Como ocorre a cada ano, o Dia do Malbec, celebrado em 17 de abril, ensejou diversas ativações de vinícolas e importadoras interessadas em promover seus que rótulos com a uva que se tornou sinônimo de vinho argentino. No caso da Doña Paula, fundada em 1997, em Mendoza, a ocasião serviu também para revelar a evolução da empresa ao longo do tempo por meio de uma degustação de quatro safras da linha Selección de Bodega, a mais premium da vinícola. O percurso resume também o posicionamento da indústria do vinho argentino, cada vez mais empenhada na excelência do que produz.
Conduzida em São Paulo pelo gerente comercial e enólogo Martin Kaiser, eleito Winemaker of the Year pelo respeitado crítico Tim Atkin, a degustação incluiu as safras 2008, 2012, 2025 e 2020. Entre uma e outra, dois mundos distintos. A primeira, com uvas plantadas na década de 1970 na região de Luján de Cuyo, revelou um Malbec típico daquela época: aromas de fruta em compota, muita potência e um certo dulçor ao paladar.
No outro extremo, um vinho ainda bem recente, com apenas três anos em garrafa (toda a linha Sellección de Bodega estagia por 24 meses em barricas de carvalho), de uvas colhidas a 1.350 metros de altitude, no vinhedo Alluvia, em Gualtallary, terroir que se destaca pelo frescor e pelas notas aveludadas. “Este foi o primeiro Selección de Bodega inteiramente sob minha responsabilidade. Foi um ano difícil, quente, e com a safra interrompida pela pandemia”, disse Kaiser. “Ainda assim, conseguimos produzir um vinho que se destaca pela elegância, com mineralidade, fruta fresca e taninos aveludados”.

Apesar da descrição feita pelo enólogo trazer aquele jargão típico de quem vive mergulhado no mundo do vinho, é inegável que houve um ganho de qualidade a cada safra até 2020. Percorrer esse percurso em direção à maior elegância na taça exigiu investimentos robustos da Doña Paula. A começar pela aquisição de uma propriedade específica para esse fim. “Nesse vinhedo pudemos levar ao extremo o projeto Terroir in Focus, que consiste em um mapeamento detalhado do solo para identificar as melhores parcelas”, afirmou Kaiser. Com esse mapa em mães, ele pode selecionar as uvas de modo a vinificá-las separadamente, extraindo os elementos que considera essenciais para chegar a um grande vinho.

Mas não foi apenas o conhecimento do solo que fez a diferença. No novo vinhedo, plantado há 20 anos, Kaiser testou uma técnica de condução peculiar, chamada gobellet, que consiste em deixar as videiras isoladas, no formato de uma taça. Segundo o enólogo, o resultado é um controle melhor do ciclo da planta e uma colheita escalonada para valorizar o ponto de maturação ideal. “É como pilotar um carro de Fórmula 1. Ele tem potência de sobra, mas é preciso estar atento a todos os detalhes do trajeto para não sofrer um acidente”, afirmou. A julgar pelo resultado até agora, o pódio está garantido. Com 97 pontos no Guia Descorchados, a linha Selección de Bodega está à venda no Brasil por cerca de R$ 440, dependendo da safra e do varejista.
*Celso Masson é jornalista, winemaker e head de experiências do Castelo Saint Andrews, Relais & Châteaux de Gramado (RS)