Em um cenário em que o microcrédito ainda é visto com desconfiança e onde programas públicos acumulam altos índices de inadimplência, uma iniciativa privada vem chamando a atenção. O Banco Acredita, criado em 2021 para liberar pequenos empréstimos a empreendedores de baixa renda da periferia, acaba de alcançar um feito: reduziu de 72% para 16% a taxa de inadimplência entre seus clientes em apenas dois anos.
O segredo, segundo o diretor executivo da instituição, Rafael Ponzi, é a utilização de um modelo humanizado, centrado no relacionamento com o cliente e na análise caso a caso quando ocorrem atrasos no pagamento. “Os bancos tradicionais olham para números. Nós olhamos para as pessoas”, afirmou Ponzi. “Renegociamos as parcelas de forma flexível”, disse.
A lógica do banco é simples, segundo Ponzi: o crédito não é apenas uma transação — é um processo de confiança. O atendimento é próximo, semanal, e o suporte técnico é contínuo. Os empréstimos são concedidos em rodadas progressivas: o cliente começa com R$ 400 e, à medida que honra os compromissos, pode alcançar até R$ 2 mil por rodada. Ao longo do ciclo completo, o crédito total pode chegar a R$ 7 mil, com possibilidade de renovação. No ano passado, o Banco Acredita chegou à marca de R$ 849,2 mil em carteira de crédito.
Outro pilar do modelo de negócio do Acredita é o custo dos empréstimos. A taxa administrativa é de 1% por semana, com parcelas que não ultrapassam R$ 100. “Esse modelo foi desenhado para caber no orçamento apertado dos empreendedores e manter o vínculo constante com a instituição”, acrescentou o diretor executivo.
A drástica redução na inadimplência contrasta com o cenário enfrentado pelo banco em 2022 e 2023. Nos primeiros dois anos de operação, o calote atingia alarmantes 72%. Em vez de negativar o nome dos clientes, o banco implementou um novo modelo baseado em três pilares: trilha pedagógica (capacitação em finanças e gestão de negócios), cobrança humanizada (renegociação que leva em conta a vida real dos clientes) e acompanhamento próximo (visitas frequentes e orientação técnica no dia a dia do negócio).
Mulheres no centro
A maioria dos clientes do Banco Acredita são mulheres entre 45 e 54 anos, moradoras de comunidades periféricas como Duque de Caxias, Realengo, Santa Teresa e São João de Meriti, no Rio de Janeiro. Muitas são chefes de família, com três ou mais filhos, e tocam pequenos negócios nos setores de alimentação, artesanato e beleza.
O processo de solicitação do crédito é feito por vídeo: o empreendedor grava um depoimento apresentando seu negócio, sua trajetória e seus sonhos. “A análise não se baseia em planilhas, mas em pessoas. A gente acredita na força de quem está do outro lado da câmera”, disse Ponzi.
A proposta do Acredita é também oferecer apoio, orientação e um olhar atento às particularidades de quem vive e empreende na periferia. “Ao devolver dignidade ao processo de tomada de crédito, a instituição prova que um sistema financeiro mais justo é não só possível, como urgente”, destacou Ponzi. “No fim das contas, a lição é simples: quando há escuta, há confiança. E quando há confiança, há transformação.”