Tarciana Medeiros sempre nadou contra a maré. E quem diz isso é ela mesma. “Nunca nada na minha vida foi fácil.” Das dificuldades no acesso à educação aos desafios de gênero no mercado de trabalho, ela galgou sua escalada até a cadeira mais importante do Banco do Brasil (BB), onde está desde 2023. Com resultados sólidos e um aumento de 50% no valor das ações do banco desde sua entrada, a paraibana afirma que o bom desempenho reflete o foco da empresa na execução de sua estratégia.
Na visão da executiva, as ações poderiam subir ainda mais se a precificação acompanhasse o desempenho da instituição bancária. Foi essa performance, inclusive, que garantiu sua permanência no cargo. Desde a eleição de Davi Alcolumbre como presidente do Senado, surgiram rumores entre assessores palacianos sobre uma possível troca de comando no banco, em uma estratégia para acomodar aliados do Centrão e facilitar a governabilidade do governo no Legislativo. Dias antes da divulgação do balanço, Lula chegou a se reunir com Tarciana e outros ministros e aguardou o resultado oficial para decidir: Tarciana continua onde está.
O desfecho caiu como um balde de água fria entre os líderes do Centrão, que esperavam a vaga como uma forma de melhorar a interlocução com o agronegócio — setor que tem aumentado o tom das críticas contra o governo devido ao crédito mais escasso e ao estrangulamento das operações diante da alta dos custos de produção.
Dois assessores do presidente confirmaram à reportagem que Lula calculou o custo político de não aceitar a mudança e o desgaste do capital com o mercado caso promovesse a troca. “A decisão de optar pela manutenção foi tomada olhando o desempenho macroeconômico em um ano em que se espera uma desaceleração do PIB”, afirmou um deles, sob condição de anonimato. Para a cadeira de Tarciana, já havia até potenciais nomes: Denísio Lobato (BB Asset) e André Haui (BB Seguridade).
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Apesar da manutenção de Lula, membros do Centrão entendem que a governabilidade de Lula será muito prejudicada em um ano decisivo. “O governo não tem mais tempo. Ano que vem é eleição, então toda agenda que não for positiva para a opinião pública precisa avançar este ano”, disse um interlocutor do União Brasil à reportagem. Para ele, a mudança não é uma questão de “se”, mas de “quando”.
STARTUP DE DOIS SÉCULOS
Ainda que publicamente se mostre pouco interessada no jogo político que circunda sua cadeira, Tarciana tem reforçado, sempre que pode, o papel transformador que o banco tem adotado durante sua gestão. Segundo a presidente do Banco do Brasil, a empresa se posiciona como uma “startup com mais de dois séculos”. A executiva explicou que essa flexibilidade permite ao banco adaptar-se rapidamente às mudanças do mercado, garantindo sua relevância em um setor dinâmico.
Sobre a oferta de crédito para 2025, já que seus pares no mercado financeiro têm se mostrado cautelosos, Tarciana defende que o cenário desafiador e os reflexos de uma política monetária mais apertada não tiraram do Banco do Brasil o otimismo com a carteira de crédito.
No ano passado, a carteira de crédito ampliada do Banco do Brasil apresentou saldo de R$ 1,3 trilhão, alta de 15,3% em relação a 2023. Segundo o balanço do banco, os destaques foram as operações com pessoas físicas, com empresas e com o agronegócio. Em relação às pessoas físicas, a carteira de crédito ampliada cresceu 7,3% no ano passado, somando R$ 336 bilhões. A expansão foi influenciada pela carteira de crédito consignado, que cresceu 9,8% no ano passado. A carteira de crédito para pessoas jurídicas totalizou R$ 461,1 bilhões, com alta de 18% em 12 meses.
A carteira ampliada do agronegócio somou R$ 397,7 bilhões, batendo o recorde registrado em 2023. O crescimento totalizou 2,9% em relação ao trimestre anterior e 11,9% em 12 meses. O BB manteve a liderança no crédito ao segmento.
Outro destaque, afirmou a executiva, foi a carteira de negócios sustentáveis, que engloba os empréstimos a projetos com impacto social e ambiental positivo. Essa carteira somou R$ 386,7 bilhões no ano passado, com alta de 12,7% em 12 meses. O montante corresponde a 30% do crédito total do banco.
Para este ano, Tarciana diz que o BB trabalha com a projeção de lucro líquido ajustado entre R$ 37 bilhões e R$ 41 bilhões, com expansão de 5,5% a 9,5% na carteira de crédito. As receitas com prestação de serviços deverão ficar entre R$ 34,5 bilhões e R$ 36,5 bilhões, e os gastos administrativos, entre R$ 38,5 bilhões e R$ 40 bilhões.
APROXIMAÇÃO
A estratégia montada pelo governo federal para 2025 é tentar se aproximar dos bancos como forma de apresentar segurança e tentar destravar o crédito, ainda que a Selic esteja alta e os banqueiros tenham mostrado receio com um aumento exponencial da carteira de crédito diante do cenário desafiador.
Por parte do governo, a discussão gira em torno de novas versões do Desenrola. Uma delas, inclusive, já foi anunciada e será voltada para o agronegócio. Em estudo estão versões envolvendo pequenos industriais e prestadores de serviços de menor porte. Para “sentir o clima” do mercado, além de Tarciana, se encontraram com Lula o presidente da Caixa, Carlos Vieira; Luiz Carlos Trabuco (Febraban), Isaac Sidney (Febraban), Marcelo Noronha (Bradesco), Milton Maluhy Filho (Itaú) e Mario Leão (Santander).