O crescimento acelerado dos gastos públicos a partir de 2022 colocou o Brasil entre os países emergentes com maior dificuldade de realizar um ajuste fiscal. Segundo o Itaú, o país vive hoje um dos cenários mais adversos entre pares como China, África do Sul, Hungria e Malásia. E a tendência é de piora. A relação entre dívida bruta do governo e Produto Interno Bruto (PIB), que deve encerrar 2025 em 79,6%, pode chegar a 84,2% em 2026, sem perspectivas de retornar ao patamar ideal de 50%, necessário para recuperar o grau de investimento. A avaliação é de economistas do Itaú.
“Desde 2022, o gasto público cresce sistematicamente. Sem tanto rigor fiscal e com hipótese de PIB e juros reais entre 2% e 3%, a dívida não se estabiliza em um horizonte visível”, afirmou o economista-chefe do banco, Mário Mesquita, durante o evento Macro em Pauta, realizado pela instituição financeira com jornalistas.
O levantamento do Itaú mostra que a dívida bruta brasileira está entre as mais altas do mundo. Em 2024, apenas a China apresentava um patamar superior, com índice próximo a 90% do PIB. No ano anterior, o Brasil havia encerrado com endividamento de 76,5% do PIB.
Já as despesas públicas, que haviam recuado 24,7% em 2021, passaram a crescer nos anos seguintes: alta de 6% em 2022, de 7,6% em 2023 e de 3,2% em 2024. Para 2025 e 2026, o banco projeta aumentos de 2,9% e 2,7%, respectivamente. Nesse cenário, a previsão é de continuidade dos déficits primários, com resultados negativos de 0,8% do PIB em ambos os anos.
Para o Itaú, a solução não exigiria necessariamente cortes, mas uma reavaliação mais eficiente dos gastos. “Temos hoje um desemprego mais baixo, mas os gastos com seguro-desemprego não estão no mesmo nível. A inflação está em 4,5%, mas os reajustes para o funcionalismo são de 9,5%. Há muito o que melhorar do lado da despesa”, disse Mesquita.
No lado das receitas, o banco defende atacar distorções tributárias. “Não vejo por que não tributar as apostas esportivas, como se faz com bebidas alcoólicas e cigarros”, afirmou o economista. Ele também sugeriu uma revisão sobre o IOF. “O ideal seria não ter o IOF, mas dado o cenário atual, esse imposto poderia ser inserido em criptos.”
O banco mostrou ainda que as mudanças recentes no IOF devem adicionar R$ 19 bilhões à arrecadação em 2025 e R$ 37 bilhões em 2026. No entanto, com os impactos negativos sobre o crédito e eventuais reações dos contribuintes, a receita adicional efetiva pode cair para cerca de R$ 21 bilhões. “Isso mostra que há um limite para depender da tributação como solução, especialmente em um país que já tem carga tributária elevada”, disse Pedro Schneider, economista do Itaú, também presente no encontro.
Novo consignado pode dar fôlego à economia
Durante o evento, os economistas do Itaú também comentaram os possíveis impactos da nova modalidade de crédito consignado para trabalhadores com carteira assinada e das alterações nas regras para aposentados e pensionistas do INSS.
A principal mudança foi a ampliação do prazo de pagamento para beneficiários do INSS, que passou de 84 para 96 meses. Medida que pode dar mais fôlego para quem já compromete parte da renda com parcelas mensais.
Já para os trabalhadores formais, incluindo empregados domésticos e rurais, a Medida Provisória 1.292/2025 autorizou a contratação de empréstimos por meio da Carteira de Trabalho Digital. Além disso, a portabilidade do consignado agora também está liberada para o setor privado, o que pode estimular a concorrência entre bancos e reduzir o custo total dos empréstimos.
Segundo o Itaú, essas mudanças podem acrescentar 0,6 ponto percentual ao PIB entre 2025 e 2026. “Se não fosse o cenário global mais instável, estaríamos revendo para cima a previsão de crescimento deste ano”, afirmou Mesquita. A projeção atual do banco é de um avanço de 2,2% para o PIB em 2025, com desaceleração para 1,5% em 2026.