e a volatilidade tomou conta das negociações. Em dezembro, o principal índice da Bolsa brasileira chegou a ultrapassar seu pico histórico, mas perdeu força mais para o fechamento do mês, encerrando aquele ano com alta de 2,92%, aos 119.017 pontos.
O ano seguinte também iniciou com esperança entre os investidores, em meio aos resultados positivos dos primeiros testes de vacina. Contudo, os meses seguintes foram de perdas contínuas e o Ibovespa fechou 2021 com queda de 12%, o primeiro recuo em seis anos.
Em 2022, houve uma recuperação (alta de 4,68% no acumulado anual), com maior destaque para 2023, cujo aumento foi de 20%. Mas em 2024, novamente, a decepção: uma nova retração de 10,36%.
“Foi um período em que a renda variável sofreu muito. E os nossos produtos são todos de renda variável. Tivemos que remar contra a maré, mas conseguimos crescer mesmo assim”, afirmou Duarte.
Em 2025, o Ibovespa já acumula mais de 20 pregões nas pontuações máximas históricas, com investidores globais melhorando suas posições em ativos brasileiros.
Uma trajetória de cinco anos
Criada pelo Grupo Suno de Tiago Reis, a asset estreou no mercado com um Fundo de Investimento Imobiliário (FII) listado, o SNFF11. Hoje, conta com 10 fundos, incluindo um Fiagro, o SNAG11, fundos de ações e de previdência. Mas o DNA segue sendo o mesmo: filosofia de investimento fundamentalista, comunicação didática com o investidor comum e foco em ativos listados.
“Acreditamos na eficiência do mercado listado. E estamos dispostos a aguentar mais tempo para colher os frutos dessa estratégia quando o ciclo mudar”, disse Duarte. Segundo ele, as gestoras que se voltaram para fundos fechados tiveram mais facilidade para captar no curto prazo, mas também assumiram riscos maiores.
“A gente vai sair dessa crise mais forte. Temos produtos mais bem precificados e um relacionamento direto com o investidor que outros não têm”, avaliou.
Esse relacionamento é um dos pilares da estratégia. Os gestores fazem lives mensais, respondem perguntas nas redes sociais, produzem relatórios acessíveis, na visão de Duarte, e explicam a carteira em linguagem clara. O canal direto com o investidor pessoa física ajuda a fidelizar a base mesmo em momentos ruins, afirmou o executivo. “A gente passa a turbulência juntos. Não estamos prometendo retorno fácil nem milagre.”
A próxima fase, acredita Duarte, deve favorecer as casas que mantiveram sua identidade mesmo sob pressão. Com a expectativa da Selic recuar nos próximos três anos e, assim, um ciclo mais favorável ao risco em vigor, a Suno espera acelerar a captação. “Não precisamos da Selic a 9% para crescer. Estamos prontos para liderar a virada”, disse.
De acordo com o último relatório Focus, divulgado semanalmente pelo Banco Central (BC), a projeção é que a taxa Selic termine 2025 no atual patamar, de 14,75% ao ano. Em 2026, a previsão é de encerrar a 12,50%, diminuindo para 10,50% em dezembro de 2027 e 10% ao final de 2028.
Entre os destaques da Suno Asset estão o SNFF11, um fundo de fundos que chegou a 85 mil cotistas, e o fundo imobiliário SNEL11, que registrou recentemente sua maior liquidez do ano, com R$ 1,3 milhão negociados em um único pregão.
Na visão de Duarte, além da performance, o diferencial da gestora está na transparência. “Quando o mercado cai, explicamos por que caiu. Quando sobe, mostramos onde acertamos. Isso cria confiança. O varejo é mais racional do que parece, se for bem tratado”, afirmou o executivo.
A meta agora é consolidar os produtos existentes, ampliar a base de cotistas e aproveitar o novo ciclo econômico para crescer com consistência. Sem pressa. “Investir é um jogo de resistência. E a gente ainda está de pé”, disse.
De banco público a uma asset independente
A confiança na tese da Suno tem raízes na trajetória de Vitor Duarte. Em 2004, ainda no terceiro período de economia na Universidade Federal do Espírito Santo, ele começou sua carreira no Banestes, o Banco do Estado do Espírito Santo. Foi direto para a divisão de investimentos do banco — a Banestes DTVM — e ali construiu uma jornada de quase 20 anos.
Começou do básico: atendia telefonemas e repassava ordens na mesa de ações. Em 2008, já comandava a equipe. Em 2010, saiu para empreender como sócio de um agente autônomo. A experiência durou pouco. Com mudanças societárias e problemas de repasse, voltou ao Banestes em 2013, desta vez como presidente da DTVM. Tinha 28 anos.
Foi nessa fase que consolidou sua visão de portfólio e gestão. Estruturou a área de investimentos que contava com 17 fundos e quase R$ 6 bilhões sob gestão — entre eles, um FII, que apontava para o mercado que ele viria a explorar anos depois.
O ponto de virada aconteceu em 2020. Em busca de novos formatos de produto, Vitor entrou em contato com Thiago Reis, fundador do Grupo Suno, sugerindo uma parceria entre a Suno e o Banestes. “Era uma quarta-feira, 21h30. O Thiago ouviu minha ideia e disse: ‘Respeitosamente, acho que você está no lugar errado’. Aí ele completou: ‘Você está num banco público, à noite, com um monte de ideias. Isso não é comum’”, contou Duarte.
A conversa virou convite. Reis estava lançando a Suno Asset e queria alguém para liderar a gestora. Duarte topou. “Começamos do zero. Zero de ativos, zero de estrutura. Primeiro veio a parte regulatória: CVM, Anbima, prestadores. Depois, lançamos o primeiro fundo, o SNFF11, com R$ 250 milhões e demanda do dobro disso. Foi ali que tudo começou.”
Hoje, além dos fundos imobiliários, a gestora atua com ativos dos segmentos de crédito privado, energia limpa, agronegócio e ações.